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"Não podia expressar quem eu era", diz Maureen Chiquet

Em entrevista exclusiva a EXAME, ex-presidente da Chanel conta por que escreveu um livro para empoderar as mulheres em suas carreiras e vidas pessoais

 (Timothy A. Clary/Agence France-Presse/Getty Images)

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Marina Filippe

Marina Filippe

Publicado em 31 de agosto de 2019 às 06h00.

Última atualização em 6 de setembro de 2019 às 10h16.

Vinte e quatro horas depois do desfile de alta costura da marca de luxo Chanel, em Paris, em janeiro de 2016, Maureen Chiquet, a então presidente da Chanel, anunciou sua saída após dez anos no comando da marca. A empresa anunciou o movimento “devido a diferenças de opinião sobre a direção estratégica da empresa”.

Desde então, Maureen revirou seu guarda-roupa cheio de peças de luxo e mudou sua vida. Ela, que estava num casamento heterossexual de quase três décadas assumiu o relacionamento com a consultora Tess Beasley, compartilhou sua vida pessoal e profissional a partir de um livro e, posteriormente, incentivou mais mulheres a assumirem suas identidades para ocuparem cargos de liderança em empresas e em suas próprias vidas.

No Brasil, essa história acaba de chegar com a publicação em português de “Do nosso jeito”, pela editora Seoman. Sobre o livro, e a presença de mulheres em posições de liderança, Maureen Chiquet falou com exclusividade à EXAME:

EXAME - Há diferença entre ser líder em uma empresa e ser líder da própria vida?

Maureen Chiquet - Para ser um líder eficaz, devemos começar por nós mesmos - ou seja, saber o que nos motiva, o que fazemos bem e o que precisamos desenvolver. A cultura de uma empresa é definida, mantida e, finalmente, transformada por seus líderes. Portanto, é importante que eles reflitam sobre seus próprios comportamentos para transformar ou manter uma cultura.

EXAME - A senhora fala sobre se livrar de rótulos, mas começa o livro com informações sobre como costumava se vestir. Como um líder pode estar aberto aos diferentes tipos de rótulos físicos e intelectuais?

Maureen Chiquet -Tudo começa com convidar pessoas com perspectivas diferentes para as tomadas de decisões. A fim de abraçar a diversidade, temos que ouvir vozes que nem sempre estão no alto escalão da empresa. Caso contrário, é fácil cair no pensamento de grupo e repetir os erros do passado.

EXAME - O que de mais importante a senhora aprendeu desde a renúncia?

Passei a entender quando não estou mais alinhada com o meu senso propósito. Eu amava a marca, minha equipe e todo o prestígio de ser presidente da Chanel, mas me senti fora de mim porque estava incapaz de expressar quem eu era e o que precisava fazer.

EXAME - O livro chega no Brasil agora, mas foi lançado nos Estados Unidos em 2017. A senhora mudaria algo se pudesse reescrevê-lo hoje?

Maureen Chiquet - Não mudaria nada, mas talvez acrescentasse mais histórias que revelaram novos aprendizados desde a minha saída da empresa. Por exemplo, minhas duas filhas começaram a ter suas próprias carreiras e eu os vejo tentando identificar quais compromissos e decisões são realmente necessárias em suas vidas. Eu também estou aprendendo como os melhores planos nem sempre dão certo e, às vezes, oportunidades com menores expectativas se tornam as mais interessantes.

EXAME - Por que a senhora acredita ser importante compartilhar assuntos pessoais? E no trabalho, compartilhar informações pessoais com colegas é promissor?

Maureen Chiquet - Acima de tudo, somos seres humanos. Todos nós passamos boa parte de nossas vidas no trabalho e, para mim, é vital compartilharmos quem somos no local de trabalho. Uma vez que conhecemos nossos colegas como pessoas, não apenas como "chefes" ou "subordinados", podemos ter conversas reais e respeitosas. Assim, fica mais fácil trabalhar juntos para encontrar soluções inovadoras, apesar de nossas diferenças.

EXAME - Quais são os sentimentos e dificuldades que as mulheres lhe revelaram depois de ler o livro?

Maureen Chiquet - Tive muitas conversas com as mulheres sobre como ser mãe e continuar com uma carreira poderosa. Muitas mulheres ainda sentem que precisam ser “perfeitas” e, quando lêem o livro, elas percebem que não há problema em não seguir um modelo de perfeição. Elas se sentem confortadas quando ouvem falar de outras mulheres que lutam com os mesmos problemas.

Também tive conversas sobre assédio e falta de direitos para as mulheres no ambiente de trabalho. Muitas de nós ainda sentem que é difícil ter o mesmo nível de respeito que seus colegas homens. Discutimos maneiras de confrontar essas questões com uma comunicação honesta e não violenta. Também discutimos o que elas podem fazer para começar a transformar a cultura das empresas.

EXAME - A senhora fala sobre  "operar nos padrões masculinos”. Por que as mulheres trabalham assim?

Maureen Chiquet - Muitos sociólogos e psicólogos fizeram uma distinção em traços de liderança ao longo da linha de gênero. Eles acreditam que os homens demonstram mais assertividade, foco e lógica de pensamento estratégico ambicioso; enquanto as mulheres demonstram mais empatia, abertura, agilidade, colaboração e escuta. Não tenho certeza se é uma questão de gênero. No entanto, acredito que ambos os lados precisam administrar um negócio de maneira eficaz. E muitas vezes os chamados "traços masculinos" são valorizados bem acima dos “femininos”. Assim, as mulheres forçam-se a mascarar suas características não-valorizadas. Na minha opinião, nós precisamos de mais atributos chamados de "femininos" para abraçar o mundo do século 21.

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