Mobilizar as ruas poderia ajudar o Executivo na desejada reconcentração de poder (Ricardo Stuckert/PR/Flickr)
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Publicado em 27 de maio de 2023 às 18h44.
Por Alon Feuerwerker*
As diferentes forças políticas reagem cada uma a sua moda diante da realidade: nenhuma delas saiu da eleição com poder suficiente para subjugar as demais. Até agora, quem atua de maneira mais pragmática é o presidente da República, que reconhece explicitamente a necessidade de negociar com um Congresso de maioria à direita. E vai equilibrando os pratos.
Adeptos de Luiz Inácio Lula da Silva prefeririam que ele se aliasse ao Supremo Tribunal Federal para tentar “enquadrar” o Legislativo, mas o presidente é mais esperto que isso. Uma operação assim teria dois resultados possíveis: 1) o fracasso, com a consequente anabolização ainda maior do Congresso; 2) um “sucesso” que faria de Lula refém do STF.
Haveria ainda, na teoria, uma terceira opção: mobilizar as ruas para ajudar o Executivo na desejada reconcentração de poder. Há aí, entretanto, dois problemas: 1) os movimentos sociais da esquerda, em particular o movimento sindical, são pálida sombra do que foram um dia; e 2) transferir a disputa política para as ruas abre espaço para a mobilização social da oposição.
Hoje, a oposição ao governo do PT é contida pelos freios judiciais impostos pelo empoderado Supremo e está em minoria no Legislativo. Então interessa ao situacionismo continuar “jogando em casa”, e não repetir junho de 2013, quando a confusão de rua começou beneficiando a esquerda -e pelas mãos da esquerda-, mas acabou como uma festa da direita.
Há contraexemplos, como na Colômbia, mas uma diferença é óbvia. Ali, o governo de esquerda de Gustavo Petro é novidade histórica, a direita está acuada, a esquerda ainda desfruta uma imagem de pureza, e os movimentos sociais autonomeados progressistas estão na ponta dos cascos. Não é, definitivamente, o caso brasileiro.
A dúvida é por onde o governo deveria trabalhar para alterar a correlação de forças, e parece nítido que isso só será possível se Lula colocar o Brasil numa rota de crescimento econômico consistente, de criação de empregos e geração e distribuição de renda. Talvez seja a única forma de descongelar a persistente divisão social e política meio a meio.
A aposta da equipe econômica desenha um ajuste fiscal baseado na elevação da carga tributária, para aí permitir o afrouxamento da política monetária e alavancar a economia com base na redução dos juros. A dúvida é se retirar recursos do setor privado não vai desestimular o investimento, sem que o governo tenha como compensar com investimento público.
Até o momento, Lula mantém a fatia eleitoral do segundo turno, uns 39% do estoque total de votos no país. No começo do governo, como mostraram as pesquisas, metade dos que não tinham votado nele manifestava alguma boa vontade. Mas isso parece estar se erodindo, ainda que lentamente. O governo precisa da economia para reverter a tendência.
P.S.: No momento, a oposição e os “aliados” da direita ajudam Lula a moderar a turma dele, o que em determinados pontos lhe é útil. Mas, se a popularidade cair, o outro lado e os companheiros circunstanciais de viagem vão crescer o olho.
*Alon Feuerwerker é jornalista e analista político
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