Henrique Gonzalez, diretor de recursos humanos da Bic: "A primeira impressão de tudo é que eu estava entrando numa empresa leve e informal." (Omar Paixão / VOCÊ RH)
Da Redação
Publicado em 6 de novembro de 2014 às 05h00.
São Paulo - O primeiro dia de trabalho sempre dá um frio na barriga. Seja você o estagiário, seja o executivo de uma multinacional. É quando você vai descobrir se tem sala, se seu e-mail já está ativado e como funcionam as regras mais simples da empresa, como achar a vaga no estacionamento e se o almoço será feito num refeitório ou no restaurante ali ao lado.
Os momentos seguintes serão mais confortáveis, mas não menos intensos. Os 100 primeiros dias de trabalho poderiam ser chamados de dias das descobertas. Cada reunião gera uma pergunta. Cada pergunta, uma resposta. Cada resposta, uma dúvida. Ou várias.
Para o executivo de RH, essas primeiras impressões têm um gosto especial. É a chance que ele tem de ler a empresa com olhos ainda novos, entender a linguagem corporativa, traduzir a cultura e, a partir daí, montar um plano para pôr a mão na massa. Os executivos que participaram desse ensaio estão nessa fase de descobrimento — e encantamento. Alguns chegaram tão recentemente que nem têm cartão de visita.
Outros acabaram de ultrapassar a barreira dos 100 dias. Todos, no entanto, têm em comum passagens por grandes companhias, uma carreira já consolidada na área de recursos humanos e a mesma pressa em conhecer o negócio e, principalmente, as pessoas. São elas o objeto de maior interesse desses profissionais.
Há quem preferiu pular a integração oficial da companhia só para montar sua agenda de conversas. E elas começam desde um simples: ‘Quanto tempo você tem de empresa?’ até um diálogo mais estruturado sobre aspirações de carreiras. Independentemente da forma como cada um desenhou sua rotina, todos já entraram no time jogando. Sem muito tempo para o aquecimento.
Nesses três primeiros meses, teve gente que já foi para o México duas vezes, já visitou mais de uma vez a fábrica, participou de convenção de vendas ou está discutindo o orçamento de 2015. Os 100 dias ficaram mais curtos e, na prática, na metade desse tempo eles já viajaram tanto e fizeram tantas reuniões e conference call que já nem lembram mais como era sua vida antes de adotar um novo sobrenome corporativo.
110 dias
Henrique Gonzalez, 46 anos, diretor de recursos humanos da Bic
"Confesso que eu fugi da integração formal no meu primeiro dia de trabalho. Eu queria conhecer as pessoas e partir para a prática. De manhã, conheci minha equipe. À tarde, participei da reunião de diretoria e pude conhecer os seis diretores.
A primeira impressão de tudo é que eu estava entrando numa empresa leve e informal. Ninguém aqui, por exemplo, usa terno. O que fez todo sentido quando descobri que simplicidade é um dos cinco valores da Bic.
Outra coisa que você logo percebe é que cada empresa tem sua linguagem própria e as pessoas se comunicam como se você já conhecesse todos aqueles nomes e verbos que só existem ali. O que não podemos ter é vergonha de perguntar. Eu nunca tinha falado, por exemplo, o verbo ‘positivar’. É uma linguagem de marketing.
Também não sabia que a Bic estava no segmento de barbeadores e que a empresa vende — só no Brasil — mais de 1 bilhão de itens a cada 12 meses. Passado o período da “experiência”, você percebe que já está totalmente integrado. Eu brinco que já ‘positivei’ todo mundo. Meu filho de 3 anos só usa agora lápis da Bic e eu, claro, já troquei a marca do meu barbeador.”
51 dias
Samanta Pereira, 41 anos, diretora de recursos humanos do Grupo Guanabara
"Todos os meus recomeços sempre foram em setores diferentes, o que torna esses primeiros meses muito intensos. Quando cheguei aqui, fiquei muito impressionada com tudo (na verdade, ainda estou) e comecei a visitar as diferentes empresas do grupo para entender melhor seus 47 negócios.
Essa é minha maior preocupação: entender melhor como funciona cada coisa. Cada negócio já tinha seu próprio RH, mas não havia um RH corporativo — motivo da minha contratação. Portanto, tudo é muito novo em todos os sentidos. Ao chegar, eu não tinha nem sala.
Fiquei duas semanas alocada na sala de reuniões até saber para onde eu iria. Também não havia uma política de integração, o que me deu, de certa forma, liberdade para montar uma agenda própria e falar com as pessoas. No primeiro dia, fui apresentada ao fundador do grupo e depois a seus filhos.
Esse primeiro momento tem sido de leitura de valores. Isso é fundamental quando você chega para criar políticas e diretrizes que norteiem todo o grupo. E mais fundamental ainda quando se trata de uma empresa familiar.”
43 dias
Sergio Póvoa, 46 anos, diretor de RH da Netshoes
"Comecei numa segunda-feira e participei da integração com uma assistente de marketing. Foi no primeiro dia que conheci minha sala e minha equipe. Juntei todos do RH para me apresentar e ouvir. Depois, tomamos café da manhã juntos. Meu papel aqui é ser um prestador de serviços e por isso eu preciso ouvir muito.
Nesses primeiros 40 dias, já conversei com todos os diretores, todos os gerentes, já estive no centro de distribuição, fui acompanhar despacho de tênis e ainda estou chamando grupos de pessoas aleatoriamente para me falarem o que é legal e o que falta na empresa. Dessa forma, você ganha confiança do time. As pessoas têm de ter liberdade para entrar aqui e falar o que pensam.
O mais difícil nesse começo é segurar minha própria ansiedade. Quero conhecer tudo muito rapidamente. Por conta própria, puxei essa experiência dos 100 dias para 60 dias. É nesse período que pretendo entregar meu plano de RH para os próximos anos. Estou quase lá.”
15 dias
Glaucia Teixeira, 50 anos, vice-presidente de RH para a América do Sul da Novelis
"Não existe mais isso de três meses de adaptação. O tempo de resposta do executivo está achatando cada vez mais. Pessoalmente, eu acho muito bom porque a vida é muito intensa e a postura do executivo deve acompanhar esse ritmo. Eu ainda estou no período de integração.
Fui recebida pela vice-presidente sênior de RH da Novelis, Leslie Joyce, que veio de Atlanta e passou a primeira semana aqui para me acompanhar. Mas essa fase de aprendizado obviamente não acabou. Tenho muitas reuniões — de oito a dez por dia. Já conheci toda minha equipe e já estive na fábrica de Pindamonhangaba, uma experiência incrível.
Não imaginava, por exemplo, que por trás de uma latinha de alumínio há tanto processo e inovação. Esse é um momento de descoberta. Momento de fazer muitas perguntas, muitos porquês. As respostas chegam de acordo com minha demanda. Estou fazendo um levantamento de tudo o que a gente tem e o que pode ser feito. Já posso dizer que comecei a escrever minha listinha de melhorias.”
70 dias
José Ricardo Amaro, 47 anos, diretor de RH da Ticket
Minha rescisão na outra empresa foi no dia 1o de julho e no dia 2 eu já estava aqui. Não sabia coisas básicas, como onde eu iria guardar o carro, se tinha refeitório ou qual era meu plano de saúde.
No primeiro dia, o presidente me apresentou para minha equipe. Na sequência, eu me apresentei e, a partir daí, comecei a entender dos assuntos mais emergentes. Preparei uma integração fora do protocolo para que eu pudesse circular mais e conhecer mais pessoas. Meu objetivo era ouvir a história de vida dos funcionários, entender a área e suas principais demandas e conhecer toda a cadeia do negócio.
Foi assim que descobri, por exemplo, que a Ticket fazia o processamento de seus cartões de plástico. Nesses 70 dias, eu já falei com umas 25 pessoas e ouvi várias perguntas, desde ‘vai voltar a ter salão de beleza?’ até ‘você vai rever a política de cargos e salários?’. A resposta para tudo é ‘vou avaliar’. E é o que estou tentando fazer.”