Carreira

Feitos um para o outro

Para garantir fidelidade e alto desempenho, as empresas estão aprimorando suas ferramentas para atrair e reter profissionais. Elas estão bem mais seletivas

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 31 de julho de 2013 às 15h24.

São Paulo - Funcionários talentosos, que entregam resultado, sempre terão espaço nas empresas. Hoje, porém, grandes companhias, como Natura, Promon e Odebrecht, levam em conta mais do que isso para contratar e promover.

Elas procuram profissionais cujos valores pessoais estejam alinhados aos da organização e estão aprimorando suas ferramentas para identificar pessoas com o perfil que desejam. Esse trabalho já vinha sendo feito pelos recrutadores, mas agora a seleção na contratação e na hora da promoção ficou mais criteriosa.

A mudança de comportamento dos empregadores — eles estão mais atentos e seletivos — que está em curso se dá pela maior necessidade de retenção dos profissionais, pois as empresas querem evitar o retorno ao cenário pré-crise, em que levava o melhor profissional a empresa que pagava mais.

Há também a vontade, por parte de algumas corporações, de rever o modus operandi no ambiente corporativo, dando mais ênfase a comportamentos éticos e que sejam respaldados pelos seus códigos de valores e de conduta. Isso, porém, não significa abdicar da busca por resultados. 

Uma pesquisa com 161 companhias globais feita pelo professor e consultor Daniel Denison, que leciona na escola de negócios suíça IMD e há 20 anos estuda o tema, reforça essa tese. As empresas mais bem avaliadas em aspectos culturais, como missão, envolvimento e integração, apresentam taxa média de retorno sobre investimento superior em até 15 pontos percentuais em relação às concorrentes.

“Para alcançar grandes resultados, uma organização precisa de pessoas que cumpram suas tarefas de maneira condizente com os valores que ela adota”, diz Nathan Bennett, professor de gestão e comportamento organizacional da universidade Georgia Tech, nos Estados Unidos.

A Natura, fabricante de cosméticos com sede em Cajamar, São Paulo, já vivenciou os dois lados dessa história. A empresa é conhecida por combinar sua estratégia de negócio com os princípios de preservação do meio ambiente e responsabilidade social. Lá, o funcionário que não atinge ao menos 50% das metas não financeiras, como emissão de carbono e clima organizacional, fica sem bônus. 


No dia a dia, os gestores são incentivados a cultivar a informalidade e a busca por consenso nas decisões. Nos últimos anos, porém, a Natura cresceu vertiginosamente e contratou profissionais que não estavam alinhados com esses valores. O resultado foi perda de mercado, piora no clima e aumento na rotatividade de funcionários.

No início do ano passado, iniciou-se uma série de mudanças estruturais, que abrangem desde a gestão operacional até a integração dos novatos para retomar o rumo. Neste ano, a companhia reeditou seu programa de trainees, suspenso em 2008, em novo formato. A divulgação foi feita por meio de um vídeo na internet, que não diz o nome Natura, mas somente os valores que ela adota.

Não foram exigidas formação ou competências mínimas para participar. Cerca de 13.000 candidatos se inscreveram, menos da metade do número registrado em 2007. “Não queremos atrair pela marca, mas construir uma relação duradoura com nossos profissionais, a partir de valores compartilhados”, diz Marcelo Cardoso, vice-presidente de desenvolvimento organizacional.

Convidado por Marcelo, o engenheiro paulistano Daniel Levy, de 32 anos, se identificou com a proposta e assumiu em janeiro deste ano a gerência de sistemas de gestão da Natura. Daniel começou a carreira na consultoria INDG e, mais tarde, montou com um sócio a sua própria empresa.

Em 2007, eles decidiram vendê-la e, de lá pra cá, Daniel se envolveu em alguns projetos de curto prazo. “Quando vim para a Natura, estava em um momento de reflexão sobre a carreira e buscava algo que trouxesse conhecimento”, diz Daniel. Esse tipo de relação, baseada em identidade, pode ser um bom negócio tanto para o empregador como para o empregado.

As organizações vencedoras do Guia VOCÊ S/A- EXAME – As Melhores Empresas para Você Trabalhar 2009 comprovam isso. Nas dez primeiras colocadas no ranking, em média, 94% dos funcionários se dizem identificados com a companhia. Essas organizações conseguem manter a motivação em alta e tirar o máximo do talento do seu pessoal.

Basta dizer que a rentabilidade sobre patrimônio das 150 melhores empresas é de 12,7%, ante o rendimento de 3,5% das 500 listadas pelo anuário Melhores & Maiores, editado pela revista Exame, também da Editora Abril. “Para melhorar o desempenho em tarefas que exigem criatividade, os incentivos financeiros não funcionam”, diz o escritor americano Daniel Pink. “A produtividade no trabalho aumenta quando existe um propósito maior.”  

Choque cultural

Se o alinhamento cultural pode impulsionar o desempenho de pessoas e empresas, por outro lado, a falta dele pode ter efeitos graves para os negócios e para a carreira. “Cerca de 80% das demissões em cargos de liderança são consequência de comportamentos indesejados”, diz Felipe Westin, diretor da Right Management, empresa de recolocação em São Paulo, e ex-executivo de RH de empresas como Alcoa e Dow.


É importante dizer que as organizações nem sempre são transparentes ao negar uma promoção ou demitir por motivos comportamentais e, assim, não colaboram para que as pessoas repensem suas atitudes.

“Isso faz com que profissionais competentes fiquem estagnados na carreira sem saber o motivo“, diz Felipe. No entanto, enquanto deficiências técnicas podem ser corrigidas, mudar os valores de um profissional é sempre mais difícil. 

O exemplo da Promon, empresa de engenharia e tecnologia com sede em São Paulo, ilustra bem isso. No ano passado, a companhia ampliou o seu quadro de funcionários em 50%. Dos quase 400 profissionais contratados, 35 foram desligados com menos de um ano de casa, por dificuldade de adaptação à cultura.

“Trouxemos algumas pessoas sem espírito de integração e participação [valores da empresa]”, diz Márcia Kopelman, diretora de relações humanas. Para garantir que os próximos contratados tenham o perfil adequado, a Promon reformulou, em 2008, seus processos de seleção, dando maior ênfase à avaliação das competências comportamentais.

Além disso, a companhia treinou 50 gestores em práticas de recrutamento e está implantando um sistema informatizado de contratação, para assegurar que todas as etapas sejam cumpridas. O engenheiro paulistano Rodrigo Ojima, de 30 anos, enfrentou esse filtro mais rigoroso em dezembro do ano passado e foi aprovado para uma vaga de analista de negócios.

Na chegada à empresa, ele participou de uma série de palestras e atividades de integração, e foi acompanhado por um funcionário designado para esclarecer suas dúvidas sobre o trabalho. “A gente vive a cultura da empresa desde o primeiro dia”, diz Rodrigo.

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