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Propriedade intelectual e inteligência artificial: um desafio emergente

Em artigo colaborativo, especialistas do escritório BMA Advogados discutem sobre direitos autorais na era da inteligência artificial

Encontrar soluções justas e equitativas para essas questões requer uma colaboração ativa entre legisladores (demaerre/Divulgação)

Encontrar soluções justas e equitativas para essas questões requer uma colaboração ativa entre legisladores (demaerre/Divulgação)

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Publicado em 3 de outubro de 2023 às 08h00.

Artigo colaborativo de Pedro Frankovsky Barroso, Pedro Tavares e Fernanda Quental Peres

As Inteligências Artificiais Generativas causaram verdadeira revolução na economia do conhecimento ao permitirem a criação intelectual por máquinas – a partir de comandos tão simples quanto pedir ao ChatGPT que elabore este artigo. Essa capacidade se dá a partir de ferramentas de machine learning, que fornecem aos sistemas uma enorme quantidade de material pré-existente, como livros, artigos, estudos, reportagens, filmes, obras de arte e fotografias, todos potencialmente protegidos por direitos de Propriedade Intelectual.

Em um cenário em que sistemas de Inteligência Artificial (IA) podem aprender e criar, surgem diversos desafios no âmbito da Propriedade Intelectual, sobretudo com relação à titularidade do direito sobre a criação e a legalidade do uso de obras protegidas na aprendizagem de máquinas.  

A titularidade das criações por máquinas

No projeto “The Next Rembrandt”, uma máquina dotada de IA aprendeu técnicas específicas do pintor Rembrandt quase 400 anos após a sua morte e o resultado final foi uma pintura produzida em impressora 3D. Foram imitadas até mesmo a espessura e a textura das camadas de uma autêntica obra de Rembrandt e imediatamente surgiu o questionamento a respeito da titularidade da nova obra criada pela máquina.

A possibilidade de não humanos figurarem como autores de obras já foi objeto de decisões administrativas – como a decisão do Escritório de Direitos Autorais dos EUA que negou o registro de imagens criadas pelo sistema Midjourney – e judiciais – como a recente decisão do Tribunal Federal do Distrito de Columbia (EUA) que negou proteção à obra “A Recent Entrance to Paradise”, desenvolvida por um sistema de IA chamado Creativity Machine, que pertence ao Sr. Stephen Thaler (que também é conhecido pelo sistema DABUS e as discussões envolvendo titularidade de invenções no campo do Direito de Patentes). Em ambos os casos, a ausência de autoria humana resultou na impossibilidade de proteção das respectivas obras, nos termos da legislação norte-americana.

No Brasil, parece-nos que a Lei de Direitos Autorais (Lei nº 9.610/98) levaria a uma conclusão semelhante. Afinal, o artigo 11 da lei define o autor como a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica. Além disso, o artigo 7º da lei traz um rol exemplificativo das obras intelectuais passíveis de proteção, definindo-as como criações do espírito. Nessa mesma linha, o Conselho da Justiça Federal, durante a IX Jornada de Direito Civil em maio de 2022, emitiu o enunciado 670, segundo o qual, independentemente do grau de autonomia de um sistema de IA, a condição de autor é restrita a seres humanos

No entanto, isso não significa que obras criadas com a ajuda de IA são necessariamente excluídas do objeto de proteção do Direito Autoral. Por exemplo, o já citado Escritório de Direitos Autorais dos EUA, em março de 2023, esclareceu que obras artísticas criadas com a ajuda de IA são elegíveis para proteção autoral em nome de pessoa física que tenha utilizado sistema de IA para criar a nova obra, a depender da quantidade de criatividade humana envolvida. 

Machine learning e uso da Propriedade Intelectual

Para além da questão sobre a autoria de obras geradas a partir de IA, a própria utilização de obras autorais no processo de machine learning traz questionamentos. Afinal, todos os textos, sons e imagens que alimentam os sistemas são possivelmente protegidos por direitos autorais.

Essa questão nos transporta exatamente ao papel de tecnologias GPT (“Generative Pre-Trained Transformers”) na produção textual e a dificuldade no entendimento sobre o que constituiria uma violação de direito autoral quando a obra é produzida a partir de uma ferramenta de IA. Por exemplo, um usuário que escreve um livro utilizando resultados criados a partir do uso dessa ferramenta muito provavelmente terá utilizado diferentes textos de diversos autores para criar uma nova obra. Qual seria, portanto, o limite para o uso de material para criar novos textos a partir de IA?

A Lei de Direitos Autorais é restritiva quanto ao uso não autorizado de obras por qualquer modalidade, valendo destacar aqui o seu artigo 29, IX, que proíbe a utilização de obra de terceiro para “a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero”. Além disso, o Código Penal tipifica como crime a violação de direitos do autor.  

Tribunais, legisladores e operadores do direito terão, portanto, que encontrar as soluções legais para resolver essas questões, de modo a viabilizar o inexorável futuro.

Encontrar soluções justas e equitativas para essas questões requer uma colaboração ativa entre legisladores, juristas, especialistas em IA e a sociedade em geral. Sem dúvidas, o futuro da Propriedade Intelectual na era da IA será desenhado a partir de influência ativa do Judiciário. 

Além das questões envolvendo os direitos autorais, a propriedade das invenções patenteáveis realizadas por máquinas também assumirá relevante papel nessa nova dinâmicas das criações intelectuais aplicadas à arte e à indústria.  

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