Cannabis: como o Brasil ainda tem uma regulamentação mais restritiva e não há perspectivas para o mercado de uso recreativo, as profissões do setor estão relacionadas ao uso medicinal, aos serviços auxiliares e a uma futura permissão do plantio industrial para extração medicinal (Nunature/Divulgação)
Victor Sena
Publicado em 13 de outubro de 2021 às 14h52.
Última atualização em 20 de outubro de 2021 às 15h34.
O ano de 2020 pode ser considerado como o início do desenvolvimento do setor de cannabis medicinal no Brasil. Apesar de a Anvisa permitir a compra online via importação da substância canabidiol desde 2015, foi apenas no ano passado que farmacêuticas puderam solicitar à agência uma autorização para vender nas farmácias físicas do país e processar o derivado da maconha em instalações do país.
No momento, apenas a farmacêutica paranaense Prati-Donaduzzi recebeu o aval, mas a Anvisa tem uma fila de outros empreendimentos que estão apostando neste mercado.
Como faz exigências rígidas para o processamento e venda dessa substância que deve ter a matéria-prima importada, a entrada de novas marcas nas prateleiras segue um ritmo lento. Hoje, a principal forma de compra o canabidiol é via importação da substância pela internet.
Como mostra esta reportagem da EXAME, o setor pode chegar a 4,7 bilhões de reais no país em três anos, segundo a empresa de pesquisas New Frontier Data, isso porque há todo um mercado auxiliar que se desenvolve ao redor das produtoras do canabidiol, como médicos prescritores, assessorias jurídica especializadas e no futuro deve haver alguma autorização para plantio industrial para extração medicinal.
Com isso, profissionais especializados têm sido exigidos e novas profissões surgem.
É a partir de um cenário assim, em que o plantio é autorizado, que a empresa Kaya Mind prevê que o setor poderia gerar até 328 mil empregos para economia brasileira após o quarto ano da sua regulamentação no Relatório Impacto Econômico da Cannabis. Neste cálculo, estão incluídas vagas dentro do setor da exploração industrial do cânhamo — variação da cannabis que pode ser utilizada principalmente para fibras têxteis.
Atualmente 371 mil profissionais trabalham na indústria de cannabis nos EUA e já somam mais que engenheiros elétricos e dentistas no mercado de trabalho, segundo dados da US Bureau of Labor Statistics. Estes dados são validados pela plataforma de busca de emprego, a Indeed, que registrou um aumento superior a 57% no número de vagas de trabalho em cannabis de 2019 para 2021 por lá.
Vale destacar que o plantio do cânhamo é legalizado nos Estados Unidos e há uma economia já complexa de fazendas com foco em extração das substâncias medicinas como o canabidiol. Além disso, há o mercado de cannabis recreativa, que também movimenta a economia em determinados estados do país.
O canabidiol é uma das substâncias presentes na planta cannabis sativa e tem indicações para dores crônicas, convulsões, insônia e ansiedade. Ele não tem efeitos psicoativos.
Um novo marco no avanço do mercado seria a autorização para o plantio, que garantia a extração da matéria prima canabidiol em solo brasileiro. O Projeto de Lei no 399/15, que autoriza o plantio por empresas, associações e para pesquisa científica, foi aprovado em Comissão Especial da Câmara dos Deputados no início de junho, mas ainda não foi ao plenário.
Como o Brasil ainda tem uma regulamentação mais restritiva e não há perspectivas para o mercado de uso recreativo, as profissões do setor estão relacionadas ao uso medicinal, aos serviços auxiliares e a uma futura permissão do plantio.
Marcelo Grecco, fundador da aceleradora de startups do setor de cannabis The Green Hub, destaca que o que está surgindo no país são especializações de profissões que já existem.
Por aqui, são médicos especializados, farmacêuticos, enfermeiros e veterinários que precisarão conhecer melhor do que se tratam os canabinoides - nome dado às diversas substâncias da cannabis. Isso só para falar do setor de saúde.
O que deve haver no Brasil é o surgimento de diversos profissionais especializados em toda a cadeia. Grecco destaca também profissionais para a área de cultivo, como agrônomos especializados, mesmo que o plantio ainda não seja permitido.
A indústria farmacêutica que entrar neste ramo também deverá contratar bioquímicos com conhecimentos sobre a planta. Outra profissão que deve ter demanda serão os advogados.
"Em qualquer lugar do mundo desenvolver negócios em torno da cannabis exige muita expertise jurídica. Mesmo as regulamentações mais abertas têm pontos de complexidade e contar com boa consultoria legal é essencial para evitar transtornos. É uma ótima área para advogados se especializarem", comenta Marcelo.
Caso o plantio do cânhamo para utilização da fibra seja permitido, um mercado de têxtis também deve se abrir, com demanda por profissionais deste setor. Como já visto, a lista é longa.
O mercado parece promissor para outra empreendedora do setor de cannabis do Brasil. Viviane Sedola, fundadora da plataforma Dr. Cannabis, criou o curso "Você no Mercado de Cannabis", que é focado justamente em ensinar o caminho das pedras para quem quer oportunidades profissionais ou empreender dentro da área.
Para quem deseja encontrar alguma oportunidade profissional, o site Cannabis Empregos tem reunido vagas do setor que já tem começado a aparecer no país. No Instagram da marca, também são anunciadas oportunidades.
Em países em que o uso legal é permitido, como nos Estados Unidos, houve um boom de surgimento de profissões que são realmente uma novidade, como "sommeliers" de tipos de cannabis para consumo recreativo que auxiliam consumidores em lojas de estados como a Califórnia e o Colorado.
Essa profissão é conhecida como "budtender". Outra profissão nova e surgiu em países com permissão o uso recreativo é o de "Master Grower", que seria como um mestre-agricultor, especialista em escolher a melhor variedade para produzir determinado tipo efeito no consumo.