Carreira

Brasileiro trata de dinheiro com muito fatalismo

Lawrence Harrison, diretor da Escola de Relações Internacionais da Tufts University, em Massachusetts, fala da culpa que o brasileiro carrega no trato com o dinheiro

Ilustração - Homem e suas economias (Kleber Sales/EXAME.com)

Ilustração - Homem e suas economias (Kleber Sales/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 13 de junho de 2013 às 07h48.

São Paulo - O hábito brasileiro de esconder os ganhos e reclamar sempre de falta de dinheiro pode ter um fundamento bastante científico. O coorganizador do aclamado A Cultura Importa (Ed. Record), Lawrence Harrison, diretor da Escola de Relações Internacionais da Tufts University, em Massachusetts, nos Estados Unidos, é um dos principais estudiosos do tema.

Em entrevista à VOCÊ S/A, ele explica um pouco mais sobre a influência da cultura na prosperidade dos países e dos indivíduos. 

VOCÊ S/A - Qual a principal característica do latino-americano quando se fala do dia a dia na construção de sua riqueza?

Lawrence Harrison - Na América Latina, o rico é muito mais visto como alguém beneficiado por ganhos ilícitos, por exemplo, por meio de conexões duvidosas ou atividades ilegais. Além disso, também há uma preferência católica pelos mais pobres. Há uma passagem em Mateus 19:24 que diz: “E, outra vez vos digo que é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um rico no reino de Deus”.

Em contraste, como Max Weber ressaltou em sua obra A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, o protestantismo celebra a riqueza. Ironicamente, países de maioria protestante têm uma população menos pobre do que os países de maioria católica. A diferença entre a América Latina e o sul europeu é menos relevante, assim como não vejo diferença de comportamento entre o Brasil e os pares latino-americanos. 

Para o latino-americano todas as coisas boas da vida — riqueza principalmente — são limitadas, então a vida vira uma corrida em que o campeão é aquele que capturar o máximo dos benefícios disponíveis. Para a população canadense e norte-americana, por exemplo, a riqueza não é uma disputa, mas passível de multiplicação. 

VOCÊ S/A - Quais são as características culturais que geram esse comportamento? 

Lawrence Harrison - Um grande autor argentino chamado Mariano Grondona arquitetou uma vez uma lista de fatores fundamentais na diferenciação das populações. Entre esses 25 fatores que ele elenca, eu destacaria três. O primeiro é o fatalismo. Na cultura latino-americana, as pessoas acreditam profundamente na atuação de forças superiores no controle de seu destino.

Outro fator importante é a relevância da educação. Em democracias avançadas, 70% a 90% dos adultos têm pelo menos o Ensino Médio completo. Na América Latina, esse número só passa de 50% no Chile. No Brasil, em 2010, esse número era de 20%. 

Por fim, um importante ingrediente do desenvolvimento econômico é a confiança interpessoal. O Brasil foi o campeão mundial de “desconfiança” na sequência de pesquisas do World Values Survey Association de 2000, que perguntou para um número significativo de pessoas em 67 países “se a maior parte das pessoas era confiável”. Entre os brasileiros, apenas 3% responderam “sim”. Em contraste, nos países nórdicos, a proporção de respostas positivas variou de 41%, na Islândia, a 67%, na Dinamarca.

VOCÊ S/A - Há no Brasil uma espécie de culpa relacionada com a riqueza e com a acumulação de capital. Isso seria também um fator sob influência religiosa?

Lawrence Harrison - Claro! Mas a maioria católica brasileira está caindo rapidamente com o surgimento do Protestantismo Pentecostal. O censo de 2010 mostra que 30% da população brasileira está nesse novo caminho, e o crescimento é tão rápido que a expectativa é que em 2020 o Brasil tenha maioria protestante. O Brasil é o laboratório mais importante para a tese de Max Weber.

Acompanhe tudo sobre:ComportamentoDinheiroEdição 168educacao-financeiraEntrevistas

Mais de Carreira

Ele trabalha remoto e ganha acima da média nacional: conheça o profissional mais cobiçado do mercado

Não é apenas em TI: falta de talentos qualificados faz salários de até R$ 96 mil ficarem sem dono

Ela se tornou uma das mulheres mais ricas dos EUA aos 92 anos – fortuna vale US$ 700 mi

Entrevista de emprego feita por IA se tornará cada vez mais comum: ‘É real, está aqui'