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Para as meninas, a exposição ao empreendedorismo pode ser um diferencial importante

Estarem cercadas por empreendedores nos primeiros anos de vida pode moldar as trajetórias educacionais e profissionais das meninas.

Pesquisadores descobriram um fato ainda mais encorajador: os negócios de mulheres precocemente expostas  a empreendedores superaram os criados por homens e mulheres que não tiveram tal exposição precoce. (FG Trade/Getty Images)

Pesquisadores descobriram um fato ainda mais encorajador: os negócios de mulheres precocemente expostas  a empreendedores superaram os criados por homens e mulheres que não tiveram tal exposição precoce. (FG Trade/Getty Images)

Kellogg Insight
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Kellogg School of Management

Publicado em 8 de março de 2025 às 08h08.

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No mundo todo, ao contrário dos homens, as mulheres estão menos propensas a entrar para o mundo do empreendedorismo sozinhas: em trinta e oito países altamente desenvolvidos, em comparação com os homens, apenas dois terços das mulheres eram mais propensas a criar suas próprias empresas, de acordo com o relatório 2021 OECD .

As implicações que esses dados estatísticos possam ter, tanto sobre a igualdade de gênero quanto a economia, atiçou a curiosidade de Maddalena Ronchi, professora assistente de finanças da Kellogg.

Pesquisas anteriores mostram que o aumento da representação das mulheres em empregos tradicionalmente dominados por homens pode melhorar a produtividade em termos gerais. E a presença de mulheres mais talentosas que buscam o empreendedorismo, mais especificamente, pode ter um grande impacto na economia em geral, levando em consideração o papel fundamental que os empreendedores desempenham na criação de empregos e no crescimento de vagas de trabalho.

“No entanto, pouco se sabe sobre o que fazer para incentivar o empreendedorismo feminino", diz Ronchi. A pergunta que ela se fez é se havia algo que pudesse ajudar a motivar um maior número de mulheres a seguir esta área e, em caso afirmativo, até que ponto isso poderia influenciar a economia.

Em um novo artigo, Ronchi e seus coautores - Mikkel Mertz, economista pesquisador da Unidade de Pesquisa da ROCKWOOL Foundation e Viola Salvestrini, doutoranda da Universidade Queen Mary de Londres - exploraram essas questões. A equipe investigou o fato de a exposição a empreendedores poderia aumentar a probabilidade de um ou uma adolescente abrir uma empresa algum dia no futuro. Os pesquisadores se basearam em vários registros populacionais dinamarqueses para acompanhar as jornadas das carreiras e conexões de quase um milhão de pessoas, da adolescência até a idade adulta.

Eles descobriram que a exposição precoce a empreendedores fez diferença, mas apenas para as meninas. A exposição aos pais empreendedores de colegas na adolescência pareceu alterar as trajetórias educacionais e profissionais das meninas: elas se mostraram mais propensas a continuar os estudos após o ensino médio e apresentaram menor risco de terem empregos de baixos salários ao longo de sua vida profissional.

Além disso, os pesquisadores descobriram que as meninas precocemente expostas a empreendedores e que, em seguida, correram em busca de suas próprias ambições profissionais criaram empresas mais bem-sucedidas e mais favoráveis às mulheres do que o empreendedor comum.

As descobertas têm grandes implicações, e não apenas para mulheres como indivíduos, enfatiza Ronchi.

“Empreendedores criam empregos”, diz ela, “e ter as pessoas certas ‘optando’ por esse trabalho é importante para a sociedade como um todo”.

Criados por uma comunidade (de empreendedores)

Os pesquisadores intencionalmente se concentraram nas interações de alunos com empreendedores em um período muito específico de suas vidas, dos 13 aos 16 anos de idade, devido à importância dessa época no contexto do sistema educacional dinamarquês. Na Dinamarca, a escolaridade obrigatória finda aos 16 anos, altura em que os adolescentes tomam decisões importantes sobre se continuarão os estudos e, caso sim, se devem seguir um caminho vocacional ou acadêmico. Em outras palavras, esses anos são um momento crítico no qual os adolescentes podem explorar opções que almejam quanto a profissões.

A amostra dos pesquisadores incluiu 786.660 jovens que, entre 1980 e 1992, frequentaram 1.564 escolas diferentes. Eles traçaram as trajetórias dessas pessoas até os 40 anos de idade a partir de várias fontes de dados: registros empregador-empregado para distinguir entre empreendedores e não empreendedores (bem como as características das empresas); históricos educacionais para rastrear as escolas frequentadas; e registros demográficos para conectar alunos e familiares.

Com esses dados, os pesquisadores puderam distinguir os coortes de alunos que continham mais pais empreendedores e, em seguida, traçar o impacto de longo prazo que a exposição ao empreendedorismo tem em carreiras profissionais. Além disso, eles puderam medir o sucesso das pequenas empresas eventualmente criadas pelas meninas influenciadas pelos seus pais empreendedores.

Os benefícios da exposição

De acordo com a análise dos pesquisadores, era menor a probabilidade de as meninas precocemente expostas a empreendedores decidirem parar os estudos no final da escola obrigatória e maior era a propensão de continuarem o ensino vocacional, o caminho mais propício ao empreendedorismo neste contexto. As meninas que conheciam mais empreendedores no início da vida também tinham menor probabilidade de obterem empregos de baixa remuneração em comparação às outras.

Curiosamente, as meninas só foram afetadas pelo status de empreendedorismo dos pais das colegas do sexo feminino, sugerindo que formaram amizades mais próximas com colegas do mesmo sexo e interagiram mais com suas famílias. Por outro lado, a exposição dos meninos aos pais empreendedores de seus colegas não demonstrou nenhuma diferença notável em suas trajetórias de carreira profissional.

Ronchi e seus colegas estimaram que as meninas tinham 4% mais chances de abrir seu próprio negócio até os 35 anos de idade quando 16,7% de suas colegas de classe tinham pais empreendedores, em comparação com 5,3% de seus colegas de classe.

Também descobriram que as meninas que tinham um pai ou mãe empreendedor tinham 59,3% mais chances de se tornarem empreendedoras até os 35 anos de idade. Ao comparar esses dois efeitos, o impacto de se ter uma colega com um pai ou mãe empreendedor equivale a 6,5% do aumento da possibilidade do que se ter um pai ou mãe empreendedor.

“Esses efeitos são bastante robustos, especialmente considerando que nascer e crescer em uma família com um pai ou mãe empreendedor é um dos mais fortes fatores preditores de se tornar empreendedor", diz Ronchi.

Em sua análise, os pesquisadores descobriram um fato ainda mais encorajador: os negócios de mulheres precocemente expostas  a empreendedores superaram os criados por homens e mulheres que não tiveram tal exposição precoce. Em média, esse subconjunto de pequenas empresas tinha um maior número de funcionários e durava mais; eles também empregavam uma parcela muito maior de mulheres e funcionários que trabalhavam em meio período.

“Esses resultados desafiam a visão de que as empreendedoras mais bem-sucedidas entrariam na profissão independentemente da exposição precoce a esse tipo de atividade”, diz Ronchi. Afinal, parece que, em sua grande amostra, a exposição precoce - e o conhecimento, o capital humano e as decisões educacionais que fluíram dela - foram fundamentais para ajudar as meninas não apenas a entrar no mundo dos negócios, mas também a se dar muito bem/ter sucesso/êxito nele.

Sementes de uma rede

Embora a análise dos pesquisadores não forneça recomendações políticas específicas, eles conseguiram explorar o conjunto de dados para possíveis explicações para o impacto positivo da exposição precoce das meninas ao empreendedorismo.

Por um lado, os pesquisadores investigaram se as meninas expostas a empreendedores que trabalhavam em um setor específico tinham mais probabilidade de terem negócios nesse setor também. Este é um fator verdadeiro descoberto durante a pesquisa, que sugere que a exposição precoce a pais empreendedores em um setor específico pode dar às meninas conhecimentos valiosos específicos do setor.

Eles também encontraram evidências que a maior conscientização sobre os planos de carreira que as meninas tendem a ignorar, independentemente de a carreira ter ou não a ver com empreendedorismo, poderia ajudar a direcionar as mulheres para esse campo. Na verdade, observaram um efeito positivo semelhante ao analisar outra profissão que tradicionalmente é dominada por homens: a de professor universitário. Meninas com uma parcela maior de colegas do sexo feminino cujos pais são professores universitários mais provavelmente se tornam professoras universitárias.

Por fim, eles encontraram poucas evidências para apoiar um efeito de modelo tradicional, uma vez que era mais provável que as meninas se tornassem empreendedoras, independente do fato de ser o pai ou a mãe de seus colegas os empreendedores.

Juntos, os resultados sugerem que a exposição precoce ajuda a reduzir dois obstáculos importantes que as mulheres enfrentam no empreendedorismo. Primeiro, a exposição pode diminuir o obstáculo de se entrar para o mundo do empreendedorismos ao aumentar a conscientização das meninas sobre o empreendedorismo como uma carreira viável. E, em segundo lugar, pode reduzir os obstáculos de se ter êxito ao equipar as meninas com conhecimentos e habilidades específicas do setor que, de outra forma, poderiam ser difíceis de acessar.

“Esses efeitos combinados ajudam a explicar como a exposição precoce a empreendedores pode aumentar a probabilidade de as meninas entrarem no mundo do empreendedorismo e de apresentar melhor desempenho em suas carreiras", diz Ronchi.

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