O empresário Paulo Pichini, da Go2Next, na versão piloto: risco calculado (Arquivo pessoal / VOCÊ S/A)
Da Redação
Publicado em 24 de julho de 2014 às 14h00.
São Paulo - No fim de 2011, o empresário Paulo Pichini, de São Paulo, criou a Go2Next, empresa de computação em nuvem. Lançar uma startup nessa área poderia ser uma atitude arriscada em uma época em que o assunto ainda era novidade por aqui.
Mas a experiência de Paulo em mais de 25 anos de carreira de executivo no mercado de TI o ajudou a ter confiança para tocar o projeto. Longe do trabalho, a paixão de Paulo também envolve risco: a corrida de carros fora de estrada. Ele é piloto e já participou de nove edições do Rally dos Sertões e de um Rally Dakar, o mais famoso (e perigoso) do mundo.
Capotou 14 vezes. "É um esporte de risco, mas me planejo o máximo possível", diz Paulo. "É menos arriscado do que andar de moto em São Paulo."
Todos os dias, as pessoas se deparam com situações que exigem escolhas com diferentes níveis de risco. No âmbito do trabalho, isso pode ser uma mudança de emprego ou a definição de determinada estratégia de negócio, por exemplo. Diante desse tipo de cenário comum, alguns profissionais são muito ousados e outros muito conservadores.
Por que isso ocorre? Um estudo de 2011 do Center for Decision Sciences (Centro de Ciência da Decisão) da Universidade Columbia, nos Estados Unidos, investigou os mecanismos que levam uma pessoa a tomar decisões arriscadas e descobriu algumas novidades.
Ao compreender melhor as causas das escolhas mais radicais, o estudo pretende oferecer às pessoas novas maneiras de controlar e modificar o instinto de ousar.
Uma das constatações do estudo mostra que, diferentemente do que se imaginava, a opção pelo risco não é apenas a expressão de um traço biológico de personalidade. Rotular alguém de arrojado ou não seria, portanto, um erro. Além da predisposição para emoções fortes, há outros fatores que têm peso igual ou maior na imprudência de um profissional.
"O fato de uma pessoa assumir um risco em determinada situação não significa necessariamente que ela vai agir de maneira semelhante em outra”, diz Elke Weber, uma das autoras do estudo e diretora do Center for Decision Sciences. “Pessoas que tenham apetites semelhantes para o risco podem fazer escolhas diferentes, influenciadas por outros aspectos.”
Uma das coisas que influenciam a tomada de risco é a esfera da vida em que a escolha está inserida — o estudo de Columbia separa em cinco áreas: lazer, ética, finanças, social e saúde. O empresário e piloto de rali Paulo Pichini pode ter um perfil de risco quando se trata de lazer ou de empreender, mas se considera conservador nos investimentos pessoais.
Outro aspecto é o processo psicológico da escolha. Uma escolha pode ser quente, rápida e emocional, ou fria, pensada e calculada — dois níveis de decisão que o psicólogo e Nobel de Economia Daniel Kahneman aborda no livro Rápido e Devagar (Objetiva, 2012). Vale notar que quente não é sinônimo de risco: a reação de uma pessoa diante de uma decisão rápida pode ser justamente eliminar qualquer perigo e tomar o caminho mais seguro.
Percepção do risco
A maneira como uma pessoa percebe o risco é muito importante na hora de tomar uma decisão. Biologicamente, o ser humano tem um viés otimista. Por causa disso, as pessoas acreditam que as chances de acontecer algo ruim com elas é menor do que a possibilidade de acontecer com os outros.
Isso seria uma das explicações de por que os avisos em maços de cigarro sobre os malefícios do tabagismo não têm muito efeito sobre os fumantes.
Outro fator associado ao risco é a expectativa de ganho. Durante a tomada de decisão existe uma armadilha chamada efeito de ancoragem, que é a tendência de basear a decisão em uma informação inicial — como ocorre quando negociamos o preço de um produto. O histórico de experiências de sucesso ou fracasso também interfere.
“Temos essa tendência de basear a escolha em informações disponíveis, principalmente se a decisão envolve um interesse pessoal”, diz Roberto Camanho, consultor em processo decisório e professor da ESPM, de São Paulo.
O excesso de confiança é outra armadilha e explica, por exemplo, por que renomados presidentes de empresas às vezes cometem grandes erros. “Ao tornar-se mais poderosa, a pessoa modifica suas fronteiras de risco e se expõe mais.”
Na hora de fazer opções de carreira ou de tomar decisões cotidianas no trabalho, conhecer aspectos do risco pode ser a diferença entre um erro e um acerto. Mas ser ousado é apenas uma das maneiras de agir profissionalmente. “Há uma pressão da sociedade para que a pessoa seja um macho alfa.
Ter atitudes mais ousadas é uma forma de reforçar essa posição e a percepção que os outros têm de você”, afirma o psicólogo Cristiano Nabuco.
Existe uma grande quantidade de empresas diferentes, com cargos e culturas diferentes, em que as pessoas que não são ousadas e quem é avesso ao risco tendem a se dar melhor. “Encontrar um lugar que seja adequado à atitude do profissional em relação ao risco é uma decisão importante a tomar”, afirma Elke. Mais um de muitos caminhos.
Como nasce uma atitude arriscada
1 Situações de perigo
O estudo da psicóloga Elke Weber, da Universidade Columbia, nos Estados Unidos, identificou cinco áreas da vida em que se pode assumir risco. Algumas pessoas são arrojadas em um aspecto e prudentes em outro. Veja como essas situações podem aparecer no trabalho.
Financeira — Influenciado pela perspectiva de alto retorno, um grupo de executivos pode optar por fazer um investimento ruim e ter um prejuízo no futuro
Ética — A pessoa pode fazer negócios que envolvam suborno e corrupção, ou trabalhar em uma empresa ciente de que ela causa danos ambientais
Social — O profissional que não tem medo da reação dos outros e fala o que pensa em uma reunião de negócios
Saúde e segurança — O profissional que não sabe equilibrar a relação entre lazer, exercício e trabalho
Lazer — A pessoa que gosta de fazer esportes radicais e se acidenta, como o ex-piloto de Fórmula 1 Michael Schumacher
Erros comuns de decisão
Calor do momento
Sob pressão, o profissional toma uma decisão mais arriscada do que faria se estivesse calmo. É o mecanismo da compra por impulso: empolgada (com o preço baixo de uma liquidação), a pessoa analisa mal as variáveis envolvidas e gasta mais dinheiro em algo que não queria.
Falsa certeza
A pessoa confia cegamente numa experiência positiva e se arrisca. É o executivo que fecha um mau contrato tendo na cabeça uma negociação anterior. O filme 127 Horas mostra um alpinista experiente que não teme ficar sozinho no deserto e acaba preso a um
paredão de pedra.
Sensação de perda
A pessoa percebe que está perdendo algo e toma decisões arriscadas para reequilibrar a situação. Como quando um lojista baixa preços ao ver um concorrente vender mais ou a pressa que leva o jogador de basquete a arriscar cestas de 3 pontos.
2 O processo psicológico
Uma decisão pode ser tomada de maneira afetiva, no calor do momento, em que as emoções — como a alegria de resultados positivos ou a tristeza da morte de um amigo — falam mais alto. Ou de maneira deliberada. Apostas e esportes radicais geralmente envolvem decisões mais quentes do que um investimento, por exemplo.
3 Percepções diferentes
A maneira como uma pessoa avalia se uma situação é arriscada ou não, aspecto determinante na hora da tomada de decisão, pode ser afetada por diversos fatores, como experiências passadas de sucesso ou fracasso, expectativa de ganho, quanto a pessoa está disposta a arriscar em troca de determinado ganho, aversão ao risco, familiaridade com o assunto que envolve o risco, excesso de confiança e ambiente (se uma empresa incentiva comportamentos de risco dos funcionários ou não).
1. Atitude no risco
Tente compreender suas reações ao risco e identifique quais os receios e as expectativas em relação à escolha. Após essa análise, pode ser que você conclua que sua reação tende a ser mais arriscada ou mais prudente.
2. Reflita sobre a decisão
Decisões por impulso costumam ter como base a emoção. Dê um tempo para que um raciocínio mais frio e analítico possa influenciar a escolha.
3. Arrisque pequeno
Experiência, familiaridade com o assunto e histórico de tentativas bem ou malsucedidas ajudam a construir confiança. Tomar pequenos riscos ajuda a criar segurança.
4. Tenha cuidado com o excesso de confiança
A pessoa confiante demais pode não prestar atenção em detalhes como alguém mais cauteloso faria. “Ao tornar-se mais poderosa, a pessoa tende a modificar a coragem e a se expor mais”, diz Roberto Camanho, consultor e professor da ESPM, de São Paulo.