Pedro Faria, da BRF: desafio de criar uma marca mundial, mas percebida pelos consumidores como local (Ana Paula Paiva/Agência O Globo)
Da Redação
Publicado em 20 de março de 2015 às 08h00.
O ano começou com reestruturação na BRF, detentora das marcas Sadia, Perdigão e Qualy. Em janeiro, a sétima maior empresa de alimentos do planeta foi reorganizada em cinco unidades de negócio — Brasil, América Latina, Eurásia, Ásia e África/Oriente Médio —, cada uma com seu gerente-geral.
A brasileira foi subdividida em cinco diretorias — São Paulo, Sul, Sudeste, Nordeste, Centro-Oeste/Norte. Todas têm sua área de vendas, logística, marketing para ponto de venda, gestão comercial, finanças e RH. O objetivo da reformulação é descentralizar serviços para responder com mais agilidade às demandas de cada região. O anúncio da reestruturação coincidiu com a posse do executivo Pedro Faria, de 40 anos, como CEO global da BRF.
O plano de Pedro Faria é estruturar a BRF como uma empresa e uma marca mundial, em vez de mera exportadora de alimentos. Ele estaria tentando levar à prática o conceito de ‘glocal companies’, defendido pelo ex-presidente da divisão de novos mercados da Kraft Foods, o executivo indiano Sanjay Khosla. “Vejo Pedro perseguindo o sonho de criar uma marca global, mas percebida como local pelos consumidores em cada país”, diz Claudio Furtado, diretor do Centro de Private Equity e Venture Capital da Fundação Getulio Vargas, onde o presidente global da BRF se formou.
A inauguração, no ano passado, da mais nova fábrica da companhia fora do Brasil, em Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos, faria parte desse plano.
Em 2014, como presidente internacional da BRF, Pedro passou 144 dos 365 dias do ano em viagens. Neste ano, sua atenção maior será o Brasil. “Ele vai continuar viajando muito, mas agora pelo país”, diz um executivo próximo, que aposta no anúncio de projetos grandes, de largo impacto para o negócio ao longo do ano. “Ele não é alguém que busca crescimentos incrementais, mas saltos quânticos”, afirma esse executivo.
Quem conhece a história de Pedro sabe que não é exagero. Cofundador da Tarpon, gestora de investimentos com assento no conselho da BRF desde 2011, Pedro abriu seu caminho para a presidência executiva em 2013, ao convencer Abilio Diniz a deixar o Grupo Pão de Açúcar e assumir a presidência do conselho de administração da gigante de alimentos congelados.
Com o aumento do prestígio, assumiu o posto de presidente da área internacional e, em setembro do ano passado, foi aprovado pelo conselho para a presidência global. É difícil parar o executivo quando ele está determinado. Foi assim em 2010, quando ele se convenceu de que era hora de abrir o capital da rede de sapatarias Arezzo & Co, da qual era membro do conselho.
O problema é que o próprio presidente da companhia, Anderson Birman, era contra, por acreditar que a Arezzo não estava pronta. “Eu estava numa viagem e me ligaram falando que tinha um grupo de banqueiros visitando a empresa”, diz Anderson. “Fiquei com raiva, liguei para o Pedro e questionei como ele estava fazendo isso.” Na volta da viagem, Anderson deparou com um segundo grupo visitando a empresa. “Mas até o fim do ano eu já estava completamente envolvido no projeto de vender ações”, diz Anderson.
O jeito despojado e a juventude mascaram o poder de realização do executivo. Foi o que percebeu Ricardo Gontijo, presidente da construtora Direcional Engenharia, de Belo Horizonte, quando entrou em contato com a Tarpon, em dezembro de 2007, ao buscar um fundo que investisse 180 milhões de reais na companhia. “Quando vi aqueles garotos de calça jeans, tênis e mochilinha nas costas, não coloquei muita fé”, diz Ricardo, referindo-se a Pedro Faria e a seu sócio, José Carlos Reis de Magalhães Neto. “Em 16 de janeiro, a primeira parcela do dinheiro, 110 milhões, foi depositada”, afirma.
A partir dali, Pedro passou a compor o conselho da Direcional, parceria que duraria cinco anos, e Ricardo pôde conhecer o estilo de trabalho do executivo, que tem como característica estudar profundamente os mercados em que investe para poder opinar no negócio. “Ele viajou comigo o Brasil inteiro”, diz Ricardo, e conta que, nos primeiros anos, Pedro vinha toda semana à empresa e, no último, pelo menos uma vez por mês estava presente.
De acordo com quem o conhece, Pedro trabalha cerca de 15 horas diárias, dorme muito pouco e ainda encontra energia para praticar esportes, como tênis, futebol e ciclismo. “Ele não é um cara pacato, que passa o fim de semana lendo um livro”, diz um executivo próximo. “Não invejo quem vá tentar acompanhar o ritmo dele”, diz o empresário Ricardo Semler, presidente da Semco Partners e primeiro investidor da Tarpon.
Esse jeito acelerado também marca o estilo de trabalho de Pedro Faria, descrito como alguém de perfil mais executivo do que estratégico. “Quando está todo mundo sonhando e planejando, ele é a pessoa que diz: ‘Tá bom, mas vamos começar?’ ”, diz um conhecido. “É ele quem faz as coisas acontecer”, afirma Ricardo Gontijo, da Direcional.
Por isso mesmo, a aposta do mercado é que a gestão de Pedro à frente da BRF seja marcada pela atitude empreendedora. “A empresa certamente levará um susto ao encarar na sua liderança um empresário, e não um superexecutivo”, diz Ricardo Semler.
Segundo o empresário, Pedro Faria deve preparar a retaguarda de operações e finanças para poder se dedicar ao ganho de mercado em nível global, em vez de buscar ganhos marginais, na forma de cortes, ou apenas maior rentabilidade. Em última instância, o objetivo de Pedro será fazer da BRF um dos principais atores do mercado mundial de carnes.
Um plano ambicioso, que precisará de um presidente igualmente ambicioso e empreendedor para ser colocado em prática.
Os números da BRF
Faturamento: 30 bilhões de reais*
Empregados: 105 000
Fábricas: 58 (47 no Brasil e 11 no exterior)
Países importadores: 110