Carreira

Os incentivos de desempenho nos tornam gananciosos?

A promessa de incentivos começa cedo: na pré-escola, alunos comportados ganham adesivos. Nas empresas, alcançar objetivos dá bônus aos empregados

Incentivos: será que um funcionário que trabalha por comissão se sente diferente em relação a dinheiro comparado a um trabalhador que ganha salário fixo? (Andy Dean/Thinkstock)

Incentivos: será que um funcionário que trabalha por comissão se sente diferente em relação a dinheiro comparado a um trabalhador que ganha salário fixo? (Andy Dean/Thinkstock)

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Da Redação

Publicado em 6 de janeiro de 2017 às 18h26.

A promessa de incentivos de desempenho começa cedo. Alunos da pré-escola ganham adesivos por bom comportamento. Mais tarde, os pais acabam comprando pizza para os filhos adolescentes quando trazem notas boas para casa.

No mundo dos negócios, os empregadores oferecem bônus por alcançar determinados objetivos.

Mas o que realmente esses incentivos representam? Pesquisadores estudaram seus efeitos a partir de dois ângulos: o desempenho apresentado por indivíduos e como eles se sentem a respeito da tarefa pela qual estão sendo recompensados.

Porém, "há na verdade uma terceira pergunta que, até onde sabemos, não foi feita", diz Loran Nordgren, professor associado de gestão e organizações na Kellogg School. "Será que isso afeta o valor que se atribui à recompensa em si?"

Em outras palavras, será que um funcionário que trabalha por comissão se sente diferente em relação a dinheiro comparado a um trabalhador que ganha salário fixo?

A resposta parece ser sim, de acordo com a nova pesquisa de Nordgren. Ele e uma coautora descobriram que pessoas recompensadas pelo seu desempenho expressam mais desejo por dinheiro do que as que recebem pagamentos fixos, mesmo quando os valores que acabam ganhando sejam semelhantes.

Esta ânsia elevada por dinheiro pode se manifestar de diferentes formas, tais como maior disposição para concluir uma tarefa tediosa para ganhar dinheiro ou uma diminuição da vontade de doar parte dos ganhos à caridade.

"Pode realmente afetar como eles tomam decisões financeiras", diz a coautora Julia D. Hur, aluna de Ph.D. na Kellogg.

O que causa essa mudança de atitude? Nordgren diz que pode ser simplesmente o fato de que incentivar as pessoas com dinheiro faz com que elas pensem mais frequentemente sobre dinheiro—é como uma pessoa de regime passar toda hora pelo bolo de chocolate na cozinha do escritório ou um ex-fumante que vê cigarros à venda no supermercado.

"Essa atenção alimenta ou aumenta o desejo por essas coisas", diz Nordgren.

As empresas que se utilizam de incentivos de desempenho para os funcionários talvez devam levar em conta as potenciais consequências do crescente materialismo dos trabalhadores, como por exemplo, negociações mais difíceis com funcionários que querem ganhar salários mais elevados ou, eventualmente, a perda de trabalhadores que acabam saindo da empresa para novos empregos melhor remunerados.

O impacto dos incentivos de desempenho

Nordgren e Hur começaram com um teste básico. Pediram para 95 universitários para resolver quatro labirintos.

Os participantes do grupo de "incentivo por desempenho" receberam US$ 1 por cada quebra-cabeça concluído, enquanto que os do segundo grupo ganharam um valor fixo de US$ 4, independente do desempenho.

Os quebra-cabeças eram fáceis o suficiente para que a maioria das pessoas concluíssem todos dentro do tempo previsto. Em seguida, os estudantes responderam a perguntas avaliando seu desejo por dinheiro em uma escala de 1 a 7.

Um terceiro grupo de "referência" simplesmente respondeu a esta pesquisa sem fazer quebra-cabeça nem receber pagamento.

Como previsto, os alunos do grupo de incentivo por desempenho mostraram mais interesse em dinheiro do que os nos outros grupos.

Sua classificação média foi de 4,4, enquanto os grupos com valor fixo e o de referência tiveram em média 3,91 e 3,78, respectivamente.

Outro estudo utilizou tarefas e recompensas semelhantes, mas empregou uma forma diferente de medir o desejo por dinheiro. Os participantes receberam bilhetes de rifa de um prêmio de US$ 100.

Cada aluno pode preencher até 70 bilhetes, mas tinham que escrever seu nome, número do registro de estudante e endereço de e-mail em cada um.

"Pode ser uma tarefa muito chata e repetitiva", diz Hur. Mesmo assim, os participantes de desempenho por incentivo preencheram uma média de 14 bilhetes, enquanto o grupo que recebeu um pagamento fixo preencheu, em média, cerca de oito bilhetes.

Dinheiro no cérebro

Os resultados não foram tão claros quando Nordgren e Hur testaram a disposição das pessoas em doar dinheiro.

Quando os alunos em um estudo de quebra-cabeças tiveram a opção de doar até US$ 4 para caridade—ou seja, todo o valor ganho com a tarefa—o grupo de desempenho por incentivo não doou significativamente menos do que os participantes que receberam pagamentos fixos.

Isso talvez tenha ocorrido porque os participantes tiveram opções limitadas em relação a quanto poderiam doar, de acordo com os pesquisadores.

No entanto, notaram um resultado diferente quando se perguntou aos participantes, em uma experiência semelhante, quanto hipoteticamente doariam para cinco instituições de caridade, sem mencionar o montante.

O grupo que recebeu um pagamento fixo estimou uma média de $ 365. O grupo de desempenho por incentivo foi mais miserável, estimando uma média de $ 180.

A equipe queria entender melhor o que poderia incentivar este desejo elevado por dinheiro. Assim, pediram para 80 participantes recrutados on-line para encontrar erros gramaticais em alguns textos.

Em seguida, os participantes avaliaram o quanto eles pensaram sobre dinheiro durante a tarefa. Mesmo que os pagamentos de incentivo fossem pequenos—10 centavos de dólar por erro corrigido, até um total de US$ 1—os participantes do grupo de desempenho por incentivo avaliaram a frequência de pensamentos relacionados a dinheiro em 4,38 de 7, em comparação com apenas 2,87 em um segundo grupo, que recebeu um valor fixo de US$ 1 para desempenhar essa tarefa.

Curiosamente, este efeito não se limitou a dinheiro. Recompensar as pessoas com outros tipos de prêmios, como doces, parece estimular o desejo por doces.

Em outro estudo de correção de gramática, os pesquisadores pagaram as pessoas com bilhetes de rifa para uma caixa de chocolates como prêmio.

Os participantes que ganharam bilhetes com base no desempenho avaliaram o seu desejo por chocolate cerca de 1 ponto mais alto do que os que receberam um número fixo de bilhetes para a tarefa.

Isso não significa que os incentivos de desempenho aumentam o desejo das pessoas por tudo.

Quando a equipe apenas descreveu um produto não relacionado, fones de ouvido sem fio, as pessoas no grupo de incentivo por desempenho não pareciam querer os fones de ouvido mais do que o grupo que recebeu um pagamento fixo.

Sendo assim, trabalhar com foco em uma recompensa específica, e não apenas ouvir a respeito dela, parece aumentar o desejo por aquele objeto, diz a equipe.

Incentivos para funcionários no ramo automotivo

Por fim, Hur e Nordgren queriam testar sua hipótese no mundo real. Será mesmo que o pessoal de vendas demonstra um forte desejo por dinheiro quando sua remuneração é baseada em comissão?

Os pesquisadores entrevistaram 460 vendedores em dezenas de concessionários de uma grande empresa automobilística na Ásia.

Em metade das concessionárias, o salário do pessoal de vendas dependia inteiramente das comissões. As outras concessionárias em grande parte pagavam salários fixos, com apenas 10% da remuneração proveniente de comissões.

Os pesquisadores pediram às equipes de vendas para responder a uma pesquisa que perguntava o quanto queriam o dinheiro, quanta atenção davam a isso, e o quão satisfeitos estavam com seus empregos.

O pessoal de vendas baseado em comissões avaliou seu desejo por dinheiro em 4,93, enquanto os nas concessionárias com salário fixo avaliaram em 4,32.

A diferença permaneceu significativa mesmo quando os pesquisadores controlaram fatores como renda estimada, satisfação e segurança no emprego.

É possível que outro fator desconhecido seja o responsável por esta discrepância. Por exemplo, é possível que as pessoas que optaram trabalhar em concessionárias baseadas em comissão tinham um certo traço de personalidade que os tornavam mais materialistas.

Embora o experimento ideal deveria envolver a designação de pessoas aleatoriamente para diferentes regimes de incentivo no local de trabalho e acompanhar como suas atitudes em relação ao dinheiro se alteram ao longo do tempo, "isto realmente foi o mais próximo que poderíamos chegar", diz Hur.

Uma estratégia míope?

Estas descobertas não significam que os incentivos de desempenho sejam sempre uma má ideia. Em alguns casos, estas recompensas podem tornar os funcionários mais produtivos.

No entanto, as empresas devem reconhecer que os regimes de incentivo no local de trabalho podem moldar sutilmente os valores dos funcionários, dizem os pesquisadores.

"Sem dúvida, não está livre de consequências", diz Nordgren. Por exemplo, os funcionários que se tornam mais materialista podem pedir salários mais elevados, ou o foco no dinheiro entre os colegas de trabalho pode afetar a moral.

De um ponto de vista cínico, o crescente materialismo dos funcionários pode parecer uma boa jogada. Afinal, quanto mais as pessoas querem dinheiro, mais trabalharão por ele.

Mas esta provavelmente é uma visão míope. As empresas precisam atrair e reter os melhores trabalhadores dentro de um orçamento razoável.

Se as empresas perguntam aos funcionários por que trabalham lá, "eles não querem que a primeira resposta seja 'Porque minha principal preocupação é o dinheiro e este lugar me paga melhor'", diz Nordgren. "Essa é a última coisa que eles querem ouvir".

Texto publicado com a permissão da Northwestern University (em representação da Kellog School of Management). Publicado originalmente no Kellogg Insight.

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