"Uma imagem para a situação é o garboso cavaleiro que, ao tentar subir no cavalo, pega mais embalo que o necessário e cai do outro lado. Quer-se aplicar a norma culta, mas falta a destreza necessária" (Gettu Images)
Da Redação
Publicado em 13 de setembro de 2012 às 17h48.
Por reconhecer os preconceitos que a língua cria, não sou fiscal do idioma nem polícia montada da gramática. Isso não significa que meus ouvidos ficarão surdos aos sons que por eles passam.
O termo hipercorreção designa um erro em que o usuário, imaginando usar corretamente o idioma, desvia-se das regras. Dá-se também o nome de hiperurbanismo a esse fenômeno, pois configura a clara intenção de imitar o uso alheio em busca de prestígio, fato comum nas várias inter-relações que a vida urbana é rica em criar.
Pensa-se usar o fino do idioma e, na realidade, incorre-se em erro. Uma imagem para a situação é o garboso cavaleiro que, ao tentar subir no cavalo, pega mais embalo que o necessário e cai do outro lado. Quer-se aplicar a norma culta, mas falta a destreza necessária. Há boa intenção, mas isso não basta.
É comum, na fala do brasileiro, a marca de plural em apenas um elemento, como em “Só veio os menino”. Mas, em situação formal, ele tentará aplicar as regras gramaticais, em que predomina concordância global: “Só vieram os meninos”.
Por isso, imagine-se em uma entrevista de emprego, quando indagado sobre há quanto tempo você parou de estudar. Frases como “Parei de estudar fazem dois anos” podem influir na seleção e, o que é pior, podem levar o entrevistador a pensar que era cedo para você parar de estudar. O verbo fazer não concorda com o tempo e isso gera um uso especial: “Parei de estudar faz dois anos”.
O verbo haver é outro campeão em hipercorreção. “Haviam falhas no processo” ou “Se não houvessem tantos gols perdidos, a história do jogo seria outra” são exemplos de concordância plural em hora errada.
Haver, no sentido de existir, forma uma oração sem sujeito e fica, nesse caso, no singular: “Havia falhas no processo” ou “Se não houvesse tantos gols perdidos, a história do jogo seria outra”.
Os exemplos são variados e diversos, atingindo a todas as idades, regiões e bolsos, mas o exemplo que mais me toca (até pela proximidade regional do fenômeno) é o do caipira que, ciente de sua troca do “l” pelo “r” (como em “paster de vento” e “criatura mardosa”), quer disfarçar sua origem e procura falar como os “rapai” da cidade. E, no restaurante, pede ao garçom uma faca e um “galfo”, em vez de garfo. É a hipercorreção ou hiperurbanismo em ação.