Estratégia é entender o que o público deseja e conciliar esse caminho (Vittorio Zunino Celotto/Getty Images)
Bússola
Publicado em 24 de setembro de 2021 às 10h47.
Por André Sobral*
O processo movido pela estrela Scarlett Johansson sobre os estúdios Disney ganhou as redes sociais nas últimas semanas, depois que o filme “Viúva Negra” foi lançado simultaneamente nos cinemas e na plataforma Disney+. A atriz alega que seu contrato com a produtora garantia o lançamento exclusivo do longa na telona e que seu salário dependia em grande parte da bilheteria. Ela teria deixado de ganhar cerca de US$ 50 milhões.
A ação de Johansson gerou reações nas redes sociais por parte de outras celebridades, que saíram em defesa da atriz, e estimulou outras personalidades a fazerem o mesmo, como o ator Gerard Butler, que processou a produtora Nu Image - Millennium Films, afirmando não ter recebido tudo que foi combinado pelo filme “Invasão à Casa Branca” (2013). Emma Stone ameaçou se juntar à trupe pelo lançamento de “Cruella”, pela Disney, mas voltou atrás.
Para além disso, esses casos acenderam o debate sobre qual seria o impacto na indústria audiovisual, que vem sendo chacoalhada pelo boom do streaming. Ainda mais porque as salas de cinema, cujo fechamento em massa foi uma das marcas da pandemia, começam a retomar suas atividade: segundo relatório da Gower Street Analytics, a bilheteria mundial dos cinemas para 2021 está projetada para chegar a US$ 20,2 bilhões (cerca de R$ 105 bilhões), 68% acima de 2020.
Será que a retomada das bilheterias nos fará retornar ao cenário pré-pandêmico? Ou é um caminho sem volta?
E a resposta veio: a casa de Mickey Mouse anunciou, neste início de setembro, o fim de sua experiência com lançamentos híbridos, que vinha acontecendo desde 2020, com produções como “Mulan” e “Soul”. Além da disputa com a atriz, outro fator que influenciou a decisão foi a recente retomada das telonas, como o sucesso do longa “Shang Chi e a Lenda dos Dez Anéis” nas bilheterias.
A estratégia da Disney faz parte de uma mudança de posicionamento no mercado, com a adoção do D2C (Direct to Consumer), que descarta a presença de canais intermediários e, portanto, foi vista como uma ameaça às salas de cinema. Foi o mesmo que fez a Warner, com o lançamento híbrido de “Wonder Woman 1984”. Inclusive, a produtora chegou a anunciar, antes de 2020 acabar, que todas as estreias deste ano seguiriam o modelo. Dito e feito.
Fica claro que os estúdios perceberam que o streaming é coisa séria e não vão parar de investir em grandes produções voltadas a essas plataformas, a fim de impulsionar seu crescimento e atingir novos públicos — principalmente depois da pandemia.
Mas os casos de tensão com as estrelas de Hollywood mostram que o avanço dos serviços on demand começa a enfrentar obstáculos e que os produtores precisam rever suas estratégias constantemente para executá-las com responsabilidade e de forma justa para todos os agentes envolvidos. Afinal, Johansson e seus discípulos tem sua razão. Não está fácil pra ninguém (talvez nem mesmo para atores milionários).
A indústria do cinema é uma cadeia complexa, envolve muitas pessoas e investimento de dinheiro e tempo, por isso é preciso dar os passos certos. O momento é de testar novos modelos de negócio e até que a fórmula mágica seja encontrada. Talvez uma saída esteja na própria tecnologia, como os dados, por exemplo, que ajudam a entender melhor o desejo dos consumidores. A certeza é que, até lá, veremos muitas brigas de Viúvas Negras contra Mickey Mouses.
*André Sobral é formado em direito com pós-graduação em marketing pela FGV e direção de cinema pelo Maine Media College. É produtor da Abrolhos Filmes, por onde produziu seu primeiro longa, o documentário “Chico Rei Entre Nós” (Joyce Prado, 2020), premiado na 44ª Mostra Internacional de São Paulo. Foi produtor associado de três filmes realizados por meio de coproduções internacionais, entre eles “Call Me By Your Name” (Luca Guadagnino, 2017), indicado ao Oscar 2018
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