Pesadelo: trabalhadores perderam ações e terão que pagar os advogados dos seus ex-patrões (foto/Thinkstock)
Camila Pati
Publicado em 13 de março de 2018 às 06h00.
Última atualização em 20 de janeiro de 2020 às 12h05.
São Paulo – Desde que a reforma trabalhista entrou em vigor, começaram a surgir casos de trabalhadores que entraram na Justiça contra ex-empregadores, perderam e foram condenados a pagar grandes quantias em honorários para advogados dos patrões vencedores das ações.
Para citar casos recentes que viralizaram na internet, uma ex-funcionária do Itaú foi condenada a pagar 67 mil reais em dezembro do ano passado e, no fim de semana, caso semelhante chamou a atenção pelo alto valor. Um vendedor ex-funcionário de uma concessionária de caminhões foi condenado a pagar 750 mil reais de honorários ao advogado do ex-empregador.
A regra que estipula que quem perde paga o honorário do advogado de quem ganha é uma das novidades na CLT. São os chamados honorários de sucumbência, regra prevista no artigo 791-A da reforma, em vigor desde novembro do ano passado.
“Antes da reforma trabalhista não existia essa questão dos honorários de sucumbência, fixados entre 5% a 15% do valor total da ação”, explica James Siqueira, sócio do escritório Augusto Siqueira Advogados.
No caso do ex-funcionário da concessionária, a juíza do Trabalho Adenir Alves da Silva Carruesco, da 1ª Vara de Trabalho de Rondonópolis (MT), decidiu aplicar o percentual de 5% do valor total da ação.
É aí que entra a razão da dor de cabeça ao custo de 750 mil reais ao trabalhador: ele pedia 18.578.363,14 reais na ação, por conta de descontos indevidos em comissões de venda, benefícios não pagos e compensações por danos morais.
Na própria petição inicial, o ex-funcionário pedia a condenação da concessionária em honorários sucumbenciais. “Por isso, é difícil defender que a decisão foi extremamente injusta quando o valor da causa é multimilionário e requer-se expressamente na petição inicial a condenação da ré em honorários sucumbenciais”, diz a advogada Roberta de Oliveira Souza, especialista em direito público, processo e direito do trabalho.
De acordo com a especialista, não se pode, entretanto, perder de vista que essa condenação pode interferir no seu direito a subsistência digna, sendo desproporcional. “Embora esteja em conformidade com a lei no sentido estrito”, diz Roberta.
Na opinião de Siqueira, há que se levar em conta também que uma eventual condenação da concessionária também poderia quebrar a empresa. Para o especialista, também houve evidente exagero no valor reclamado pelo ex-funcionário. “Já vi pedidos assim, mas de executivos de multinacionais que recebiam altos salários. Não é um processo para um trabalhador comum”, diz.
Ele destaca que o vendedor ainda poderia ter sido condenado a pagar um valor três vezes maior, se a juíza aplicasse os 15%, em vez de 5%. “A juíza até que foi complacente com o profissional”, diz Siqueira.
A nova regra não tem objetivo, segundo o advogado, de cercear o direito constitucional de um trabalhador buscar a Justiça trabalhista. Ela vem para coibir um hábito comum entre os advogados trabalhistas que é o de ajuizar ações com o maior número possível pedidos resultando em altos valores reclamados de indenização.
“Vejo a nova regra como um ponto positivo. Vem para equalizar e racionalizar demandas trabalhistas que estavam muito acima da curva”, diz Siqueira.
Ao ex-funcionário resta a opção de discutir a aplicação da nova regra já que a ação foi ajuizada em 2016, antes, portanto, da reforma trabalhista.
“Essa é uma decisão em primeiro grau. Ele pode tentar reverter, levar a questão ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) e se não conseguir levar ao Tribunal Superior do Trabalho (TST)”, diz Siqueira.
Segundo Roberta, a aplicação ou não da nova regra para uma ação iniciada antes da entrada em vigor da reforma tem sido motivo de polêmica entre diferentes correntes de operadores do Direito e do Judiciário trabalhista.
Uma corrente defende que haja a garantia de não surpresa e argumenta que expectativa de custos e riscos é feita no momento em que a ação é proposta.
“Do outro lado, há jurisprudência do STJ, para a qual a sucumbência nasce no momento da pronúncia da sentença, motivo pelo qual é a norma em vigor nesse momento que irá reger a sistemática dos honorários sucumbenciais”, explica a especialista.
“É irrefutável a conclusão de que decisões como essa geram grande temor por parte dos trabalhadores no acionamento do Judiciário trabalhista”, diz Roberta.
Mas como evitar que o tiro saia pela culatra ao acionar a Justiça do Trabalho?
A primeira medida a se tomar é procurar um advogado trabalhista sério e ético para que ele faça apenas os pedidos relacionados a direitos que efetivamente eram devidos e não foram cumpridos.
“O trabalhador deve buscar testemunha que possa provar suas alegações, já que a indicação testemunhal é feita por ele”, diz Siqueira.
Roberta também sugere que se faça o ajuizamento de ações de produção antecipada de provas. “O intuito da ação de produção antecipada de provas é servir de instrumental para que o interessado em propor a ação se certifique de estar aparelhado com o material probatório necessário”, explica.
Esse tipo de ação antecipada serve para saber se as provas que o autor da ação reuniu fortalecem a sua reclamação na Justiça e também para estimular um acordo entre as partes, antes mesmo de a ação principal ser ajuizada.
“As partes já se tornam cientes do que pode ou não ser provado podendo optar por um acordo que lhes poupe tempo e despesas processuais, como a relativa aos honorários sucumbenciais”, explica.