Liderança: José Augusto Figueiredo, presidente no Brasil da Consultoria LHH, ressalta que as demissões dos executivos no momento da troca do presidente do Itaú eram esperadas (John Lamb/Getty Images)
Victor Sena
Publicado em 6 de novembro de 2020 às 16h06.
Última atualização em 12 de novembro de 2020 às 18h29.
A mudança na presidência do Itaú Unibanco e o pedido de demissão dos líderes do segmento de varejo e atacado nesta semana levantaram uma questão sobre as linhas de sucessão em grandes empresas: como elas devem lidar com a frustração de um executivo que esperava avançar de posição, mas foi preterido?
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Os presidentes do banco de atacado, Caio Ibrahim, e de varejo, Márcio Schettini, pediram demissão do Itaú Unibanco nesta quinta-feira após a escolha de Milton Maluhy Filho para o comando geral da maior instituição financeira privada do Brasil. De acordo com texto publicado nesta quinta-feira, 5, pelo Exame IN, ambos eram cotados para a posição do atual presidente do Itaú, Cândido Bracher.
A cultura organizacional do banco segue a de outras grandes empresas no Brasil e no exterior, como a multinacional GE. É praxe nessas grandes empresas haver uma lista de executivos cotados para assumir o cargo de liderança máxima do negócio e essas informações serem repassadas pela alta gerência com anos de antecedência.
Quando há uma sucessão de fato, os preteridos costumam sair do negócio justamente para dar espaço para o escolhido moldar o negócio ao seu estilo.
Em um vídeo enviado as colaboradores, que EXAME teve acesso, o atual presidente Cândido Bracher afirma estar contente com a escolha de Milton Maluhy Filho, destacando sua trajetório na empresa. Bracher também disse que quatro nomes "excelentes" estavam à altura do cargo.
O Itaú Unibanco preferiu não comentar a saída dos presidentes.
Na avaliação de especialistas ouvidos por EXAME, ter esse planejamento de longo prazo minimiza o risco de percalços na sucessão.
Além disso, é fundamental ter transparência na comunicação. Conhecer bem as pessoas, e o que elas desejam, é uma das orientações para que as empresas ofereçam uma sucessão que vá além de um novo cargo. O plano de crescimento dos funcionários deve oferecer outras coisas.
“Se o colaborador tem como objetivo só a posição, seja pelo poder, pelo status ou qualquer outra referência, quando a pessoa perde a disputa, está fora. Por isso, no plano, é importante que as empresas ampliem horizontes, aliando criatividade às necessidades internas”, explica Ricardo Basaglia, diretor geral da Page Executive, unidade de negócio do PageGroup especializada em recrutamento e seleção de executivos para alta direção.
Para isso, Basaglia defende que, primeiro, é necessário saber o que o negócio precisa e onde estão as oportunidades. O segundo é conhecer bem as pessoas. A partir daí, a empresa deve desenhar o que cada um pode ser feliz fazendo, até para ajudar a desconstruir a competição por um cargo visado e a disputa por determinadas posições.
Além de entender como oferecer o que a pessoa almeja, e opções além de cargos, é importante agir com atencipação.
“Esta é uma conversa que não pode acontecer aos 48 do segundo tempo. É um processo de confiança e de construção que deve ocorrer para que a empresa saiba planejar e entender o tamanho do risco que está tomando, para verificar as alternativas disponíveis”, aconselha o diretor da Page Executive, Ricardo Basaglia.
Se há frustração na equipe, é porque houve surpresas. Essa á ideia de João Marcio Souza, CEO da Talenses Executive, empresa especializada em recrutamento de líderes.
"A situação de frustração não é a ideal, não deveria acontecer. Porque só há frustrução se há surpresa. Então eu acho que a empresa deveria investir muito em comunicação diretamente ligada aos candidatos daquela sucessão, com transparência, deixando muito claro quais serão os critérios".
Para Ricardo Chamon, advogado especialista em sucessão nas empresas e sócio sócio-fundador do Chamon Santana Advogado, o planejamento é importante para evitar essas situações, assim como arranhões na imagem da companhia, para o público externo e para o interno.
“Se houve frustração a ponto de causar preocupação em relação à continuidade desse líder no dia a dia da empresa, isso pode significar que o processo foi mal conduzido, basicamente porque deveria haver desde o início do processo sucessório um plano de contingência para a substituição desse executivo.”
Apesar de a falta de planejamento na sucessão ser um dos pontos que geram problemas de sucessão, a inevitável escolha de um candidato pode afastar os outros da empresa, principalmente quando se trata de executivos com alto poder aquisitivo, que podem abrir mão do trabalho.
José Augusto Figueiredo, presidente no Brasil da Consultoria LHH, ressalta que as demissões dos executivos no momento da troca do presidente do Itaú eram esperadas.
“Quando fala do alto escalão, que tem poder monetário alto, você perde tudo mesmo. Aquele profissional não precisa se conectar com uma nova liderança. Ele pode sair e cuidar da vida dele”, destaca.
Para ele, também existe um fato emocional forte na troca de presidência, como aconteceu no caso do Itaú.
“A questão pode mexer com a vaidade e o orgulho, assim como desperta o medo de mudança.”
Para quem fica no banco, o especialista aconselha encarar a mudança como oportunidade. A mudança de uma cadeira se tornou uma dança com duas posições livres. E isso pode se desdobrar em mais chances de crescimento na cadeia interna.
“É preciso ter coragem agora e encarar o processo de mudança como uma transição com mais oportunidades para crescer, se modernizar e aprender. A organização toda fica com medo agora, mas não é o momento disso”, fala.
Para evitar crise, os especialistas concordam que o planejamento sucessório é a chave. Mas ele não deve ser "sagrado", nem rígido. As expectativas de todos têm que estar bem definidas. A falta de planejamento acaba por causar insegurança, improvisação e falta de critério.
"O planejamento sucessório deve ser sagrado apenas em relação a questões filosóficas e principiológicas. No mais, colocada de lado simplesmente não, por questão até de respeito aos envolvidos, mas deve haver sim espaço para ajustes e aperfeiçoamento ao longo do tempo, desde que sejam discutidos e justificados com transparência", defende Ricardo Chamon.
Apesar desse planejamento, Ricardo Basaglia ressalta que a empresa nem sempre vai conseguir administrar uma situação do tipo, mas é importante estar perto da condução da carreira desses líderes e também reforça que a estrutura de sucessão não deve ser tão rígida.
“A empresa tem que ter o mínimo de um planejamento sucessório, um mapa das liderenças atuais, de todo o alto escalão, e dos potenciais sucessores daquela cadeira. Isso não quer dizer que é algo que deve ser seguido ou que seja uma obrigação da empresa a criar uma exectativa nesse sentido. Porque tudo é muito dinâmico."