(SDI Productions/Getty Images)
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Publicado em 30 de outubro de 2024 às 07h00.
As eleições municipais de 2024 revelaram ganhos modestos na participação feminina, mas ainda estamos longe de ver uma mudança significativa. 10.554 mulheres foram eleitas para as Câmaras Municipais, o que representa cerca de 18% do total de eleitos. Embora esse número seja superior ao registrado em 2020 (16,13%), o crescimento ainda é muito tímido.
Essa lentidão é um reflexo de uma série de desafios que mulheres (e minorias em geral) enfrentam para ingressar e permanecer na política. A falta de financiamento para campanhas, ausência de mentoria e apoio institucional, sobrecarga de responsabilidades domésticas e violência política são apenas alguns dos obstáculos que minam a participação de mulheres.
Além disso, a cultura política ainda é majoritariamente machista, o que desestimula a participação feminina e dificulta a ascensão das mulheres a cargos de liderança. Muitas são chamadas a se candidatar apenas para preencher as cotas, sem o devido suporte para suas campanhas.
Para mulheres negras, o cenário é ainda mais desafiador. Em 2024, apenas 4.318 mulheres negras foram eleitas vereadoras – uma cifra ainda insuficiente considerando a diversidade racial e a representatividade que o Brasil precisa.
Mulheres negras, além de enfrentarem a exclusão política e a falta de recursos de campanha, sofrem com múltiplas formas de violência: a de gênero e a racial. Racismo estrutural, invisibilização de lideranças negras e preconceito dentro dos próprios partidos são apenas algumas das barreiras recorrentes que limitam suas trajetórias e permanência no espaço público.
Esses obstáculos não apenas dificultam o acesso das mulheres negras à política, mas também perpetuam uma sub-representação que afeta diretamente a diversidade e qualidade da tomada de decisão. Uma evidência disso é o levantamento da Gênero e Número: para cada mulher negra eleita prefeita no primeiro turno, há 14 homens brancos ocupando o mesmo cargo, ilustrando a disparidade racial e de gênero.
A legislação eleitoral brasileira determina que ao menos 30% das candidaturas proporcionais sejam de mulheres. As cotas são essenciais para garantir que haja uma oferta mínima de candidaturas femininas, mas elas não garantem que as mulheres sejam efetivamente eleitas. No sistema brasileiro de listas abertas, cada eleitor vota em um candidato individual, não em uma lista fechada apresentada pelo partido. Assim, mesmo que as candidaturas femininas atendam ao mínimo legal, a chance de eleição continua limitada pela visibilidade desigual e pela predominância de candidaturas masculinas consolidadas.
Essa dinâmica também abre brechas para manipulações e fraudes. Partidos cumprem a cota no papel, mas, na prática, não apoiam as campanhas de mulheres de maneira adequada. Há denúncias de candidaturas "laranja" e de distribuição desigual de recursos, com mulheres recebendo valores irrisórios ou nada para financiar suas campanhas. De acordo com levantamento do Observatório Nacional da Mulher na Política, em mais de 700 cidades, algum partido não cumpriu a cota mínima. Além disso, muitas candidatas relatam episódios de violência política, tanto de adversários quanto de colegas do próprio partido, dificultando ainda mais sua participação.
O sistema de cotas como existe hoje se concentra apenas na oferta de candidaturas, não em garantir ocupação proporcional de assentos, o que reforça as desigualdades. Sem mudanças estruturais que assegurem que mulheres e minorias sejam eleitas, a sub-representação continuará.
Diante desse cenário, é fundamental que o Brasil desenvolva políticas mais robustas para garantir a participação efetiva de mulheres na política. Essa mudança passa pelo monitoramento rigoroso do financiamento de campanhas, para assegurar que os recursos previstos em lei cheguem de fato às candidatas.
Mas também é preciso ir além: o problema é urgente e precisamos de políticas mais ambiciosas para que a nossa geração possa presenciar a paridade de gênero na política. A implementação de reservas de cadeiras para mulheres nas câmaras municipais poderia ser uma solução eficaz. Essa medida garantiria que, independentemente da votação, um percentual fixo de assentos fosse reservado para candidatas, proporcionando uma representação mínima e assegurando que as mulheres tenham voz e vez nas decisões políticas.
A implementação de reservas de cadeiras para mulheres não é mais uma proposta distante – é uma necessidade urgente. A mudança do sistema eleitoral brasileiro, com adaptações nas listas abertas, é essencial para garantir que essas reservas sejam aplicadas de forma justa e efetiva. A inclusão de mulheres e minorias é mais do que uma meta: é uma necessidade para que a democracia brasileira se fortaleça e se qualifique.
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