Carreira

Abuso de álcool entre funcionários deve estar na mira dos gestores

Ao monitorar saúde e aspectos emocionais, empresas também devem considerar o abuso de susbstâncias

Bebidas: em grandes quantidades, leva a pessoa a um estado de sedação, causa reações estomacais e desidratação (CSA Images/Getty Images)

Bebidas: em grandes quantidades, leva a pessoa a um estado de sedação, causa reações estomacais e desidratação (CSA Images/Getty Images)

Victor Sena

Victor Sena

Publicado em 30 de janeiro de 2021 às 18h46.

Última atualização em 30 de janeiro de 2021 às 18h59.

Isolamento social, falta de atividades ao livre e distância de pessoas queridas. Com a pandemia, foram poucos os que não passaram por uma dessas situações. A elas, podemos somar o excesso de trabalho causado pela perda de “fronteiras” do home office.

Com esse peso sob as costas, recorrer ao álcool foi um comportamento observado fortemente em 2020.

De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), no relatório “Uso de Álcool e Covid-19”, 35% dos entrevistados com idades entre 30 e 39 anos relataram aumento na frequência de um comportamento chamado de beber pesado episódico. Essas situações são os chamados porres, que costumam acontecer a partir do momento em que uma pessoa toma mais de cinco doses de álcool.

Por ser um depressões do cérebro, o álcool atua primeiro como um relaxante, depois causa euforia e diminui a área cerebral que controla nossos limites.

Em grandes quantidades, leva a pessoa a um estado de sedação, causa reações estomacais e desidratação. Primeiro ele causa desinibição e depois deprime. Como é uma droga, vicia. No entanto, está entranhado na cultura brasileira, e até nas empresas. Startups e empresas que pregam a descontração tem até geladeiras com cervejas.

Assim como os outros aspectos da saúde mental, o abuso de substâncias deve entrar na lista de assuntos que os setores de Recursos Humanos e as empresas devem ficar atentas. 

Para Jane Teixeira, gerente médica da empresa Sharecare Brasil, que presta serviços de monitoramento da saúde dos trabalhadores, o alcoolismo em funcionários está fortemente ligado a questões emocionais e é por aí que deve começar o monitoramento. 

“Na pandemia, o álcool acabou virando uma válvula de escape, uma forma de relaxamento. Mas ele não é uma forma efetiva de combate a isso porque ele causa outros problemas como depressão, dependência e outros rebotes”, explica a médica.

Depois de monitorar os riscos emocionais dos trabalhadores de uma empresa, a Sharecare trabalha com algumas frentes, como a educação e o fornecimento de ferramentas para as pessoas acompanharem a própria saúde.

A questão do álcool, porém, por ele ser culturalmente aceito, às vezes encontra barreiras. De acordo com a Jane, alguns profissionais - mesmo que não sejam alcoólatras - não reconhecem que podem estar fazendo uso excessivo de álcool porque há uma normalização na cultura do seu consumo regular.

A psiquiatra Ana Cecilia Marques destaca que o aumento do consumo de álcool já era esperado quando a pandemia começou. Isso porque a humanidade não tinha mais uma memória de como lidar com um momento desses. Além disso, teve mais tempo livre ao começar a trabalhar de casa e tiveram que lidar com mais tensões e conflitos.

A diminuição das opções de lazer também é uma das causas. Para ela, o uso excessivo durante o dia a dia está diretamente relacionado à cultura brasileira, que entende o álcool como uma droga leve, que faz parte da rotina.

Ana Cecilia Marques também ressalta a importância de se adiar a experimentação do álcool. Segundo ela, adolescentes com 12 anos já experimentam bebidas, o que dá mais probabilidade de a dependência ser desenvolvida na vida adulta. Isso acontece porque o cérebro, antes da idade adulta, ainda está em formação e é mais vulnerável.

Além de ser um problema decorrente de alguma questão emocional - que por si só já reduz a produtividade do empregado - o consumo excessivo de álcool gera ressacas e, no fim das contas, perdas para as empresas. Entre os sinais de alguém está com consumo excessivo de álcool está justamente o comportamento no dia seguinte, que pode ser de perdas de horários, falta de foco, rosto cansado e sono. Isso ocorre porque o corpo é, ao pé da letra, intoxicado pela substância.

Na visão de Jane, as empresas precisam deixar para trás o estigma com os problemas emocionais e psiquiátricos e devem assumir a responsabilidade pela saúde dos funcionários de uma forma holística.

Uma pesquisa compilada pela Mental Health Network aponta que ao faltar ao trabalho devido a questões emocionais, 95% dos funcionários dão outras justificativas. Em outras palavras, mentem. 

De acordo com a OMS, a depressão é uma das principais causas de incapacitação no mundo, e o suicídio é segunda maior causa de morte entre jovens entre 15 e 29 anos. E isso tem efeitos nas empresas, reduzindo produtividade e satisfação profissional.

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