A diversidade traz vantagens competitivas para as empresas (99Jobs/Divulgação)
Bússola
Publicado em 25 de junho de 2021 às 13h07.
Última atualização em 25 de junho de 2021 às 13h40.
Por Fábio Eduardo de Pieri Spina*
Outro dia aprendi numa palestra que as pessoas privilegiadas pela sociedade não deveriam sentir culpa por terem chegado lá e conquistado o sucesso, mas sim assumir uma enorme responsabilidade em mudar radicalmente a nossa sociedade para torná-la mais justa e diversa.
Pelo importante papel que ocupam na sociedade, os líderes das empresas podem e devem estar à frente desse movimento, assumindo a responsabilidade, começando pela reformulação dos quadros no topo e abrindo espaço para a diversidade e a inclusão nas empresas. Afinal, o crescimento das minorias dentro das empresas vai representar uma maior projeção econômica e visibilidade dessas pessoas. E gerar uma onda positiva que vai reverberar em muitas áreas e espaços.
E os líderes mais conectados já perceberam que a diversidade, além de ser o certo a fazer, traz inúmeras vantagens competitivas para as empresas. Vale a pena lançar mão dessa poderosa arma para tornar o negócio superior e perene, sustentável assim ao longo dos anos: trazendo retornos acima dos concorrentes!
De fato, a diversidade torna mais rico o processo decisório (temos várias perspectivas diferentes pensando num mesmo problema), estimula o espírito colaborativo entre as pessoas, aumenta a inovação nos processos e produtos e permite entender o novo cliente/consumidor. As pessoas que são incluídas tendem a ser mais comprometidas e com o famoso “ownership”, senso de dono, sem o qual poucas empresas prosperam.
Resumindo, um quadro de líderes e colaboradores mais diverso contribui diretamente para novas formas de ver o mundo, entender os clientes, propor soluções mais alinhadas às demandas do presente e do futuro, de forma a caminhar para um ambiente de negócios mais saudável e competitivo.
Aliado à assunção de responsabilidade pelos líderes de um lado, felizmente nos últimos tempos também os colaboradores, clientes, comunidades e demais públicos de interesse cobram um compromisso sério e orgânico das empresas com questões relacionadas a sustentabilidade, diversidade e inclusão. O que antes era visto como diferencial, hoje é tido como obrigação e até mesmo requisito para melhores resultados.
E não é à toa. Estamos muito distantes da sociedade plural que queremos criar. Ainda em 2021, é comum chegar para trabalhar e encontrar um “Brasil dos escritórios (e até plantas industriais)” diferente do “Brasil verdadeiro das ruas”. Temos de unir e aproximar essas duas realidades!
A falta de diversidade, equidade e inclusão não para por aí: um estudo feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que as mulheres ainda ganham menos do que os homens em todas as ocupações selecionadas pela pesquisa em 2019. Também segundo o IBGE, as mulheres, especialmente as mais pobres, chefes de família e com filhos, foram as mais afetadas durante a pandemia: perda de renda, falta de creches e escolas, impossibilidade de adotar medidas de distanciamento social e o aumento da violência doméstica. Enquanto isso, dados do Ministério dos Direitos Humanos indicam que o Brasil registra uma vítima de homofobia pelo menos a cada 16 horas (sabemos que esse número nem retrata a realidade, dada a subnotificação de casos).
Também é muito triste viver em um país onde a expectativa de vida de um(a) transexual seja 35 anos! Estamos na idade média?!?!! Quantos jovens se suicidaram ao se descobrir LGBTQIA+ e perceber o ódio que havia contra eles. Seja suicídio propriamente dito, seja pelo uso de drogas, direção perigosa, depressão etc. Sem contar as oportunidades que esses seres humanos perderam no campo profissional, sempre avesso às pessoas diferentes. Mesma tristeza ir a um bom restaurante e raramente ver um negro sentado fazendo uma refeição, pelo abandono econômico imposto desde a libertação dos escravos, que perpetuou a segregação racial e o racismo estrutural.
Note-se que existe um marco legal que permite “medidas especiais tomadas com o objetivo de assegurar o progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou indivíduos que necessitem de proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos o igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais” (Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, de que o Brasil é signatário).
Temos promovido há muitos anos políticas que buscam fortalecer a diversidade. Desde 2020, por exemplo, começamos a adotar políticas de contratação que exijam de fornecedores para a diretoria jurídica e relações institucionais um mínimo de diversidade nos quadros destes. Também lançamos aqui na Gerdau, no ano passado, um Banco de Talentos voltado para a comunidade LGBTI+. O projeto faz parte das iniciativas de incentivo à diversidade no ambiente de trabalho. A iniciativa ocorre em parceria com a TODXS, startup sem fins lucrativos que atua com a inclusão de pessoas LGBTI+ na sociedade, responsável por apoiar a Gerdau com treinamentos e capacitações de seus líderes e profissionais de recursos humanos.
Temos de trabalhar o sistema para que ele mesmo tenha incentivos para mudar. E nada melhor do que o incentivo financeiro porque este é unânime para as empresas. Mesmo as que em tese não acreditam na diversidade serão chamadas a participar, pois estamos tocando “no bolso”, uma linguagem que todos entendem.
Por todo trabalho que temos feito, neste ano fui convidado para integrar o Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário, que tem a nobre missão de promover os direitos humanos dentro e fora do Poder Judiciário, a partir de um diálogo constante. O primeiro projeto que apresentamos é “Cite uma Mulher” que visa incentivar juíz@s, advogad@s e promotor@s a citarem mais mulheres, inclusive diversas mulheres negras, nas peças processuais e decisões.
Diante de tantos desafios impostos pela sociedade, promover o respeito e a inclusão de todas as pessoas e atuar no desenvolvimento sustentável de uma indústria mais diversa e competitiva para construirmos um novo futuro do país é o certo a se fazer.
É preciso ser otimista com a nova geração, que aproveita da democratização da informação para ser uma comunicadora em potencial e exige uma responsabilidade maior das empresas. Também é preciso ter paixão pelo tema, porque o cotidiano e a realidade tendem a nos desanimar dia após dia.
Mas acredito que temos a chance de começar a corrigir as injustiças do passado e proporcionar as mudanças desejadas para o futuro. Se mais pessoas se juntarem a esta onda e colocarmos mais ideias em prática, não estaremos só assumindo nossa responsabilidade, mas também deixando um legado de que nossos filhos poderão se orgulhar.
*Fábio Eduardo de Pieri Spina é diretor jurídico e de relações institucionais da Gerdau, presidente da comissão especial de competitividade jurídica e econômica, do conselho federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), e integrante do observatório dos direitos humanos do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ)
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