Será que você é alvo desse novo termo viral? (Pattanaphong Khuankaew / EyeEm/Getty Images)
Bússola
Publicado em 3 de novembro de 2022 às 15h30.
Última atualização em 3 de novembro de 2022 às 15h50.
Nos últimos meses a mídia vem sendo bombardeada sobre quiet quitting ("demissão silenciosa"), tema já abordado por aqui. Em resposta a ele, surge um contraponto das empresas com esse movimento: o quiet firing ("dispensa silenciosa"). Porém, não estamos falando de nenhuma novidade, afinal essa prática já ocorre há anos, impactando a vida, a carreira e a saúde mental de muitas pessoas. Somente ganhou um novo “rótulo” e foi elucidada recentemente.
Nos últimos tempos, vem aumentando cada vez mais a procura por ambientes de trabalho humanizados, com expectativas de clareza, feedbacks que guiam nosso “termômetro de desempenho” e transparência sobre a situação corporativa. Mas o que acontece no quiet firing é exatamente o contrário: a liderança desliga aos poucos o colaborador, no dia a dia, fazendo com que a rotina seja muitas vezes maçante, sem sentido ou cheio de “travas”, gerando sentimentos de frustração, inutilidade e, principalmente, desmotivação.
Eu, particularmente, observo essa conduta de repressão como falta de preparo por parte da liderança (ou da empresa) em não saber lidar com conflitos, com posturas e comportamentos diferentes. Acredito, inclusive, que pode ser muito mais trabalhoso do que desenvolver um liderado em uma relação de clareza e parceria.
Mas afinal, o que é quiet firing?
Deixando de lado a tradução ao pé da letra, o que vemos são termos que servem para definir uma dispensa silenciosa, na qual a liderança cria dificuldades para um bom desempenho profissional e oferece condições de trabalho desmotivadoras para induzir um funcionário a desistir do cargo.
Mas engana-se quem pensa que essa prática é sempre muito explícita e pode levar algum tempo para ser identificada ou até mesmo chegar muito próxima a um assédio moral.
Você está passando por um quiet firing? Saiba como identificar os sinais
Desde antes do início da jornada na empresa, ao longo do processo seletivo é possível e absolutamente necessário obter informações para manter expectativas alinhadas.
É fundamental questionar antes da contratação sobre a cultura da empresa, como a liderança direta e C-levels costumam comunicar e lidar com momentos de crise, baixa performance, ajustes de comportamento e de que forma desenvolvem os talentos. Daí, dá para ter uma ideia de como deverá ser a rotina do trabalho e como você será envolvido nas tarefas. Tendo algum tempo de vivência, analisando o que foi dito e o que é colocado em prática, já será possível identificar mudanças. A partir disso, como reconhecer se você está “na frigideira”?
Exclusões e distanciamento
Sabe aquelas reuniões que você está habituado a conduzir ou participar ativamente? Elas podem ser suspensas, encurtadas ou até mesmo redirecionadas para outras pessoas. Lembrando que o intuito do quiet firing é justamente desestimular e esse pode ser um dos primeiros aspectos a aparecer de forma mais concreta.
O mesmo vale para tarefas mais relacionais, eventos mais “informais”, como um happy hour, e, principalmente, a transformação de conversas para um modo frio e distante.
De olho nos rituais
Caso a empresa tenha estabelecido momentos estruturados para uma conversa aberta, feedbacks one to one e avaliações de desempenho, fique atento à regularidade dessas conversas. Talvez a frequência seja diminuída, demonstrando pouca importância a esses momentos fundamentais para esclarecer se você está indo no caminho certo, qual visão está gerando nas pessoas e o que precisa desenvolver.
Caso continuem ocorrendo, qual é o tom que está sendo utilizado? Geralmente a liderança utiliza o feedback justamente para frustrar, colocar metas inatingíveis, distorcer comportamentos e pontuar como negativos.
Acúmulo de demandas X perda de autonomia
Outro ponto importante para observar é a distribuição de tarefas: se o seu líder estiver nitidamente delegando mais demandas do que você pode absorver, tendo outra opção ou fazendo cobranças excessivas sem oferecer respaldo ou justificativas, questione se tem relação com o momento da equipe ou se existe outro motivo para a sobrecarga e analise a coerência na resposta.
Esse acúmulo de demandas pode aparecer também como um direcionamento mais operacional, caso você tenha um cargo mais estratégico, retirando a sua autonomia para tomada de decisões.
Novamente: é importante entender o intuito desse desvio para não correr o risco de deturpar as circunstâncias.
Analytics, os dados mostram tudo!
Não é novidade que os dados, além de fornecer a possibilidade de gerar insights, servem para quantificar situações, gerar comparativos e principalmente clarear caminhos.
Use e abuse dos dados para ter ideia de como está performando, qual o seu papel diante do cenário e as probabilidades existentes para de futuro a curto, médio e longo prazo.
Dica: se a mensuração de dados não faz parte da cultura da empresa ou da sua área, aproveite para introduzir, mostrando a necessidade, defendendo as vantagens e claro, gerando destaque e quem sabe até diminuindo as chances de ir parar “na frigideira”.
Aumento de salário e próximos passos
Se você apresenta bons resultados, comportamentos e atitudes alinhados ao que se espera de um profissional na sua função, certamente apresenta motivos para receber um aumento de salário, alguma bonificação ou uma promoção. Mas se a sua liderança parece estar impedindo seu avanço, bloqueando seu desenvolvimento e tornando seu próximo passo ofuscado e invisível, comece a juntar as peças e reveja as evidências.
Clima
Por último e não menos importante: sinta o ambiente. Você provavelmente já esteve em algum lugar que não se sentiu necessário ou bem-vindo, ficando desconfortável.
Quando falamos que essa prática já é antiga e foi apenas (re)nomeada, me lembro de já ter ouvido em algumas empresas, coisas do tipo: “se não está feliz aqui, a porta da rua é serventia da casa”. Observe seus relacionamentos na corporação e o quanto as pessoas consideram sua presença indispensável.
Esses parâmetros podem te auxiliar no processo de identificação do Quiet Firing, mas a recomendação é ter extremo cuidado para avaliar, refletindo especialmente sobre mudanças bruscas de cenário que impactam no seu desconforto.
Alguns questionamentos diários também podem ajudar a perceber se está sendo bem aproveitado na empresa, por exemplo: “qual a relevância da minha presença nessa função?” “Eu estou gerando resultados e sendo reconhecido por isso?”; “Qual impacto emocional a relação com a liderança está me causando?”.
Antes de desistir definitivamente do seu cargo, é fundamental saber que a iniciativa de buscar informações claras pode e deve partir de você.
Lembre-se sempre que quando a chama está alta e a panela fervendo, suas habilidades e conhecimentos podem não ser tão relevantes quanto a sua atitude de simplesmente apagar o fogo ou fazer uma deliciosa receita, avaliando qual a melhor ação e o objetivo para aquele momento.
*Danielle Calheiros é psicóloga, pós-graduada em recursos humanos e liderança, com 12 anos de atuação na área de recrutamento e seleção.
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