Patrocinador corporativo (Ilustração: Cris Vector)
Da Redação
Publicado em 19 de novembro de 2013 às 18h38.
Tudo começou com um estudo realizado pela Catalyst, organização americana sem fins lucrativos que acompanha o avanço das mulheres no mercado de trabalho, com 4 000 profissionais de alto potencial. A pesquisa, publicada em 2010, revelou que 83% das mulheres ante 76% dos homens afirmaram ter tido ao menos um mentor em algum momento da carreira. Porém, mesmo com esse apoio, elas continuavam distantes do topo. Para entender melhor o fenômeno, três especialistas da Catalyst fizeram entrevistas em maior profundidade com 40 homens e mulheres selecionados por multinacionais para participar de programas de mentoring. A sondagem concluiu que ter um mentor apenas não basta para garantir promoção ou crescimento na carreira. É preciso ter um patrocinador com poder na empresa. “Um mentor faz aconselhamento e orientação profissional, enquanto o patrocinador defende ativamente o nome de seu protegido na mesa de decisão quando chega a hora de uma promoção ou oportunidade de desenvolvimento”, esclarece Christine Silva, diretora sênior de pesquisa da Catalyst, em entrevista à VOCÊ RH.
De lá para cá, ainda de maneira tímida e informal, a figura do sponsor, como é chamado o patrocinador em inglês, vem ganhando terreno no cenário corporativo. As razões são muitas. Primeiro, porque não só os protegidos são beneficiados no processo, mas os patrocinadores também. Outro estudo da Catalyst publicado neste ano revelou que as pessoas que patrocinaram outros profissionais tiveram um aumento nos benefícios de 25 000 dólares em um período de dois anos. Segundo, porque também foi comprovado que ter um sponsor aumenta a satisfação e, consequentemente, o engajamento do funcionário. Uma pesquisa feita com 4 000 executivos pelo Center for Talent Innovation, organização sem fins lucrativos de Nova York que fomenta ideias sobre diversidade e gestão de talentos, aponta que 70% dos homens e 68% das mulheres com patrocinadores sentem-se mais satisfeitos com sua taxa de avanço dentro da companhia. E vai além: as mulheres que têm um patrocinador estão ativamente dispostas a negociar melhores salários e promoções.
No estudo da Catalyst, os líderes disseram acreditar que para crescer na carreira não basta ter talento, é preciso muitas vezes ter alguém que queira arriscar a sua própria reputação ao recomendar um profissional para um papel importante. “E isso só acontece quando o líder percebe que está investindo em outro futuro líder, o que é bom para a empresa, para o sponsor e para o protegido”, afirma Christine. Por isso, o papel do patrocinador só pode ser exercido por pessoas que têm assento na mesa de decisão. “O sponsor irá abrir as portas da organização e usar a sua influência para defender um funcionário e ajudá-lo em projetos e serviços que possam melhorar sua posição e visibilidade”, completa Christine.
Foi o que aconteceu de maneira informal entre Lygia Fray Villar, diretora de RH da Brookfield Incorporações, e Alessandro Vedrossi, diretor executivo da unidade de São Paulo. “Entre os programas da empresa, fui indicada para o de mentoring, para me ajudar a conhecer melhor o negócio, principalmente o mercado de incorporações”, diz ela. Com mestrado em mercado imobiliário e pós-graduação na área jurídica, o engenheiro civil Vedrossi é um executivo respeitado na companhia e no mercado e foi o escolhido para colar em Lygia.
Em um ano e meio de programa, a relação entre os dois foi além da orientação e do desenvolvimento de carreira. No início do ano, Lygia planejou lançar um programa de desenvolvimento de liderança com foco nas necessidades do dia a dia da operação. Antes de apresentar ao presidente, mostrou ao sponsor. “Concluímos o programa a quatro mãos. Ele me ajudou a dar uma visão mais técnica e, na hora de apresentar ao presidente, deu apoio público e mostrou a importância do projeto, complementando o que eu estava propondo. No final, o programa foi aprovado”, diz ela.
Além de Lygia, Vedrossi foi escolhido por mais outros três executivos da companhia para ser mentor. A diferença é que nem todos ganharam um advogado para ajudar a defender ideias e projetos, e dar visibilidade no ambiente corporativo. “Apesar de os dois papéis se misturarem, existem diferenças entre mentor e sponsor. O mentor olha o comportamento dentro da empresa, dá feedback mais assertivo, ouve e ajuda a pessoa a caminhar no ambiente corporativo, a se relacionar. O sponsor precisa acreditar nas ideias do outro para poder ajudar a defendê-las”, diz Vedrossi.
Para Stella Angerami, da Counselling by Angerami, empresa de aconselhamento de carreira, de São Paulo, o patrocinador é importante nos momentos em que executivos de alto nível levam nomes de talentos de alto potencial para discutir quem irá receber promoção. Para isso, o profissional também deve cultivar a relação com possíveis patrocinadores. “É preciso ao longo do ano ir alimentando o sponsor de realizações, ideias e projetos. Só assim ele terá na cabeça, inconscientemente, o discurso certo para defendê-lo”, afirma Stella.
Relação informal
A figura do sponsor, tal qual manda sua definição, ainda é rara nas organizações. Na maioria das vezes, a relação entre patrocinador e protegido acontece informalmente, sem nomeações ou contratos. “Isso significa que ninguém está gerindo o processo para assegurar que os diversos colaboradores de alto potencial tenham igual acesso ao patrocínio”, diz Christine.
Nos Estados Unidos, empresas como American Express, Cisco, Deloitte, Intel, Morgan Stanley e Unilever iniciaram programas novos para incentivar o patrocínio, principalmente com foco no avanço das mulheres. Na Unilever, por exemplo, foram criadas sessões de networking para desenvolver oportunidades de patrocínio, enquanto Deloitte, PepsiCo, Intel e American Express deram início a programas que visam ajudar as executivas a encontrar sponsors.
A Cisco criou um programa de inclusão de advogados, termo usado para patrocinador na empresa, com o objetivo de expandir a rede de defensores e de novas fontes de capital de conhecimento, além de tentar aproximar os talentos dos contatos influentes. Na subsidiária brasileira, o termo e o programa ainda não são conhecidos. “O patrocínio não é necessariamente um processo formal. Essas relações acontecem em meio a projetos e iniciativas específicos. É nesses momentos que as pessoas vão se conhecer e, assim, defender possíveis promoções ou oportunidades de transferência para outros”, afirma Silvio Paciello, que acaba de assumir a diretoria de RH da Cisco no Brasil.
A Promon Engenharia é uma exceção à regra, pois há um processo formal para garantir que todos tenham acesso ao patrocínio. Na empresa, a figura que assume o papel de patrocinador são os coordenadores de disciplinas, profissionais experientes que conhecem bem a área em que atuam e sabem lidar com pessoas. São eles os responsáveis por definir processos de trabalho, metodologia, inovações, ferramentas e pessoas de cada atividade específica. “Como a companhia trabalha por projetos que podem durar um ou três anos, acreditamos que a responsabilidade de desenvolvimento, remuneração e promoção não pode estar na mão do chefe direto”, explica Márcia Fernandes, diretora de relações humanas e comunicação. “O coordenador é o patrocinador, sugere desenvolvimento, dá oportunidade de exposição, promoção e mudança salarial.”
Com uma visão mais horizontal, o patrocinador da Promon consegue orientar e movimentar as pessoas de acordo com as possibilidades de desenvolvimento e visibilidade em projetos estratégicos. Porém, para isso, todos precisam fazer a sua parte. “Treinamos o coordenador para fazer esse trabalho, mas os profissionais também precisam se expor ao grupo. Eles devem trazer novos assuntos, ferramentas e inovações para discutir, descobrir novas tecnologias e publicar no blog de cada disciplina. Ser ativo”, diz Márcia.
Não há dúvida de que criar uma cultura corporativa de patrocínio irá fazer bem à sua gestão, gerando líderes e equipes mais engajados e comprometidos. É preciso tomar cuidado, porém, com a linha tênue que separa o patrocínio do paternalismo. “O sponsor não pode ser injusto para defender seu protegido. Ele precisa agir tanto no que é positivo quanto nas questões negativas, orientando para que ele se desenvolva para crescer”, afirma Marco Aurélio Vianna, consultor e palestrante da Fundação Instituto de Administração (FIA), de São Paulo. Nesse ponto, todos os especialistas são unânimes: não basta ter um patrocinador, é preciso também trabalhar duro para ser reconhecido.