Macã vermelha (Scott Liddell/Stock.Xchng)
Da Redação
Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.
São Paulo - O Banco Central (BC) decretou, em outubro, a intervenção no banco BVA, com a justificativa de que a instituição vinha cometendo “graves violações às normas legais” e “descumprimento de normas” que disciplinam sua atividade. Nos últimos dois anos, o BC precisou interferir na gestão de cinco bancos, todos acusados de fazer uma gestão que ameaçava o equilíbrio do sistema financeiro nacional.
O primeiro e mais notório desses casos foi o do PanAmericano, em 2010, que pertencia ao apresentador Silvio Santos. Há dois meses, a Justiça acatou denúncia contra 14 ex-diretores e três ex-funcionários do PanAmericano, em um processo que apura a responsabilidade por fraudes que deixaram um rombo de 4,3 bilhões de reais no banco. Contra os acusados, há denúncias de desvio de dinheiro e de manipulação de informações financeiras. Casos como esses ocorrem no mundo todo.
Também em outubro, a Justiça americana condenou a dois anos de prisão o indiano Rajat Gupta, ex-diretor do banco Goldman Sachs, por ter passado informações privilegiadas a um investidor durante dois anos. O juiz nova-iorquino que assinou a sentença declarou que Rajat era ganancioso e uma “pessoa boa que se afastou de seus melhores impulsos”.
A definição do magistrado americano resume tudo: a ganância, um pecado capital, afasta bons profissionais do caminho certo. “O ávido quer sempre mais e, ao achar que não sobreviverá com um lucro menor, muitas vezes recorre a expedientes desonestos para atingir suas metas”, diz o filósofo e consultor de empresas Jean Bartoli, de São Paulo. “Quando uma empresa fixa metas de 15% de lucro anual, embora a economia do país cresça apenas 2% no mesmo período, isso é ganância.”
Assim como os sete pecados capitais estabelecidos pelo papa Gregório I no século 6 d.C., os nove pecados corporativos que listamos nesta reportagem trazem danos não só ao espírito dos profissionais que os praticam mas também ao convívio entre os colegas, ao desempenho das equipes e até à imagem da companhia.
Além da ganância (em outras línguas, como o inglês, ela substitui a avareza na lista dos pecados originais), também corroem as relações profissionais a soberba, a ira, a preguiça, a inveja, a luxúria e até a gula. Acrescentamos, ainda, dois males contemporâneos: a intolerância e a ostentação — tão nocivos ao trabalho quanto os sete já citados.
Mais importante: todos nós estamos expostos às tentações e às ações pecaminosas do herege na baia ao lado. Nas páginas a seguir, os desvios de conduta são analisados por alguns dos principais pensadores brasileiros da atualidade. Quem nunca pecou no serviço que atire o primeiro grampeador.
Ganância
A Justiça da França, em outubro, condenou a cinco anos de prisão Jérôme Kerviel, ex-operador do banco Société Générale, acusado de fraudes que totalizam 4,9 bilhões de euros. Na Europa, ele tornou-se símbolo da cobiça que quase levou o sistema financeiro ao colapso em 2008. Em Wall Street — O Dinheiro Nunca Dorme, sequência do filme de 1987, o personagem Gordon Gekko, vivido por Michael Douglas, tem como lema “a ganância é boa”.
Trata-se de uma referência ao investidor Ivan Boesky, que declarou “a ganância é saudável”. No ano passado, pesquisadores da Universidade da Califórnia fizeram estudos para testar a frase de Ivan. A constatação: os mais ricos não só mentem mais em negociações como também adotam muitas atitudes antiéticas. A seguir, o psicanalista Jorge Forbes analisa os estragos de se levar uma vida gananciosa.
A ambição profissional está ligada à superação, a buscar a excelência em uma trajetória orientada pelo seu desejo. A ganância está ligada ao ganho por ganhar, indiferenciado, acumulativo. O ávido comporta-se em sua carreira tal qual o guloso com a comida (veja o quadro Gula). É um glutão cujo único termômetro é o quanto consegue “comer” de oportunidades que vê pela frente.
Ele quer aquilo que o faça “mais” — mais rico, mais poderoso. Suas escolhas seguem somente essa lógica, sem nenhum refinamento ou singularidade. Seu prazer é grosseiro. Por trás desse comportamento está a covardia da escolha. O ganancioso não se arrisca a escolher o que quer — porque pode errar, como qualquer pessoa —, por isso resolve essa dúvida tão humana querendo tudo. É incessante a busca de possuir o que lhe aparece pela frente.
A ganância atrapalha o trabalho. O cobiçoso lida com coisas diferentes como se fossem todas iguais. Para ele, tudo é oportunidade para ter mais, aparecer mais, ganhar mais — independentemente da tarefa e do que fará com o resultado. Uma pessoa gananciosa pode se beneficiar de um tratamento psíquico, mesmo porque, além de trabalhar mal, ela sofre de indigestão competitiva. É alguém angustiado, que sempre se pergunta se deixou passar alguma oportunidade, ou se alguém está “comendo” o seu “prato” corporativo.
Muitas empresas gananciosas não permitem que seus funcionários também o sejam. É bem comum essa contradição. De forma semelhante ao que acontece com uma pessoa, uma companhia perderá o controle de sua trajetória se for ávida por ganhos exorbitantes.
A ganância é burra, sem graça, pois não diferencia o que se deseja. O futuro exige mais escolha diferenciada do que essa ambição desmedida. É claramente mais difícil, pois implica escolhas, o que é sempre um risco.
Como qualquer outro vício, a ganância é ruim. Mas o poder destrutivo varia de acordo com o tamanho da influência do ganancioso. Se ele estiver no alto, o estrago pode afetar um número maior de pessoas.
Esse mal aborrece o seu praticante até o ponto de ele preferir enfrentar a angústia da escolha, ou seja, o risco de viver. Para suportar esse momento, pode ser necessária psicanálise. Do contrário, é como regime malfeito: passado um tempo, volta tudo a ser como antes.
Como enfrentar empresas gananciosas
Essas companhias são aquelas que estipulam metas cada vez mais altas para os seus funcionários. Em troca, tendem a reduzir a relação profissional a uma questão meramente financeira, oferecendo salários e bônus mais altos do que a média do mercado. Trata-se de um erro para as duas partes.
Entre os funcionários das companhias vencedoras do Guia VOCÊ S/A – As Melhores Empresas para Você Trabalhar 2012, só 7% apontam a remuneração como a principal fonte de satisfação profissional. Motivação (34%), aprendizado (25%) e identificação (14%) vêm na frente. “Mais importante que dinheiro é conhecimento, algo que você divide e nunca fica com menos”, diz a professora Tania Casado, da Fundação Instituto de Administração (FIA), de São Paulo.
Gula
Em um país no qual 40% da população está acima do peso, é fácil concluir que a gula é um pecado comum. Basta pensar no que ocorre na praça de alimentação do shopping mais próximo a seu trabalho na hora do almoço, de segunda a sexta, para imaginar o quanto as pessoas descontam na comida a pressão que trazem do escritório. Muitas empresas adotam programas de redução da obesidade.
A gula provavelmente é o mais suave dos pecados corporativos, pois geralmente atinge apenas o próprio pecador — ou talvez o colega ao lado, caso o glutão insista em comer tangerinas no escritório. “Ainda que não prejudique muita gente, o profissional de respeito tem de tomar cuidado para não virar motivo de piada no departamento”, diz o consultor Julio Sergio Cardozo, ex-presidente da Ernst & Young, que teve um guloso em sua diretoria. “Imagine um executivo passar o dia com um pacote de biscoitos na mão? Você precisa tomar muito cuidado com suas atitudes para que as pessoas respeitem você”, afirma Julio.
Soberba
Em 2007, às vésperas do lançamento do primeiro iPhone, da Apple, o presidente da Microsoft, Steve Ballmer, fazia troça do concorrente. “Quinhentos dólares por um telefone? É o telefone mais caro do mundo e nem tem um teclado!”, disse Steve, em um vídeo com 758 000 visualizações no YouTube. Hoje, cinco anos e 26 milhões de iPhones vendidos em todo mundo depois, a opinião de Steve transborda arrogância. Na história dos negócios, a incapacidade de ver o crescimento de um novo concorrente já vitimou inúmeras companhias.
Por trás desse erro tão cometido está a soberba dos líderes, que menosprezam quem não tem o mesmo porte. Steve desprezou o iPhone como as montadoras americanas ignoraram as fabricantes japonesas nos anos 1970. “Você tem a tendência de achar que o que faz é melhor do que aquilo que os outros fazem”, diz o filósofo pernambucano Luiz Felipe Pondé.
A soberba é o primeiro e o pior pecado. Vem de Adão e Eva, que desejavam ser iguais a Deus. E como não podiam, mentiram para si mesmos e para todos, fingindo que o eram. Para Santo Agostinho, esse comportamento é da natureza humana, como Édipo está para Freud. É uma espécie de trauma que todo mundo carrega, algo hereditário, uma doença genética. O interessante é que a arrogância é uma reação a uma economia da autoestima negativa.
E não dá para fugir disso: você sabe que é gordo demais ou pobre demais ou chato demais. Sempre há algo em falta nessa economia. As pessoas sempre acham que estão aquém do que gostariam de ser. A soberba é a reação imediata a isso. Você tem a tendência de achar que o que faz é melhor do que aquilo que os outros fazem. Vai sempre negar um estado de insuficiência, de carência, que a gente não quer vivenciar.
Sim, e essa é uma situação muito interessante. Quando você tem sucesso, precisa educá-lo, dar um certo limite a ele. Do contrário, vão querer bater mais em você. No mundo do trabalho, a soberba é um desafio justamente para os bem-sucedidos, porque eles têm motivo para serem soberbos.
O desafio é controlá-la de verdade no plano interno. Não basta fingir que é modesto. A dificuldade está em conseguir modular a soberba em si, perceber que tudo é vaidade no sentido de que tudo é vazio. Quem tem sucesso, seja profissional, seja financeiro, seja familiar, tem melhor noção disso. Se você não tem, passa o tempo imaginando que, se tivesse isso ou aquilo, não sentiria o vazio da vida. Mas quando você tem, de fato não tem mais por que fantasiar.
Acho que é o caminho do conhecimento, de experiência com a arte, a filosofia, a literatura. Ampliar seu repertório para poder comparar situações é um exercício. Leia Macbeth, um excelente exemplo para não se iludir com a soberba. Além, é claro, de comparar casos do próprio mundo corporativo, em que há pessoas que um dia estão em cima e no dia seguinte caem.
Reconheça que, se você está em cima, é porque conseguiu que uma série de pessoas fizessem coisas que possibilitaram sua ascensão. E não estou falando dessa bobagem do mundo corporativo que diz que todo mundo é irmão, colaborador, mas que, de fato, para conseguir realizar coisas você depende de pessoas. Você não tem de amá-las, mas sabe que depende delas. Então, use essa mesma capacidade que o levou ao sucesso para perceber como esse mesmo sucesso passa rápido.
A tradição diz que quem escreveu o livro bíblico Eclesiastes foi o rei Salomão, tido como o mais rico de Israel, na Antiguidade. É o livro que fala “A vaidade das vaidades, tudo é vaidade”. Na tradição judaica, você deve ler na festa da colheita para lembrar que ela só deu certo porque Deus permitiu. No nosso cotidiano, leia após um dia de muito sucesso, porque ele vai lembrá-lo que tudo é vaidade. As montanhas ficam, o mar fica e você passa. O mundo vai esquecer que você existiu. Isso ajuda a baixar a bola.
Acho que é uma maneira de termos elementos para conter a ansiedade de que somos finitos. Assim a vida tem um valor. É uma visão muito positiva, mas pode resvalar na autoajuda quando pensamos que, na maior parte do tempo, a maioria das pessoas não deixa legado algum e, no fundo de nossa alma, nós sabemos disso. O mercado de trabalho é tenso: você perde a família, os filhos culpam os pais etc. E acho que essa ideia de legado pode funcionar como uma espécie de calmante para tudo isso.
Como profissionais criam raciocínios orgulhosos
1.“Sou bom em tudo” – Excesso de confiança em suas competências faz o profissional ser orgulhoso demais para pedir ajuda.
2.“Sei o que o cliente quer” – Presunção de profissionais que consideram desnecessário consultar o mercado para validar suas estratégias.
3.“Não há nada de errado comigo” - Atinge gestores que, pressionados a melhorar o desempenho, resistem a obedecer, argumentando que estão certos e a empresa, errada.
4.“A concorrência é ruim” – A soberba dos líderes de mercado que menosprezam concorrentes de menor porte.
5.“Render-se, nunca. Retroceder, jamais” – Estado de negação em que profissionais recusam-se a rever uma estratégia que está dando errado.
Preguiça
A preguiça, originalmente, não tinha nada a ver com falta de vontade de trabalhar. “O preguiçoso era o homem que não se esforçava para salvar sua alma”, diz o filósofo Mario Sergio Cortella, de São Paulo. Na idade média, esse pecado traduzia uma melancolia que abatia os homens e os impedia de agir. Podemos traduzir também como apatia. No trabalho, uma dose de preguiça pode até ser produtiva de vez em quando. É o tal do ócio criativo. Mas viciar-se nesse estado de moleza compromete a imagem profissional. Sem motivação, ninguém avança.
Na Idade Média, ela era chamada de acédia, a preguiça de salvar-se em Deus. A pessoa tomada por esse pecado não queria fazer nada para buscar a salvação. Assim é no trabalho e na carreira: há muita gente que não quer fazer nada por si mesmo. O preguiçoso transfere a ausência de motivação para a carreira e substitui a ideia de esperançar, que é uma postura ativa, para a ideia de esperar, uma atitude passiva. O preguiçoso é aquele que adia em vez de realizar. Está sempre esperando alguém fazer com que as coisas aconteçam.
Se você está procrastinando demais, tem primeiro de descobrir se é preguiça mesmo ou se é estresse. Existe um adiamento prazeroso, mas também há a desmotivação, que você sente quando simplesmente não vê sentido em cumprir uma tarefa. É o esforço sem sentido. De certa maneira, é muito bom ter um chefe que coloque prazos e metas e cobre isso de você, que estabeleça consequências para trabalhos que não são entregues ou tarefas que não são cumpridas.
Essa é uma coisa normal, uma ocorrência eventual. O perigo é fazer dela um hábito. Claro que há momentos de preguiça. Basta pensar em uma lei fundamental da física — a da inércia. Nós tendemos ao repouso, nosso estado natural. Isso faz parte do exercício de se dar um tempo e não ser implacável consigo.
É quando você relaxa e adia a tarefa, sabendo que irá retomá-la mais adiante. Mas tem uma coisa: saber lidar com a lerdeza, a lombeira, não significa não vivenciá-la. O momento de prazer não pode suplantar a execução de suas tarefas. Ser implacável consigo é doentio, mas adotar como herói o Macunaíma, que dizia “Ai, que preguiça”, é autodestrutivo.
Nas empresas inteligentes, sim. A produção contínua só leva ao esgotamento. Na Totvs, desenvolvedora brasileira de software, por exemplo, há dois quiosques para os funcionários fazerem uma pausa e tomar um café. Em outras, há o cochilo depois do almoço. Vale lembrar que distração em latim é recreio, aquilo que nos faz criar de novo. Empresas inteligentes criam a preguiça estratégica para aumentar a criatividade.
Nossa tendência é economizar energia. Um repouso depois de grandes esforços é sinal de inteligência. Agora, adiar o trabalho pode significar fazê-lo dobrado no futuro. É necessário planejar essas paradas.
Como lidar com os efeitos da preguiça
Faça da preguiça um compromisso: Organize a agenda, anotando não só as reuniões, mas também os momentos dedicados ao descanso. A preguiça fora de hora nada mais é do que a falta de descanso na hora certa.
Valorize o ócio: “Se for dar um tempo para o ócio criativo, aproveite para fazer coisas realmente inspiradoras, como cultura e lazer”, diz Bernt Entschev, da De Bernt, empresa de recrutamento de executivos, de Curitiba.
Dose o ritmo: Alterne períodos de alta produtividade com outros de ritmo lento. “Se você produzir 100% em um ano, os acionistas irão cobrar 120% no seguinte. É preciso administrar”, diz Augusto Carneiro, da Zaitech, consultoria que faz coach para altos executivos, do Rio de Janeiro.
Inveja
O atacante Hulk, da seleção brasileira, foi contratado em setembro pelo Zenit, time russo, por 143 milhões de reais. Seu início na Rússia foi duro. Hulk foi boicotado pelos novos companheiros. O motivo seria o salário do brasileiro, estimado em 17 milhões de reais por ano. Invejar a renda é talvez o mais comum dos pecados corporativos — e pode ser o mais doentio também. “A inveja não é querer o que o outro tem, é querer que o outro não tenha”, diz Nilton Bonder, rabino e autor de A Cabala da Inveja (Editora Rocco).
No trabalho acontece, como na família ou na escola, entre pares. Invejamos pessoas próximas. O que chamam de inveja positiva não é inveja. Pode ser ambição. A inveja é sempre destrutiva. Ela não soma, multiplica ou divide. Ela sempre subtrai.
Inveja é doença e precisa de tratamento. Danifica, além da saúde, nossa produtividade e nosso profissionalismo. Quando tentamos impedir que outro tenha sucesso, colocamos a empresa em risco. Gestores devem estar atentos a esse comportamento e mostrar que ele contraria a visão da empresa.
Todo mundo, se as condições forem propícias. Portanto, todos devem cuidar para não deixar esse sentimento se instalar. É comum que o invejado tenha uma participação importante na inveja do invejoso. Ou seja, há pessoas que, por sua conduta, estimulam com maior intensidade esse sentimento.
Intolerância
O conselho do Citigroup anunciou em outubro a saída de seu presidente mundial, Vikram Pandit, e sua substituição por outro executivo do grupo, Michael Corbat. Vikram assumiu o principal cargo executivo da instituição em dezembro de 2007 em um momento em que o banco perdeu dezenas de bilhões de dólares na bolha imobiliária americana. O executivo enfrentou a crise, cortou 110 000 empregos e ficou famoso por reduzir seu salário para 1 dólar.
Em 2010, sob sua gestão, o Citi voltou a lucrar. De lá para cá, Vikram entrou em atritos com a cúpula, que exigia resultados mais expressivos. Por não conseguir entregá-los, Vikram foi substituído, apesar de seu esforço para recuperar as contas da instituição. A história mostra como o mundo dos negócios é implacável. Quando o profissional deixa de dar resultado, sua história importa pouco. Mas a intolerância não reside apenas nos grandes números.
Pequenas manifestações diárias de intolerância podem ser percebidas no tratamento que se dá ao funcionário de TI, que conserta um computador quebrado. Levamos para dentro do escritório o rigor, o alto nível de exigência de uma sociedade que se vê mais como consumidora do que como cidadã. “Não toleramos situações que provocam frustração ou descontentamento”, diz Dulce Critelli, professora titular de filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e coordenadora do Existentia, Centro de Orientação e Estudos da Condição Humana.
A convivência é tão importante para os homens que eles abrem mão de ideias e propósitos para chegar a um meio termo com o outro. É em nome desse convívio que estabelecemos acordos. Mas há quem confunda intolerância com autoafirmação. Quem age assim acha que estabelecer acordos é deixar de ser verdadeiro. É um equívoco. Nossa vida depende de acordos. Cada parte envolvida ganha e perde algo. Antes de reagir, pergunte: posso alterar a situação sem ser tão rígido? O que pretendo com minha intolerância?
Em uma empresa, em que o nível de cooperação tem de ser o melhor possível, a intolerância é tão prejudicial quanto em qualquer outro meio. O intolerante não consegue compreender o outro em suas intenções e interpreta tudo segundo seu próprio código e padrões de conduta. Não admite que o outro possa ter um ponto de vista, um desejo ou um modo de vida diferentes. E não faz isso de forma passiva. Ele reage com certa intensidade contra tudo com que não concorda. Há uma violência na intolerância. É importante compreender que a vida é cheia de diferenças e que elas podem nos ajudar a ampliar nossos horizontes e possibilidades.
Uma companhia depende da capacidade de cooperar de seus funcionários para atingir metas. É necessário maturidade para fazer acordos com pessoas de que não gostamos, ainda que seja uma condição necessária. Na vida pessoal, podemos nos afastar de quem discordamos. Essa escolha é quase impossível no trabalho.