Petrobras tem o maior endividamento do país (Acordo salgado)
Da Redação
Publicado em 11 de junho de 2014 às 11h59.
São Paulo - Quando a Petrobras anunciou a descoberta da camada do pré-sal em 2007, o Brasil foi alçado ao posto de sexta maior reserva de petróleo do planeta e a empresa despontou como uma das principais do mundo em valor de mercado, passando a ocupar o posto de 12ª maior empresa global.
Em março, valendo 76,6 bilhões de dólares, a Petrobras caiu para a posição 120, segundo levantamento do jornal inglês Financial Times.
Para piorar, a produção da Petrobras está em queda e seu nome está envolvido em suspeitas de operações fraudulentas.
“A Petrobras está enfrentando uma tempestade. Ela não consegue aumentar a produção (de 1,9 milhão de barris por dia em 2013, a menor desde 2008), seus indicadores econômico-financeiros não estão bons, há o endividamento e o governo segurou o preço da gasolina, fazendo com que a empresa não consiga gerar caixa suficiente”, diz Adriano Pires, diretor do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), consultoria especializada em serviços de inteligência e gestão de negócios no mercado de energia.
Há ainda o noticiário negativo sobre a compra de Pasadena e a prisão de um diretor. Isso afeta o mercado como um todo”, acrescenta.
Internamente, os funcionários ainda não sentiram o aperto da empresa. O número de empregados efetivos tem aumentado nos últimos anos. De 2009 para cá, passou de 76.919 para 86.111 (11,9% mais). Os gastos com pessoal também cresceram no período, de 15,6 bilhões para 27,5 bilhões de reais, um salto de 75,8%.
Apesar do anúncio, em janeiro, de um plano de desligamento voluntário que deve atingir 8.500 empregados, a situação preocupante vista do lado de fora não é percebida da mesma maneira pelos funcionários da Petrobras.
“Lá dentro, a sensação que temos é que trabalhamos em um gigante inexaurível, porque confiamos plenamente na capacidade técnica de suplantar quaisquer problemas. A questão é que os destinos da empresa não são traçados pelos técnicos competentes, e sim por políticas governamentais que só visam ao curto prazo. Ou seja, a próxima eleição”, diz o geólogo e consultor carioca Pedro Zalán, de 58 anos, funcionário da Petrobras de 1978 a 2012.
Segundo Pedro, os funcionários são bombardeados por um discurso nacionalista.
De acordo com o ex-funcionário da Petrobras, que se baseia em conversas com amigos que ainda estão na estatal, as críticas à gestão, aos resultados e aos dirigentes não são bem recebidas.
“As críticas à compra da refinaria de Pasadena, à estagnação da produção de petróleo, a prisão de um ex-diretor, tudo isso é um mundo distante para os funcionários quando se compara com os cerca de 40 bilhões de barris de reservas existentes no pré-sal”, diz ele.
Para o geólogo, poucos funcionários estão cientes de que, para as reservas virarem receita, será preciso tomar empréstimos no mercado, a juros altíssimos, por causa das restrições ao crédito da companhia. “Isso vai causar um endividamento acima dos limites permitidos pela boa prática do mercado, mas esta última parte nem sempre fica clara para o funcionário da Petrobras”, diz Pedro Zalán.
Por outro lado, o noticiário negativo tem afetado o andamento de projetos. “Por causa dos escândalos, todos os projetos estão sendo postergados. Até uma assinatura simples de um aditivo de prazo está levando mais tempo”, diz Giovanna Dantas, gerente de operações da NES Global Talent no Brasil.
“Numa situação assim, os funcionários têm dificuldade de tomar qualquer decisão. Ainda mais em um ano eleitoral”, diz Adriano Pires, do CBIE.
Segundo Adriano, nesse cenário as encomendas param, a Petrobras tem de rever todos os cadastros das empresas, criam-se comissões internas para checar se os procedimentos estavam corretos.
“Empresas que trabalham com a Petrobras acabam prejudicadas”, afirma. De fato, desde o segundo semestre do ano passado, empresas prestadoras de serviços da estatal vêm cortando pessoal.
Como a Petrobras é responsável por 92% da produção de petróleo do país, sua busca por redução de custos reflete nas prestadoras de serviços. Empresas como Halliburton e Baker Hughes — segunda e terceira maiores provedoras de serviços de petróleo do mundo — demitiram juntas, no ano passado, mais de 900 pessoas depois da diminuição de perfurações. Neste ano, a BP também demitiu cerca de 250 dos 300 funcionários.
Essas empresas, mais ligadas ao início da cadeia de produção do petróleo, passam por ajustes no país por causa do momento da Petrobras, que está mais focada na produção do que na parte exploratória. O que a estatal quer é aumentar a eficiência dos campos que já estão em produção para tentar melhorar o caixa”, diz Bruno Stefani, gerente da divisão de óleo e gás da consultoria Michael Page.
Segundo Bruno, os profissionais que mais têm sentido esse movimento são aqueles ligados aos processos de pesquisa, localização e perfuração dos campos petrolíferos, como engenheiros de perfuração, engenheiros de fluidos e gerentes de operações.
“Isso afeta os salários porque tem gente boa disponível no mercado e a oferta de vagas é maior que a procura. A remuneração ainda é alta quando comparada a outros mercados, mas não vivemos mais aquela euforia de cinco anos atrás. Os salários, sem generalizar para toda a cadeia de petróleo e gás, não cresceram nos últimos 12 meses como no período anterior”, diz.
Para Giovanna Dantas, da NES, a parte de subsea (instalação de equipamentos submarinos) também está parada. Procurada pela reportagem, a assessoria de imprensa da Petrobras respondeu que seus projetos estão sendo executados dentro do cronograma e que seu plano de desligamento voluntário é uma ação prevista no Programa de Otimização da Produtividade.
Se alguns setores da cadeia do petróleo sofrem os efeitos da crise da Petrobras, a produção nos estaleiros, responsáveis pela fabricação de plataformas flutuantes, ainda segue forte.
“Os negócios que existem hoje são decorrentes das rodadas de leilão do pré-sal realizadas no ano passado. Há, por exemplo, projetos de sondas de perfuração em andamento para ser entregues no começo do ano que vem”, diz Bruno Stefani, da Michael Page.
Mesmo assim, os especialistas apostam que 2015 será um ano melhor para o setor. “Ainda que a Petrobras não resolva todos os seus problemas, em 2015 os investimentos tendem a ser mais homogêneos, não só na produção mas também na exploração, na perfuração e na demanda por equipamentos. Os profissionais que estão em baixa hoje devem voltar a ser procurados”, prevê Bruno Stefani.