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Da Redação
Publicado em 7 de junho de 2013 às 14h48.
São Paulo - Em 2007, a advogada curitibana Patrícia Palma, de 34 anos, deixou sua cidade natal e mudou-se para São Paulo com a meta de impulsionar sua carreira no setor de telecomunicações. Trocou um posto na Claro pelo cargo de coordenadora de vendas na fabricante de celulares Sony Ericsson, com o dobro do salário.
Na época, Patrícia considerava que as melhores vagas do mercado estavam concentradas na capital paulista. “Sempre quis trabalhar em São Paulo, porque era onde as coisas aconteciam e onde poderia ganhar mais experiência e acesso a novas práticas e tecnologias”, diz.
No final do ano passado, Patrícia decidiu redirecionar sua carreira e deixar o mundo da telefonia. A decisão fez com que voltasse a considerar morar em Curitiba. Após alguns contatos com amigos paranaenses, surgiu um convite para trabalhar na Aymará, uma editora voltada ao ramo educacional, na capital do Paraná, com a proposta de montar do zero a área comercial da empresa.
O convite era vantajoso: moraria perto da família e atenderia aos novos objetivos profissionais. Com um fator decisivo: Patrícia teria uma remuneração 10% maior numa cidade com um custo até 40% menor que São Paulo. “São Paulo ainda é uma vitrine, mas hoje há muitas oportunidades legais de carreira em outros lugares”, diz.
Como Patrícia, muitos profissionais que deixaram sua cidade rumo aos grandes centros, onde estavam as oportunidades de carreira, estão recebendo nos últimos meses propostas para retornar a seus locais de origem.
Esse movimento está sendo possível agora por causa de uma nova fase de desenvolvimento econômico no Brasil, que está menos concentrada nas capitais do Sudeste e mais distribuída por todo o território nacional. Esse fenômeno tem gerado novos consumidores, principalmente nas classes C e D.
Para atender a esses novos mercados, as companhias reforçaram suas estruturas regionais com mais profissionais. Ao mesmo tempo, empresas locais prosperam e abrem novos postos de trabalho.
“Esse movimento vem acontecendo há uns três anos, mas se intensificou agora, com o aumento da procura por profissionais para atuar fora de São Paulo”, diz Carlos Eduardo Ribeiro Dias, sócio-gerente da consultoria Asap, de São Paulo, que recruta principalmente gerentes em início de carreira.
O cenário é ideal para quem deseja retomar a carreira na cidade natal: há bons salários, desafios interessantes, proximidade dos amigos e familiares e, para muitos, a perspectiva de fugir do trânsito, da violência e reencontrar uma qualidade de vida que São Paulo e Rio de Janeiro já não podem oferecer.
É hora de voltar?
Sair de um grande centro, há alguns anos, significava perder em exposição. Para algumas áreas isso ainda é verdade e, por isso, fazer o movimento de volta requer planejamento e uma boa avaliação do cenário. Tome-se como exemplo o caso do setor financeiro. “Esse mercado ainda é muito concentrado em São Paulo e as oportunidades oferecem salários e crescimento mais restritos”, diz Carlos.
Já para setores como bens de consumo, algumas indústrias, varejo e construção civil, o cenário é outro. Pelo levantamento anual da VOCÊ S/A, publicado na edição de março, os quatro setores juntos abrirão 58 689 vagas este ano.
O mercado aquecido foi um dos motivos que levou o engenheiro civil pernambucano Rogério Carlos Barros de Andrade, de 32 anos, a voltar para Recife, em Pernambuco, no final de 2009, depois de quatro anos em São Paulo.
Pela falta de perspectivas na profissão, Rogério não fez carreira na engenharia, assim como grande parcela dos engenheiros formados no Brasil — segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a cada sete engenheiros apenas dois atuam em áreas afins. O executivo trabalhou na área comercial da AmBev, em Recife, de 2001 a 2006, quando foi transferido para São Paulo.
“Trabalhar em São Paulo dá maior exposição profissional”, lembra. “Para chegar onde eu queria, mudar para São Paulo era um passo obrigatório”, completa. Rogério tinha planos de voltar um dia para Recife, mas não imaginava quando nem como.
No fim do ano passado, como gerente de trade marketing da Danone, recebeu o convite para ser gerente regional da Construtora BS no Nordeste, que estava montando uma base na capital pernambucana.
Propenso a aceitar, ele quis conhecer melhor o projeto da empresa e buscou muita informação sobre o setor com seus contatos em São Paulo e no Nordeste. As respostas eram quase unânimes: este é o momento certo de arriscar, porque o mercado está superaquecido. “Estou satisfeito com minha escolha profissional e também por estar de volta”, diz Rogério, que ficou espantado ao reencontrar uma cidade diferente. “Os restaurantes estão mais cheios, há outro padrão de carro nas ruas e até a oferta de imóveis está menor do que a demanda”, completa.
Prós e contras
A atitude que Rogério tomou ao buscar informações sobre o mercado local, as alternativas de trabalho por lá e até mesmo mapear as possibilidades para os próximos passos na carreira no longo prazo é algo fundamental antes de fazer as malas.
“É preciso ter esse cuidado, para evitar que a escolha seja uma armadilha na carreira”, diz Marcos Vono, diretor de recursos humanos e carreira do grupo Ibmec. Medir o quanto seus hábitos estão alinhados à cultura local também é importante para o sucesso da escolha.
“Até quem está retornando à sua região deve se preocupar com essa avaliação, porque seus próprios hábitos podem ter mudado depois de vivenciar outras culturas”, completa Marcos.
Com a demanda crescente, a chance de receber uma proposta para trabalhar fora dos grandes centros é maior. Em geral, as ofertas são tentadoras, porque algumas companhias estão com dificuldade de selecionar profissionais capacitados — com isso aumentam o pacote de benefícios.
Não se deixar seduzir apenas pela remuneração é outro desafio que merece a atenção dos profissionais. “É preciso analisar com cuidado também o custo de vida local, como escola dos filhos, alimentação e moradia”, diz Marcos.
Oportunidades para todos
Quem tem a experiência de trabalhar nos grandes centros conta a seu favor, de acordo com os recrutadores, com a familiaridade, com o dinamismo do mercado e do trabalho e com o acesso a práticas de gestão diferentes.
Esse destaque profissional vale também para profissionais nascidos em grandes centros, que passaram a considerar outras cidades como alternativas de carreira, competindo com os chamados profissionais repatriados.
O administrador paulista Paulo Sérgio Greco, de 34 anos, aproveitou essa boa fase do mercado e mudou-se no começo de fevereiro para Recife com a mulher e as duas filhas. Sair de São Paulo não era algo planejado, muito menos para Recife, que Paulo Sérgio considerava longe.
O que tornou irrecusável a proposta de assumir a gerência-geral de marketing e produtos da Ebba — dona das marcas de suco Maguary e Dafruta — foi o desafio proposto e o time da empresa. “Me surpreendi com o alto nível dos profissionais que encontrei aqui”, diz. Nos últimos nove meses a Ebba trouxe 15 executivos de diversos locais e setores.
Para ajudar na decisão, Paulo visitou a cidade com a esposa, conheceu a sede da companhia e conversou com diversos profissionais por lá. “Ir até a empresa é essencial antes de tomar qualquer decisão, para ter a real dimensão da oportunidade”, diz.
Um dos seus maiores receios era perder visibilidade, mas hoje Paulo não tem dúvida de que tomou a decisão certa. “Perdi o preconceito sobre o mercado de trabalho, os profissionais e as possibilidades existentes fora de São Paulo”, diz. “Ter realizações bacanas para contar é o que me motiva e, por isso, quero passar um bom tempo aqui”, diz Paulo Sérgio.