Candidatos: quem contratar primeiro? (AndreyPopov/Thinkstock)
Luísa Granato
Publicado em 13 de setembro de 2018 às 06h00.
Última atualização em 13 de setembro de 2018 às 06h00.
São Paulo - Quem é a melhor pessoa para contratar primeiro? Quando o engenheiro Mark Roberge recebeu o desafio para formar a equipe de vendas da Hubspot, uma das principais empresas de inbound marketing do mundo, ele percebeu que essa era uma questão complicada de responder.
Sua primeira solução se revelou um fracasso. Ele apostava no sucesso ao contratar o melhor talento do mercado, o melhor vendedor de uma empresa grande. Após convencer a pessoa a trabalhar na Hubspot, ele ficou espantado ao perceber que ela não se destaca entre os poucos 20 funcionários da empresa.
“Eu estava realmente animado por aquele momento, por que essa pessoa tinha a melhor performance dentro de uma equipe de 800 e queria saber o que poderia nos ensinar. E fiquei espantado quando nos seis meses seguintes esse indivíduo não era o melhor vendedor na nossa pequena empresa”, conta ele em entrevista para EXAME.
Do estresse seguinte, ele recorreu à sua formação como engenheiro e no MIT para tentar quantificar a eficiência do seu recrutamento, buscando um método entre dados e processos científicos.
Com a metodologia resultante, contratando sempre o perfil que garantia ser bem-sucedido com suas métricas e critérios, ele montou uma estratégia que fez a equipe saltar para 500 funcionários e as vendas da empresa chegarem até 100 milhões de dólares.
“Eu olhei para a máquina de recrutamento pela perspectiva de um engenheiro. Eu queria uma máquina que fosse muito previsível e escalável, então resumi isso a contratar o mesmo perfil bem-sucedido toda vez”, explica ele.
E ele conta tudo o que aprendeu em seu livro best-seller “The Sales Acceleration Formula”. E também aqui no Brasil: Roberge participa hoje da terceira edição do Kenoby Talks, evento de recrutamento e seleção com nomes nacionais e internacionais da área.
Marcel Lotufo, organizador do evento e CEO da Kenoby, fala que se inspira no trabalho de Roberge para a área de vendas e recrutamento da empresa. Com o evento e trazendo o autor para uma palestra no Brasil, ele espera trazer conteúdos relevantes e soluções inovadoras sobre recursos humanos para o mercado brasileiro.
“Recrutamento é muito difícil, cometi erros que ele cometeu, contratei pessoas vendo apenas a faculdade e acabou não dando certo com os primeiros vendedores. Apenas não era o perfil certo”, fala Lotufo.
Em entrevista para EXAME, Mark Roberge fala mais sobre seu livro, sua experiência na Hubspot e as dificuldades de encontrar o perfil certo no recrutamento. Confira:
EXAME: Como foi o seu trabalho na Hubspot que o levou a escrever o livro?
Roberge: Minha jornada na Hubspot foi afortunada. Eu era empreendedor e tinha meu negócio na época, com uma fundação orientada para dados. Era engenheiro, comecei a carreira como programador e completei minha educação no MIT, o que me deu uma base com dados e ciência que orienta minha visão do mundo. Quando conheci dois empreendedores ótimos no MIT que estavam formando a Hubspot, comecei a ajudar na área de vendas, apesar de nunca ter feito nada na área antes.
Quando a ideia da empresa começou a deslanchar, eles me pediram para me dedicar em tempo integral à companhia e construir a área de vendas.
Foi uma jornada incomum no ramo, mas foram ótimos dez anos em que construí um time de cerca de 500 funcionários em três continentes.
O que considero sorte da minha parte, dado meu perfil, foi poder me apoiar em dados para criar esse time. Eu vi as mudanças acontecendo e os fundadores da empresa eram favoráveis a minha visão. Então pude aplicar essa perspectiva pensando em como aplicar de forma moderna o rigor científico para contratar e treinar pessoas.
Meu livro conta como aplicar minhas descobertas no recrutamento. Eu olhei para a máquina de recrutamento pela perspectiva de um engenheiro. Eu queria uma máquina que fosse muito previsível e escalável, então resumi isso a contratar o mesmo perfil bem-sucedido toda vez, treinando de forma precisa, expondo os funcionários a metas de qualidade todo mês e tornando-os responsáveis por resultados consistentes.
EXAME: Que perfil é necessário para um time de vendas?
Roberge: Acho que a lição mais importante é que é muito difícil consertar uma contratação quando você comete um erro, entende? Desfazer um monte de contratações ruins e refazê-las pode ser a morte para um negócio. Eu estudei de perto o problema e tive meu momento de clareza: no meu primeiro ano na Hubspot, quando já estava na minha oitava contratação, tive sucesso em convencer o melhor vendedor de uma grande empresa a abandonar seu emprego e se juntar a nossa companhia, mesmo pequena e com menos de 20 pessoas.
Eu estava realmente animado por aquele momento, por que essa pessoa tinha a melhor performance dentro de uma equipe de 800 e queria saber o que poderia nos ensinar. E fiquei espantado quando nos seis meses seguintes esse indivíduo não era o melhor vendedor na nossa pequena empresa.
Percebi que o contexto do negócio e das vendas de onde ele viera era diferente demais do nosso contexto, em termos do estágio do negócio, da marca, do produto e da maturidade da categoria.
Percebi que não existe forma universal de responder essa pergunta. Quem é o melhor vendedor depende do contexto. Dito isso, não desisti da ciência do processo, mas dei um passo atrás para definir os critérios que julgava mais importantes. Queria um bom processo para entrevistar os candidatos e queria que os critérios fossem transparentes.
Eu estabeleci um modelo para pontuar os candidatos. Com cinco ou seis contratações, me interessei em como essas pessoas iam amadurecer no nosso negócio, atento a quem iria bem ou não.
Muitos não têm esse rigor no recrutamento, sendo mais passivos, como “eu conheço uma boa pessoa quando a vejo”. Eu acho que é uma oportunidade perdida para encontrar uma relação estatística entre as pontuações dos contratados e como fica sua performance com o tempo.
Para responder a pergunta, dado o contexto da Hubspot, os traços para o sucesso do vendedor eram curiosidade, coachability, ética de trabalho, sucesso e inteligência. Mas, novamente, esses são critérios para uma companhia específica em um estágio específico de desenvolvimento. E as pessoas deveriam focar em aprender sobre o processo e aprimorar sua própria fórmula de contratação.
EXAME: Para quem tem problemas para encontrar e reter talentos, qual o seu conselho?
Roberge: Pelo lado de recrutamento, acho que o maior desafio é que os maiores talentos raramente tem que organizar seus currículos e procurar por um emprego. Muitos são chamados por seus chefes antigos que foram para outras empresas. Eles sempre têm muitas opções. O melhor conselho que já recebi sobre isso veio de um antigo mentor: “não contrate uma agência ou um serviço de recrutamento corporativo, crie uma agência dentro da sua empresa”. Acho que se aplica para o Brasil, certamente se aplica para os Estados Unidos e para a Europa, as agência são boas em buscar e entrar em contato com talentos que não necessariamente estão procurando por um emprego. O problema é que você não é seu único cliente. Quando eles encontram um bom candidato, você compete com o resto desses clientes.
Do outro lado, o típico recrutador de serviço corporativo, e eu odeio generalizar aqui, não é tão proativo para alcançar os candidatos. Você pode postar uma vaga, mas isso não encontrará esses candidatos passivos.
Na empresa, eu encontrei uma mulher que estava saindo de uma agência e tinha interesse em começar seu próprio negócio, então ofereci que começasse a agência dentro da Hubspot. E você precisa estar disposto a pagar a essas pessoas mais do que o típico recrutador, oferecendo comissões se eles entregam o que você pediu.
E então temos o problema de retenção de talento. Existe uma guerra por talentos hoje nos EUA. Algumas empresas precisam aceitar que são apenas parte de uma jornada de carreira. O objetivo não é necessariamente reter o talento para sempre e nem todos tem um negócio amplo o bastante para oferecer uma carreira. Você pode aceitar isso e tornar parte da sua marca. Se uma pessoa sai da empresa para uma maior e a encontra mais sucesso, não é algo ruim.
É diferente se a evasão é mais rápida, como seis meses. Isso é insustentável. No momento que você adaptou os funcionários, eles estão prontos para sair. Você tem que repensar o que você busca, em muito casos você está contratando pessoas com experiência demais para sua vaga. Você deveria repensar e procurar por pessoas menos especializadas, mas com capacidade de aprender e com coachability. Com o tempo, eles serão mais gratos pelo crescimento que você ofertou e você terá mais chance de retê-los por mais anos pela progressão de carreira.
EXAME: Que outros aspectos fazem um time ser bem-sucedido?
Roberge: Tanto coaching, quanto onboarding são peças muito importante para administrar os talentos. Se tivesse que escolher onde fazer um trabalho incrível e onde ser medíocre, ainda escolheria investir no recrutamento. Mas se pudesse, faria os três bem.
No lado do onboarding, o que encontro com frequência em vendas é o pensamento de “usar a vila para criar o contratado”. Não é muito estruturado e é mais acompanhar outros funcionários. As pessoas possuem pontos fortes diferentes para conseguir uma venda, com esse modelo você arrisca que os novos funcionários interpretem mal quais são os melhores hábitos e acabem absorvendo os maus.
Gosto de detalhar com os melhores exemplos para expor ao time. E quantificar como acontecem.
Na parte de gerenciamento e coaching, eu nunca vi uma pessoa absorver tudo de um treinamento. Você tem que continuar o trabalho depois, fazendo um diagnóstico individual e pensando na forma particular que pessoa melhor aprende. Gerentes deveriam investir muito tempo em coaching. Os dados mostrarão como uma pessoa está se saindo, o que funciona para ela e como ela pode melhorar.
EXAME: Qual a importância de um bom time de vendas dentro de uma startup?
Roberge: Depende do estágio que você está, mas na maioria dos casos é a coisa mais importante. O único momento que não é será no início, quando você ainda está desenvolvendo o produto. Aqui a equipe tende a ser orientada para a tecnologia. Uma vez que o produto está estabelecido, a empresa precisa entender que a primeira contratação em vendas será muito diferente de décima. É um perfil diferente que vai começar o time, que vai precisar descobrir o mercado, qual seu cliente e como vender para ele. Essa pessoa será menos agressiva e mais inovadora e curiosa. Eles vão perguntar qual a visão da empresa e que solução vão vender para solucionar o problema do cliente.