Duas pessoas em sessão de mentoria (moodboard/Thinkstock)
Claudia Gasparini
Publicado em 7 de fevereiro de 2017 às 15h00.
Última atualização em 7 de fevereiro de 2017 às 16h25.
São Paulo — Diante dos desafios e percalços do mundo do trabalho, você já desejou a orientação de alguém mais experiente que você? Alguém que não impusesse suas próprias verdades, mas que fizesse comentários e sugerisse caminhos para a sua carreira?
Pessoas de todas as idades e níveis hierárquicos experimentam essa sensação. Uma alternativa interessante, embora em estágio incipiente no mercado brasileiro, é a mentoria — um modelo de acompanhamento similar ao mais conhecido coaching, mas com particularidades importantes.
No livro “Mentoria: Elevando a maturidade e desempenho dos jovens” (Integrare Editora, 2015), o escritor e consultor Sidnei Oliveira explica a distinção entre as diversas fases do desenvolvimento humano, e as três figuras principais que podem guiá-lo.
O professor é o primeiro desses personagens: ele orienta o início da vida de qualquer pessoa, por meio de explicações objetivas. “Um dia, quando você era criança, alguém disse que era preciso olhar para os dois lados ao atravessar uma rua”, diz Oliveira. “Essa pessoa agiu como professora, porque transferiu conhecimentos e deu instruções para uma determinada ação”.
Já o coach ou treinador aparece na hora de colocar a teoria em prática. No exemplo mencionado, ele pegará na sua mão para atravessar a rua com você. Ele vai relembrar as instruções e acompanhar o seu desenvolvimento naquela determinada competência, isto é, andar ao seu lado.
O mentor aparece num terceiro momento. Seu papel é ser um provocador. “Ele vai atravessar a rua, olhar para trás e dizer para você: ‘Vem? Se eu consegui, você também consegue’”, diz Oliveira. “O propósito não é mais transmitir informações e nem treinar competências, mas estimular a autonomia, isto é, fazer com que a pessoa atravesse a rua sozinha”.
As três figuras são complementares e não é raro que se fundam em um mesmo indivíduo, às vezes. Mas o grande diferencial do mentor está no fato de ele funcionar como uma referência para você — uma pessoa que você lembrará, para sempre, como alguém que mudou a sua vida profissional.
Em entrevista exclusiva a EXAME.com, Jill Hazelbaker, vice-presidente de relações governamentais e de comunicação da Uber para as Américas, disse que sua carreira meteórica como executiva se deve à ajuda de grandes mentores, inclusive muitas mulheres, que lhe trouxeram lições e oportunidades valiosas.
Quer saber mais sobre o assunto? Com a ajuda de Oliveira, compilamos 6 perguntas e respostas sobre o universo da mentoria de carreira. Confira a seguir:
1. Qual característica melhor define um mentor?
A experiência. Um mentor sempre será alguém que passou por uma vivência ligada à demanda do mentorado. Se você busca ajuda porque vai passar um tempo trabalhando na China, por exemplo, o seu mentor precisa ter atuado profissionalmente no país asiático.
Isso não quer dizer que ele deva ser alguém excepcionalmente bem-sucedido: ele pode ter se dado muito mal, aliás. O importante é que tenha “cicatrizes”, isto é, que tenha aprendido na pele como é estar naquela situação que você está prestes a experimentar.
Dito isso, o mentor verdadeiro não é apenas um veterano com boas histórias para contar. Ele precisa buscar formação em escolas especializadas, onde aprenderá conceitos e métodos de mentoria e obterá um certificado.
2. Qualquer pessoa pode buscar o acompanhamento de um mentor?
Sim. Tanto recém-formados quanto pessoas muito mais velhas podem buscar esse tipo de acompanhamento. Basta ser um novato no assunto em questão — o que não tem nada a ver com idade ou tempo de carreira. Um executivo de nível sênior que atuou por 40 anos exclusivamente no Brasil, por exemplo, é um completo principiante quando o assunto é carreira internacional.
3. Como funciona e quanto tempo dura um processo de mentoria?
O modelo é parecido com o de um processo de coaching ou até de alguns tipos de psicoterapia. Há sessões mensais ou semanais nas quais o mentor conta sua própria história, discute ideias e faz provocações para o mentorado. Ele já vai com um roteiro formatado para esses encontros, que podem ser presenciais ou online.
O processo costuma ser dividido em oito ou 10 sessões ao longo de um ano. Como o vínculo entre mentor e mentorado pode se tornar forte, é comum que o laço nunca se rompa totalmente. Nada impede que a relação possa continuar ao longo dos anos, embora normalmente com encontros bem mais espaçados entre si.
4. Como o mentor é remunerado?
Como um coach ou psicoterapeuta. Em geral, o mentorado paga por um pacote de sessões, cujo valor individual depende do seu objetivo e de quem é o profissional contratado. Um encontro pode custar de 150 a 200 reais, ou chegar até a 5 mil reais se o mentor for uma pessoa muito famosa.
Em outros casos, o serviço pode ser feito por voluntários, em modo pró-bono, ou pago pela própria companhia onde você trabalha. Muitas empresas enxergam a mentoria como um dos pilares de atuação do gestor. Nesses casos, elas próprias vão oferecer bônus para o seu líder pelo trabalho que ele fizer com você nesse sentido.
5. Qual é a diferença entre um mentor e um psicoterapeuta?
A confusão é comum, mas um não tem absolutamente nada a ver o outro. Ao contrário do psicoterapeuta, o mentor não procura investigar as causas dos incômodos apresentados pelo mentorado. Seu papel é ajudá-lo, de forma pontual, a alcançar um único objetivo pré-determinado.
Não é raro que um mentor perceba, em algum momento do processo, que o seu mentorado na verdade busca o trabalho de um psicólogo, e então precisa encaminhá-lo para esse tipo de profissional.
6. Onde posso encontrar um mentor?
Mais madura em países da América do Norte e da Europa, a mentoria ainda está engatinhando no Brasil. Por isso, ainda há poucos profissionais disponíveis no mercado. Se a sua empresa não oferece um programa interno, o caminho é ficar de olho em pessoas interessantes e buscar a melhor abordagem para conquistá-las como suas mentoras.
Há também algumas escolas especializadas que recebem pedidos e indicam os profissionais mais adequados para o seu perfil. Só tome cuidado com os charlatões, que infestam o mercado. O ideal é encontrar alguém que tenha uma formação específica e certificação como mentor.
Fuja também de quem não tem a menor propriedade para falar sobre o assunto. Alguém que nunca teve um negócio próprio não pode ser mentor na área de empreendedorismo, por exemplo. “O caso mais bizarro que já ouvi até hoje foi o de um homem que oferecia mentoria sobre empoderamento feminino”, conta Oliveira.