Adilson Matias de França, operador das centrais de atendimento do Itaú-Unibanco: "Explico que, assim como o alcoolismo, o endividamento é um problema que a pessoa precisa admitir que tem." (Marcelo Spatafora / VOCÊ S/A)
Da Redação
Publicado em 28 de maio de 2013 às 19h13.
São Paulo - Em 2007, aos 25 anos, Adilson Matias de França estava focado em crescer profissionalmente. Funcionário do Unibanco, ele fazia o atendimento aos clientes do varejo e buscava melhorar sua avaliação de desempenho para ser promovido. Recém-casado, o operador do Unibanco havia saído da casa dos pais há seis meses.
O casamento ia bem, mas as finanças começaram a desandar. De uma hora para outra, Adilson teve de acomodar no orçamento despesas com IPVA, IPTU, aluguel, água, luz, telefone e supermercado — contas que ele não via quando morava com os pais. Em pouco tempo, Adilson estava no vermelho.
"Tinha dívidas no cartão de crédito, no cheque especial e no crédito pessoal", diz. Não demorou, o impacto apareceu também no trabalho. "Deixei de cumprir metas no banco, chegava atrasado ao trabalho por estar na fila de outras instituições financeiras negociando crédito. Também recebia ligações de credores em pleno expediente."
Casos como o de Adilson são comuns. Um estudo divulgado no começo do ano, conduzido pela universidade americana Boston College em parceria com a seguradora MetLife, comparou o desempenho de profissionais endividados (cuja dívida está fora de controle) e não endividados.
Segundo a pesquisa, que foi realizada em nove países, 58% dos trabalhadores alegam problemas financeiros para justificar as faltas ao trabalho. Oito em cada dez empregados afirmam que a preocupação com as despesas que ultrapassam o orçamento reduz a capacidade de desempenhar um bom trabalho.
Outro levantamento conduzido em 2011 pela MetLife no Brasil ouviu 500 empregados e 250 empregadores e mostrou que 65% dos trabalhadores estão preocupados em "ter dinheiro suficiente para pagar as despesas do mês".
A pesquisa ouviu profissionais com salário até 10.000 reais e ainda revela que empregados endividados faltam mais ao trabalho, demandam mais licenças médicas, têm pior desempenho e, portanto, têm a progressão na carreira prejudicada. Os endividados têm três vezes mais abonos por faltas concedidos pela chefia do que os não devedores.
A essa altura você já deve ter percebido que o desequilíbrio nas finanças, de fato, arruína seu desempenho profissional. A situação de Adilson, o operador do atual Itaú-Unibanco, começou a mudar em 2008 quando ele viu na intranet do banco uma chamada que pareceu a solução para o seu inferno contábil: "Saia do Vermelho".
Ele participou de cursos e oficinas na empresa e aprendeu dicas valiosas sobre planejamento financeiro. As dívidas foram centralizadas em uma única conta — a do crédito consignado — em 48 parcelas mensais, encerradas em dezembro de 2012.
Educação financeira
"As empresas estão colocando a educação financeira em seus programas de qualidade de vida porque enxergaram que os problemas financeiros têm efeitos prejudiciais na vida familiar e no trabalho", diz José Alberto Neto Filho, professor de finanças do Instituto Educacional BM&FBovespa.
O caso do Itaú-Unibanco é um exemplo dessa realidade. Os primeiros esboços de um programa de educação voltado às finanças surgiram em 2004 e eram voltados aos correntistas, em uma época em que o acesso desmedido do brasileiro ao crédito começava a tomar forma.
O assunto ganhou força e foi direcionado aos funcionários a partir de 2011. “Buscamos mudar a cultura do empregado em relação ao dinheiro, trabalhando a questão do conhecimento, e não simplesmente a montagem de planilhas”, diz Denise Hills, superintendente de sustentabilidade do Itaú-Unibanco.
Uma das pernas do programa envolve uma série de palestras espalhadas ao longo do ano, que tratam de temas como a preparação para enfrentar as contas de início de ano e previdência. Outro componente do programa é um curso de e-learning. Dos 97.000 profissionais do banco, 50.000 já concluíram todas as etapas.
Soluções sofisticadas
"Com o tempo, esses programas evoluem para a questão dos investimentos, porque não adianta a pessoa parar de gastar se não souber o que fazer com o excedente", diz Janser Rojo, fundador da QI Financeiro Consultoria, especializada em educação em finanças.
Algumas empresas foram além de iniciativas como cursos e palestras e apostaram até mesmo na criação de um consultório financeiro. É o caso da Central Nacional Unimed, que identificou uma grande movimentação de desconto em folha por parte dos funcionários. A situação motivou a operadora de planos de saúde a desenvolver um programa para falar de controle de finanças.
"Trouxemos uma instituição para oferecer crédito consignado, com custo baixo, para auxiliar quem tinha nome sujo", diz o superintendente Rogério Muracca.
Na mesma linha, a HP, empresa de soluções de tecnologia, tirou do papel, há três anos, um programa de bem-estar financeiro e há um ano e meio o tema vem ganhando força — as palestras e os workshops mensais já foram frequentados por 15% dos 8 500 empregados.
Uma estrutura com profissionais especializados em economia e ciências contábeis foi montada para orientar os funcionários. Na média, são 250 atendimentos ao mês. "O intuito é mostrar ao pessoal como é possível se prevenir para o futuro", diz Antonio Salvador, vice-presidente de RH da HP.
Ainda que seja difícil correlacionar o programa com a melhora no desempenho, foi notado em pesquisa de clima anual que a satisfação com os salários e com as compensações oferecidas cresceu 15 pontos. Um sinal, talvez, de que o dinheiro esteja sendo mais bem administrado e a produtividade possa aumentar, já que o pessoal está com a cabeça mais focada no trabalho.