Concurso público: possível fim da estabilidade para servidor público pode afetar seleções? (Julio Aguiar/Creative Commons)
Claudia Gasparini
Publicado em 5 de outubro de 2017 às 15h00.
Última atualização em 5 de outubro de 2017 às 15h08.
São Paulo — A CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) acaba de aprovar novas regras para a demissão de servidores por “insuficiência de desempenho”. Com isso, a tradicional estabilidade dos funcionários públicos brasileiros pode estar se aproximando do fim.
De acordo com a proposta, a performance do funcionário deverá ser apurada anualmente por uma comissão avaliadora, com base em critérios como produtividade e qualidade do serviço.
A aprovação pela CCJ é só o primeiro passo de um longo processo, mas já constitui um forte indício de que a mudança tem chances de se viabilizar, analisa Marco Antônio Araújo Júnior, presidente da Anpac (Associação Nacional de Proteção e Apoio aos Concursos) e diretor do Damásio.
“A CCJ tem o papel de avaliar se o projeto tem sustentabilidade do ponto de vista constitucional, e deu uma resposta positiva nesse sentido”, explica ele. “É um sinal verde para que o tema continue sendo debatido e eventualmente seja aprovado”.
A matéria ainda será analisada por outras três comissões, a começar pela CAS (Comissão de Assuntos Sociais). Só então segue para votação nas casas legislativas. Se passar, a regra passará a valer para a carreira de quem trabalha em instituições federais, estaduais e municipais.
Para Araújo, a mudança será benigna para o serviço público e para a sociedade de forma geral. “É preciso introduzir a meritocracia não só para ingressar na carreira estatal, mas também para permanecer nela”, afirma.
Segundo o diretor do Damásio, a estabilidade dos funcionários públicos nunca foi absoluta. Ele lembra que, para cargos de magistratura em níveis estaduais e federais, já existe uma avaliação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em quesitos como produtividade e desempenho.
Além disso, já era possível demitir um servidor por ato ilegal ou imoral, com garantia de ampla defesa, por meio de um processo administrativo. Dentro das novas regras aprovadas pela CCJ, segue garantido o direito ao contraditório e à ampla defesa.
Pelo texto, o servidor será avaliado e receberá um dos seguintes conceitos: superação (S), igual ou superior a 8 pontos; atendimento (A), igual ou superior a 5 e inferior a 8 pontos; atendimento parcial (P), igual ou superior a 3 pontos e inferior a 5 pontos; não atendimento (N), inferior a 3 pontos.
A possibilidade de demissão surgirá caso ele obtenha conceito N (não atendimento) nas duas últimas avaliações ou não alcançar o conceito P (atendimento parcial) na média tirada nas cinco últimas avaliações. Quem discordar da avaliação pode pedir reconsideração ao setor de recurso humanos.
No projeto de lei original (PLS 116/2017 - Complementar), da senadora Maria do Carmo Alves (DEM-SE), a responsabilidade pela avaliação de desempenho seria do chefe imediato de cada servidor.
Para evitar que a decisão fosse influenciada “por simpatias ou antipatias no ambiente de trabalho”, o substitutivo apresentado pelo relator, o senador Lasier Martins (PSD-RS), prevê que a avaliação seja feita por uma comissão.
“É só após uma série de avaliações reiteradas que o funcionário pode ser desligado, e só a partir de critérios objetivos analisados por uma banca”, afirma Araújo. “Quem é bom profissional não vai perder nada com isso”.
A carreira pública, na visão do presidente da Anpac, se tornará mais justa — e mais atrativa. “Com essa mudança, os servidores que tiverem um bom desempenho terão mais chance de crescer na carreira e receber bonificações e incentivos por mérito, como acontece na iniciativa privada”, diz.
Embora a estabilidade seja a principal motivação de muita gente para prestar concursos públicos, a quantidade de candidatos a cargos estatais não deve diminuir com a possível aprovação das novas regras, na visão de Araújo.
“A estabilidade não é o único fator para procurar uma carreira pública”, afirma ele. “A atratividade exercida pelos bons salários e a vocação para o serviço público ainda manterão a busca aquecida”.
Para o especialista, a procura por concursos deve continuar estável, mas o perfil do candidato pode mudar. “Aquela minoria que só quer estabilidade garantida será substituída por quem busca uma carreira mais meritocrática e dinâmica”, resume ele.