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Da Redação
Publicado em 1 de outubro de 2013 às 16h12.
São Paulo - Está claro que países emergentes como o Brasil estão num momento muito diferente do experimentado pelos Estados Unidos — um evento inédito na história.
Para explicar o que está acontecendo na economia mundial, o economista americano Harry S. Dent Jr. escreveu A Próxima Grande Depressão (Ed. Campus/Elsevier), em que faz análises e previsões para os próximos 20 anos, a partir de estudos comparativos sobre os ciclos econômicos.
“Os Estados Unidos estão vivendo um ciclo de depuração [leia-se recessão]. Depois disso, sairá mais forte do que antes. Este é um império que ainda vai atingir seu apogeu”, diz o autor. Acompanhe a seguir entrevista concedida por Harry à VOCÊ S/A.
Ao ler seu livro, me pareceu que as previsões feitas a partir dos estudos dos ciclos são válidas somente para os países hegemônicos, como foi a Inglaterra no passado e os Estados Unidos hoje. É verdade?
É verdade que ciclos mais amplos ocorrem em países com tecnologia de ponta. Os países em desenvolvimento, como o Brasil, são mais impactados pelas oscilações especulativas de commodities dos países desenvolvidos, em maior ou menor grau. Mas os países em desenvolvimento se beneficiam das revoluções nas esferas econômicas, sociais e políticas.
VOCÊ S/A - Por que não será possível brecar a próxima grande depressão?
Harry S. Dent Jr. - É possível prever uma crise, mas não há uma maneira pela qual qualquer pessoa, empresa ou governo possa parar uma grande depressão uma vez que seu ciclo teve inicio.
O Japão não conseguiu, mesmo vivenciando sua crise de deflação enquanto o resto do mundo assistia a uma das maiores explosões de consumo da história. As crises fazem parte dos ajustes necessários da própria economia.
VOCÊ S/A - As bolhas fazem o papel da seleção natural darwinista?
Harry S. Dent Jr. - Sim, as depressões são ciclos de depuração que equalizam o excesso de consumo e a saturação da oferta de produtos com tecnologia.
Só os bancos e as empresas que se ajustarem sobreviverão e sairão mais fortes, o que é muito bom para a eficiência no longo prazo, custos menores de negócios e padrões de vida mais altos para os consumidores.
VOCÊ S/A - Há exemplos disso?
Harry S. Dent Jr. - Foi o que aconteceu no fim do século 19 e início do 20, quando inventaram o carro, o telefone e a eletricidade, as novas tecnologias da época. Em seguida, vieram a crise de 1929 e seus ajustes. Depois, a explosão demográfica, a produção em larga escala e o acesso a esses bens tecnológicos aceleraram o crescimento da economia mundial.
Vimos outras crises, novas tecnologias, mais produtos e consumo. E está acontecendo agora, com celulares, internet, e vai acontecer com as novas tecnologias ligadas à banda larga e as novas gerações chegando ao mercado de trabalho e consumo.
VOCÊ S/A - No Brasil, a imprensa tem noticiado certa recuperação da economia americana. O senhor afirma que o pior está por vir. O que exatamente?
Harry S. Dent Jr. - O sistema bancário e a economia começaram a ficar lentos em 2008 nos Estados Unidos devido à desalavancagem maciça de crédito.
O governo criou um programa de estímulo e de suporte ao sistema bancário, mas não vai interromper a desalavancagem. Ainda temos o fato de que os altos índices de desemprego continuam a provocar calotes nos financiamentos da casa própria e no setor imobiliário.
VOCÊ S/A - Assim, nova desaceleração econômica voltará provavelmente do final de 2010 até 2012.
E o Brasil dentro desse cenário?
Harry S. Dent Jr. - O mercado imobiliário contina forte no Brasil devido à demanda demográfica nas cidades e as ações subiram para valores próximos aos de suas altas no final de 2007.
Porém, a desaceleração global impactará nas exportações e na economia do Brasil, por isso é muito provável que outra desvalorização dos preços das ações e dos imóveis será alinhada à desvalorização global daqui poucos anos.
VOCÊ S/A - O que poderemos esperar do ciclo de depuração da próxima década?
A maior parte das economias do mundo se moverá para o lado e para baixo de 2010 a 2019. Os países emergentes serão as exceções, mas eles ainda estarão preocupados com a redução das exportações.
VOCÊ S/A - Qual é o papel de um país emergente como o Brasil num período de depressão?
Harry S. Dent Jr. - Países em desenvolvimento como o Brasil adicionam crescimento demográfico e demanda do consumidor à economia global, que sofre o envelhecimento e a desaceleração dos maiores países desenvolvidos.
O Brasil é um importante fornecedor de commodities para o mundo desenvolvido em envelhecimento e, o mais importante, para as nações com nova industrialização da Ásia, como a China e a Índia.
VOCÊ S/A - Quando o senhor aponta tendências de longo prazo, o que está prevendo para a geração Y nos Estados Unidos?
Harry S. Dent Jr. - A geração Y se beneficiará tão logo os preços de moradias e as taxas de financiamentos para casa própria caiam mais. E também os custos da educação dessa turma provavelmente cairão, auxiliados pela educação online — outro beneficio para a geração Y, mais jovem.
VOCÊ S/A - Qual será o papel dos Y para a recuperação da economia americana?
Harry S. Dent Jr. - A geração Y criará nos Estados Unidos outro ciclo de inovação de tecnologias. Isso beneficiará a economia global e manterá os Estados Unidos mais forte do que a Europa no mundo desenvolvido.
Como o Brasil deverá ter mais gente jovem entrando na economia nas décadas que seguem, a inovação continuará a se desenvolver aí também. Então, ter mais gente jovem com formação universitária e técnica é outro imperativo para o Brasil.