Bússola

Um conteúdo Bússola

Personagens e situações obscuras

Como foi previsto, se o governo escorregasse no assunto das vacinas cometeria um erro político de consequências potencialmente graves

A única política razoável sobre vacinas é trazer todas, na maior quantidade possível, e no menor prazo possível. (Marcos Oliveira/Agência Senado)

A única política razoável sobre vacinas é trazer todas, na maior quantidade possível, e no menor prazo possível. (Marcos Oliveira/Agência Senado)

B

Bússola

Publicado em 17 de julho de 2021 às 19h30.

Por Alon Feuerwerker*

Quando o Supremo Tribunal Federal arbitrou que governadores e prefeitos teriam autonomia para decidir sobre medidas de distanciamento e isolamento social, retirou uma parte do poder do presidente da República. Mas abriu-lhe, indiretamente, um caminho alternativo potencialmente promissor: ofereceu ao governo federal a oportunidade de concentrar-se no tema das vacinas.

Pelo que se vê até o momento da Comissão Parlamentar de Inquérito no Senado da Covid-19, o Planalto não apenas aproveitou mal a possibilidade, mas, na melhor das hipóteses, deixou florescer um ecossistema entrópico em assunto tão importante. Daí a emergência no noticiário de um amontoado de personagens obscuros apanhados em situações idem.

Já se podia antever, e foi antevisto, pelo menos desde outubro do ano passado: se o governo escorregasse no assunto das vacinas cometeria um erro político de consequências potencialmente graves (“Salada indigesta”). Para quem quis enxergar, o sinal amarelo acendeu quando o presidente reagiu biliosamente ao anúncio de que o Ministério da Saúde compraria a CoronaVac.

Aliás o Brasil vive uma situação surreal: o governo federal acabou decidindo gastar bilhões com ela, que hoje está no braço de metade dos imunizados, mas quem fatura politicamente são os governadores, enquanto o entorno presidencial continua falando mal da vacina chinesa do Butantan. Mesmo que todos os estudos comprovem a eficácia dela.

E não é só com a vacina da Sinovac. Um problema menos alardeado é a inexplicável demora para a aprovação do uso maciço por aqui da russa Sputnik V. Outra bem eficaz. Neste caso, nota-se uma curiosa aliança entre a direita saudosa da guerra fria e a esquerda corporativista que, na dúvida, toma as dores da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

Estivesse a CPI realmente tão preocupada em salvar vidas quanto em emparedar o governo, e a Anvisa já estaria faz tempo dançando em chapa quente por causa da Sputnik V.

A vacinação brasileira contra a Covid-19 vai razoavelmente, mas poderia estar indo melhor. Velocidade é fundamental, também por causa da corrida contra as novas cepas. E o Brasil tem estrutura para vacinar diariamente pelo menos o dobro do que está conseguindo imunizar hoje, inclusive pela verificada e crescente adesão popular.

Não é engenharia de obra pronta, porque vem sendo dito desde sempre: a única política razoável sobre vacinas é trazer todas, na maior quantidade possível, e no menor prazo possível. Claro que demandas assim superaquecidas ensejam risco de maus modos administrativos, e também por isso é necessário centralizar e adotar transparência máxima.

O governo federal carrega o mérito de ter buscado nacionalizar a produção da AstraZeneca na Fiocruz, mas errou em dois aspectos estratégicos: confiou na política de uma só vacina e não cuidou adequadamente de ter vacinas aqui em grande quantidade no curtíssimo prazo. Este segundo ponto foi fatal quando a segunda onda veio como um tsunami a partir de Manaus.

É a típica situação em que o acúmulo de erros acaba impedindo a capitalização política. Todas as pesquisas mostram que o eleitorado 1) está mais otimista quanto ao controle da epidemia e 2) credita em boa medida a vacinação ao Ministério da Saúde. Enquanto isso, o presidente da República vive seu momento mais crítico, na popularidade e na política.

*Alon Feuerwerker é Analista Político da FSB Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

Siga a Bússola nas redes: Instagram | LinkedInTwitter | Facebook | Youtube

Veja também

Acompanhe tudo sobre:Bússola Análise do AlonCPI da Covid

Mais de Bússola

Índice de Carbono Eficiente da B3 recebe nova gigante da moda brasileira

Empresa brasileira de conteúdo digital tem crescimento anual de 90% e atrai fundos de investimentos

Bússola & Cia: Syonet cresce 30% oferecendo tecnologia para concessionárias de veículos

Gestão Sustentável: desigualdades ampliam impacto de crises climáticas e socioeconômicas