A nova política da Deloitte nos Estados Unidos faz parte de um esforço mais amplo para consolidar o retorno ao escritório, uma tendência que tem sido acompanhada de perto por líderes corporativos (DANIEL LEAL-OLIVAS/AFP/Getty Images)
Repórter
Publicado em 7 de março de 2025 às 17h35.
A Deloitte é a mais recente gigante do setor financeiro nos Estados Unidos a endurecer sua política de trabalho presencial, vinculando o pagamento de bônus anuais à frequência no escritório. A mudança, noticiada pelo jornal britânico Daily Mail, reforça a tendência de grandes empresas que estão reduzindo a flexibilidade introduzida durante a pandemia.
De acordo com um e-mail enviado aos funcionários da divisão de impostos da empresa, obtido pelo Financial Times, o tempo presencial será considerado um critério nas avaliações de desempenho, influenciando diretamente na elegibilidade para bônus. Os funcionários deverão comparecer ao escritório pelo menos 50% da semana de trabalho.
A mensagem interna, assinada por Katie Zinn, diretora de talentos da área tributária, destacou que a equipe deve garantir “colaboração presencial de 2 a 3 dias (50%) semanalmente”. Ainda segundo fontes da empresa apuradas pelo Daily Mail, os funcionários da Deloitte nos EUA utilizam uma combinação de crachás de acesso e planilhas de ponto para registrar sua presença, além de a empresa ter meios para monitorar o local de login nos computadores.
A decisão da Deloitte segue uma tendência crescente entre instituições financeiras de grande porte que estão pressionando por um retorno mais robusto ao escritório. Em fevereiro, Jamie Dimon, CEO do JPMorgan, fez um discurso contra o trabalho remoto e reforçou a exigência de que seus funcionários compareçam presencialmente cinco dias por semana.
Outro exemplo recente é o do Wells Fargo, que no ano passado demitiu funcionários após descobrir que estavam utilizando dispositivos conhecidos como “mouse jigglers” – aparelhos que simulam movimento no computador para enganar sistemas de monitoramento de produtividade. Esse tipo de prática se tornou mais comum com o avanço do home office.
A nova política da Deloitte nos Estados Unidos faz parte de um esforço mais amplo para consolidar o retorno ao escritório, uma tendência que tem sido acompanhada de perto por líderes corporativos. Em comunicado ao Financial Times, a empresa afirmou que seu modelo híbrido “não é único” e que a decisão busca equilibrar a colaboração presencial com as necessidades dos clientes e o bem-estar dos profissionais.
A movimentação da consultoria canadense reforça um cenário no qual grandes empresas financeiras endurecem suas regras em relação ao home office, afastando-se cada vez mais da flexibilidade adotada nos últimos anos. Como reportado pelo Daily Mail, a expectativa é que outras companhias sigam o mesmo caminho, intensificando a pressão pelo retorno ao ambiente corporativo.
O pesquisador internacional Joaquim Santini avalia que a decisão reflete um movimento estratégico das empresas na tentativa de retomar o controle sobre a produtividade e a cultura organizacional. “Os bônus sempre foram utilizados como ferramenta para incentivar comportamentos desejáveis dentro das corporações. Agora, com a crescente resistência ao home office, as empresas estão usando esse mecanismo para reforçar a presença física, argumentando que a colaboração e a inovação dependem da convivência no escritório”, diz Santini.
Algumas empresas têm adotado estratégias mais incisivas para incentivar o retorno dos funcionários aos escritórios. Segundo pesquisa recente da KPMG, 87% dos entrevistados estariam dispostos a recompensar funcionários que demonstrassem disposição em retornar ao escritório.
O pesquisador Santini lembra de alguns casos. O Lloyds Banking Group mantém um modelo híbrido, mas levará em consideração a frequência presencial dos executivos seniores ao calcular seus bônus. O escritório de advocacia americano Davis Polk informou diretamente aos funcionários que menos dias presenciais resultariam em bônus menores. No Reino Unido, a PwC passou a monitorar mensalmente a frequência física dos colaboradores, enviando esses dados aos orientadores responsáveis pelas avaliações.
Nos Estados Unidos, a Davis Polk não está sozinha: a Amazon determinou explicitamente o retorno presencial obrigatório neste ano, com o CEO Andy Jassy afirmando claramente que funcionários insatisfeitos com essa política devem considerar outras oportunidades profissionais. Da mesma forma, a Dell estabeleceu que funcionários com menor presença física poderão enfrentar consequências em suas avaliações, influenciando diretamente os bônus.
Procurada, a Deloitte no Brasil não quis se posicionar sobre o assunto, mas segundo fontes internas, a companhia não irá vincular a presença no escritório com o valor do bônus.