Renata Rivetti, fundadora da Reconnect: O modelo de 4 dias de trabalho precisa seguir o padrão de 100 – 80 – 100: 100% de pagamento de salário, trabalhando 80% do tempo e mantendo 100% da produtividade (Getty Images/Divulgação)
Repórter
Publicado em 11 de agosto de 2023 às 06h00.
Trabalhar home-office já é uma grande mudança no regime de trabalho, mas o formato de 4 dias de expediente e 3 dias de folga ainda está em teste em alguns países. No Brasil, a oportunidade de testar esse novo formato chegou este ano.
Toda a empresa brasileira, seja ela de porte pequeno, médio ou grande, poderá se inscrever até o dia 31 de agosto para o teste de 4 dias de trabalho. No Brasil, o teste piloto já tem dia para começar e será realizado pela Reconnect Happiness at Work, empresa privada especializada em treinamentos voltados à felicidade e saúde corporativa, em parceria com a 4 Day Week Global, ONG que criou e fornece mentoria sobre a semana de 4 dias de trabalho, e a Boston College, universidade americana que cuidará do treinamento das empresas, segundo Renata Rivetti, fundadora da Reconnect:
“Muitas empresas brasileiras poderão implementar os 4 dias de trabalho com todo o nosso apoio. O treinamento está previsto para começar em setembro de 2023 e o teste piloto, quando as empresas diminuirão o tempo de trabalho para 4 dias, será a partir de novembro deste ano com duração de seis meses”.
A ideia surgiu em 2018 com o empresário Andrew Barnes, fundador da neozelandesa Perpetual Guardian. Ele sentiu a necessidade de buscar formas para aumentar a produtividade da sua empresa. Decidiu, então, fazer uma proposta aos seus funcionários: caso aumentassem a baixa produtividade diária, ganhariam um dia para ter mais tempo livre.
“O piloto foi medido e acompanhado pela Universidade de Auckland para garantir a veracidade dos dados, e teve resultados positivos, tanto na questão da produtividade, quanto na questão da saúde mental. Desde então, o formato despertou o olhar do mundo”, afirma Rivetti.
Considerando o retorno positivo, Barnes fundou a 4 Day Week Global em 2019, uma organização sem fins lucrativos que fornece mentoria para pessoas e empresas interessadas em apoiar a ideia da semana de 4 dias como parte do futuro do trabalho.
Para que o teste piloto seja realizado em um país, é necessário que a 4 Day Week Global tenha um parceiro nacional. No Brasil, esse parceiro é a Reconnect Happiness at Work, empresa que cria culturas corporativas desde 2020, que será a responsável por organizar o teste piloto.
“Já trabalho por meio da Reconect com a saúde mental e bem-estar dos funcionários e comecei a acompanhar o que estava acontecendo com os pilotos globais. Os resultados eram excelentes em todos os pilotos. Foi aí que fui conversar com o time da 4 Day Week Global para entender as expectativas de trazer o teste para o Brasil. Eles encontraram sinergia entre o nosso propósito e o da ONG, e assim fechamos essa parceria que vai trazer ao Brasil a mesma metodologia que tem sido utilizada ao redor do mundo”, afirma a fundadora da Reconnect.
Essa metodologia, ao contrário do que muitos acreditam, não se resume em tirar a sexta-feira, mas redesenhar a jornada de trabalho, afirma Rivetti.
“Existe sim uma forma de trabalhar melhor e a gente ensina as empresas como ganhar produtividade com esse redesenho do trabalho. O modelo é flexível com o horário, mas precisa seguir o padrão de 100 – 80 – 100: 100% de pagamento de salário, trabalhando 80% do tempo e mantendo 100% da produtividade,” afirma Rivetti.
O teste piloto tanto no Brasil quanto nos outros países conta com três fases:
A pesquisa da Boston College irá avaliar antes, durante e após o teste piloto como os funcionários estão se sentindo, sua performance do trabalho e como estão conciliando o trabalho com a vida pessoal com 4 dias de expediente.
Para avaliar os resultados, a universidade americana irá analisar a empresa e os funcionários em 5 blocos:
Esse dia de folga a mais está sendo classificado como um benefício, diz Rivetti: “A CLT fala que a gente não pode trabalhar mais, mas que podemos trabalhar menos.”
Para as empresas que realizarem o teste piloto, haverá uma assessoria jurídica para que as empresas possam ter o apoio para acordos individuais com os funcionários participantes. “A Reconnect também está conversando com os sindicatos para realizar acordos coletivos. E os sindicatos estão bem interessados”, diz a empresária.
Um case interessante acontece em Portugal. De acordo com Rivetti, quem está apoiando a 4 Week Day Global, não é uma empresa privada como a Reconnect, mas sim o governo, por meio do Ministério do Trabalho:
“A mudança lá tende a ser mais sistêmica, aqui a gente talvez precise mostrar os resultados, começar a ganhar apoio dos sindicatos, para depois levar ao governo também.”
Todas as empresas do Brasil, de todos os tamanhos poderão apostar no teste piloto de 4 dias de trabalho, mas a fundadora da Reconnect viu que nos pilotos globais o trabalho intelectual se destaca com este benefício:
“Todas as empresas podem participar do teste piloto de 4 dias, mas vimos que existe uma tendência maior para o trabalho intelectual, porque é mais fácil realizar as mudanças que propomos, como revisar a quantidade de reunião e são funções que utilizam processos tecnológicos”.
Talvez, para algumas áreas, seja necessária uma adaptação do formato, afirma Rivetti:
“Ao invés de tirar todos na sexta, a empresa pode adotar uma escala onde uma parte dos funcionários folga na sexta, outra na segunda e outra na quarta. Assim a empresa funciona todos os dias, mas o funcionário conta com um dia a mais de descanso.”
Em hospitais e fábricas que a escala costuma ser mais variável, a estratégia será outra, afirma Rivetti:
“No caso dos hospitais, que contam com uma escala de 24x72, provavelmente terão que contratar mais pessoas, mas vale ressaltar que nos casos globais essas empresas perceberam alguns ganhos, como menos gente faltando e pessoas mais engajadas e com mais saúde. Dependendo, esse custo com novos funcionários pode ter um ganho que compensa.”
Embora a iniciativa seja inédita no Brasil, ela já acontece em outros países, como EUA e Reino Unido:
Recentemente saiu o resultado da pesquisa do movimento 4 Day Week Global nos Estados Unidos, referente ao desempenho de 41 empresas americanas que apostaram durante 12 meses no regime de trabalho de 4 dias. A pesquisa mostrou os resultados em três partes:
Negócio:
Saúde:
Família:
Recentemente, o Reino Unido divulgou o resultado do piloto realizado lá, afirma Rivetti, que revelou que:
“Depois de um ano de estudo, os dados mais recentes mostram que nenhuma empresa que testou a semana de 4 dias quer voltar para 5 dias. Para mim, esse é o maior indicador de sucesso. Mas há outros fatores como redução de burnout, de absenteísmo, redução de turnouver e aumento da receita que, certamente, asseguram esse novo modelo de trabalho.”
Nos pilotos globais, os setores que mais possuem interesse para o regime de 4 dias de trabalho, segundo Rivetti, são trabalhos intelectuais que envolver as áreas:
“No Brasil, saberemos as áreas que mais tendem a seguir com os 4 dias de trabalho apenas no fim de agosto, onde iremos anunciar as empresas que participarão do teste piloto.”
Além dos ganhos citados e avaliados em outros países, as empresas poderão contar com treinamentos de qualidade, de acordo com a Rivetti:
“A empresa no mínimo terá uma grande aula de produtividade. Estamos há 100 anos atuando com 5 dias de trabalho. O mundo mudou em vários aspectos, o trabalho ficou menos operacional e mais intelectual. Hoje acreditamos que a inteligência artificial pode ser uma peça-chave para essa mudança, de focarmos menos no operacional e mais no estratégico e criativo. A empresa que tiver essa metodologia, certamente terá uma nova forma de trabalhar mais eficaz, produtiva e saudável.”
Essa mudança de modelo de trabalho traz um pouco de insegurança por ser algo novo, mas a fundadora da Reconnect Happiness at Work afirma que quem apostar primeiro terá um grande diferencial:
“É normal ficar com medo do novo, mas as empresas que não entrarem, certamente ficarão para trás. Ser protagonista dessa mudança dá poder e pode trazer esses ganhos tão necessários hoje no mercado de trabalho.”
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