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Mulheres no golfe: o esporte antes dominado por homens de elite agora tem elas no campo

No Dia do Golfista, conheça a trajetória de África Madueño, preparadora física que desafia estereótipos deste esporte que é sinônimo de negócios e networking

África Madueño, preparadora física especializada em golfe: "O golfe me ensinou que não é sobre acertar sempre — é sobre seguir jogando” (Mariana Martucci/Divulgação)

África Madueño, preparadora física especializada em golfe: "O golfe me ensinou que não é sobre acertar sempre — é sobre seguir jogando” (Mariana Martucci/Divulgação)

Publicado em 10 de abril de 2025 às 07h33.

Última atualização em 10 de abril de 2025 às 12h53.

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Homens com camisa polo, boné, óculos escuros e risadas discretas. À primeira vista, parece um encontro de negócios fora do escritório. E é. Só que em vez de gravatas, há tacos – e muitas vezes um charuto na boca. Em vez de sala de reunião, um campo com grama bem aparada.

Esse é o campo de golfe — lugar onde se fala pouco, se observa muito e se erra mais do que se acerta. Cada tacada carrega mais do que a busca por um buraco distante: carrega decisões.

Decisões que poderiam ser fechadas dentro de uma companhia, mas é muito comum ver executivos fechando negócios durante uma partida de golfe, isso porque 4 horas no campo tem um impacto quatro vezes maior do que uma reunião de trabalho, afirma África Madueño Alarcon, preparadora física especializada em golfe.

“Durante esse tempo no campo, as pessoas conversam, riem, compartilham frustrações, erram juntas - como numa longa viagem de carro”, afirma a preparadora de golfistas (atletas que possuem um dia do ano reservado para homenagem – dia 10 de abril).

Para Madueño o campo de golfe é como um espelho do caráter e por isso é comum líderes empresariais recorrerem a partida para negociar grandes projetos. “Quem trapaceia neste esporte, provavelmente o faz na vida. Quem zomba dos erros do outro, também o fará em outras áreas, quem tem desequilíbrio emocional por não saber lidar com erros, mostrará”, afirma. “No esporte, a máscara cai. No golfe, especialmente. E é aí que surgem os melhores negócios - quando as pessoas são vistas como realmente são.”

Nos Estados Unidos, Madueño afirma que além de negócios, entrevistas de emprego já foram feitas no campo. No Brasil, no entanto, o esporte ainda é cercado de estereótipos e barreiras – especialmente para as mulheres. Mas isso está mudando.

Mulheres no campo (e no jogo)

Atualmente, o Brasil conta com aproximadamente 20 mil golfistas registrados. Desses, cerca de 15% são mulheres, totalizando aproximadamente 3 mil praticantes femininas, segundo a Confederação Brasileira de Golfe (CBGolfe). “O número de mulheres no golfe no Brasil está crescendo, mas é preciso oferecer mais acesso ao esporte”, diz Madueño que se especializou em golfe graças aos cursos nos Estados Unidos, porque ainda não existiam por aqui.

Um dos projetos no Brasil que está ajudando mais mulheres a entrarem neste campo é o Mulheres & Golfe, do qual Madueño faz parte. A iniciativa oferece um programa de treinamento físico de 8 semanas específico para mulheres interessadas no esporte, independentemente do nível de habilidade.

"Este evento foi idealizado para promover o golfe entre mulheres e acabou reforçando também a minha paixão pelo esporte, em um momento que eu estava desistindo”, afirma a educadora física que diz que já estão formando a próxima turma.

Quando ela entrou no esporte?

Diferentemente da maioria das mulheres que se aproximam do esporte por influência do marido, África entrou no golfe por iniciativa própria — por curiosidade, desejo de explorar um mercado novo e paixão pelo conhecimento.

“Tem as viúvas do golfe, que são as esposas que ficam sem ter o que fazer no fim de semana porque os maridos vão jogar. Eu sou o contrário: sou a esposa que joga e tenho um viúvo do golfe em casa”, afirma Madueño.

Há alguns anos, ela olhou para o golfe com olhos de quem via ali um oceano azul. Espanhola de nascimento, brasileira por construção, Madueño buscava uma modalidade onde pudesse aplicar seus conhecimentos em educação física na USP de forma mais estratégica – e menos estética. “A área de personal trainer era muito generalizada. Queria algo com mais profundidade”, conta.

Foi numa aula de pilates que ouviu pela primeira vez sobre esportes de rotação, como tênis, beisebol e o golfe. “Fui pesquisar: será que existe golfe no Brasil?” E descobriu que sim – existe, embora ainda cercado por muros invisíveis.

“Era um universo completamente masculino. Só tinha homem jogando, dando aula, decidindo. Eu era mulher, e nem jogadora era,” conta. Mas, com sua formação na USP, especialização nos EUA e paixão por biomecânica, Madueño começou a estudar tudo o que podia. Enviava artigos traduzidos para revistas especializadas, observava aulas, oferecia ajuda técnica aos professores. Aos poucos, virou referência.

Hoje, ela é uma das colaboradoras do projeto Mulheres & Golf, liderado por Patricia Tavares e Karen Schneider, que oferece aulas introdutórias para mulheres em São Paulo. Já passaram mais de 500 alunas por ali – muitas que nunca imaginaram segurar um taco. “Tem médica, advogada, dona de casa, recém-divorciada, mulher que nunca ganhou um troféu na vida e sai daqui com um na mão.”

Golfe, liderança e o invisível que se revela

O golfe tem essa coisa sutil de nos ensinar sobre nós mesmos. Você observa o outro – e é observado. “Repara quem respeita o campo, quem conserta a grama, quem ri da tacada errada do outro. Quem zomba, quem acolhe, quem zanga”, afirma a educadora física.

“Você pode até se esconder no dia a dia, mas no esporte sua máscara cai”, diz Madueño. E, talvez por isso, o golfe seja tão formador de lideranças.

Madueño reforça que é um esporte que exige paciência, resiliência e capacidade de tomar decisões sob pressão. “É cálculo e estratégia. É aprender que a tacada errada já passou, e o que importa agora é a próxima. Que não se vence no grito, mas na constância. Que o caminho até o buraco pode ter curvas, vento, areia e ego”, afirma.

Talvez por isso tantos grandes nomes do esporte mundial tenham feito do golfe seu lazer favorito: Federer, Nadal, Michael Jordan. “Porque é um desafio diferente. O golfe é o esporte dos cabeçudos”, brinca Madueño. “Aqueles que analisam, observam, não se desesperam fácil.”

O jogo que nunca é o mesmo

Se a quadra de tênis é sempre igual, o campo de golfe nunca é. Nem mesmo de um dia para o outro. “A umidade muda, a bandeira muda de lugar, o vento sopra diferente. É preciso reaprender todos os dias. Ajustar. Estar presente”, afirma a preparadora.

Madueño, que hoje dá consultoria em biomecânica e preparação física para golfistas, também está em transição. Está se tornando oficialmente uma profissional do golfe – e enfrentando resistência. “Tem gente que diz que não sou jogadora o suficiente. Mas meu currículo é muito mais robusto que de muitos que já ensinam.”

Ela segue. Porque sabe que mais mulheres virão depois. “O golfe é o esporte mais solitário e mais gregário que existe. É possível jogar sozinha, mas se torna muito mais divertido quando é compartilhado, especialmente com outras mulheres”, afirma Madueño que hoje já vê a filha seguindo seus passos no esporte – o que acaba sendo mais um motivo para ela continuar.

"O golfe me ensinou que não é sobre acertar sempre — é sobre seguir jogando. Foi neste esporte que aprendi que a próxima tacada é sempre mais importante do que a anterior. Você não pode mudar o que passou, mas pode decidir a sua direção e o seu alvo, e o meu é de colocar mais mulheres neste campo," afirma.

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