No capitalismo, quem vende algo precisa de consumidores e, portanto, quer que o pobre saia da miséria. (Germano Lüders/Exame)
Da Redação
Publicado em 10 de maio de 2021 às 17h24.
Por Paulo Vicente dos Santos Alves*
O mundo vive uma crise grave com a pandemia, mas o Brasil sofre ainda mais por conta da política pública de saúde ineficaz. A incapacidade de coordenação dos vários níveis de governo, do Executivo, Legislativo e Judiciário, reforça a percepção de que as políticas públicas têm critérios ideológicos. Isso cria uma baixa na confiança de que vamos sair da crise. Mas esta visão derrotista é equivocada.
Olhando para a história, acredito que a discussão de como chegamos até aqui gira em torno da forma que o país está saindo do feudalismo para o capitalismo. Estamos no meio desta transição que dura cerca de 200 anos. Até a Guerra do Paraguai, o Brasil era feudal, com nobres que viviam da agricultura, uma massa de plebeus e muitos escravos.
Para substituir a mão de obra escrava libertada para lutar, o Brasil autorizou a vinda de uma classe média de imigrantes que nos poupou 300 anos de formação desta classe e iniciou a marcha para o capitalismo. Como o começo desta transição foi em 1870, ela deve acabar perto de 2070. Estamos na fase final, com o feudalismo lutando para não morrer e o capitalismo começando a ofensiva final.
No feudalismo, o sucesso é determinado pelo nascimento em uma família da elite, com o senhor feudal querendo que a massa de plebeus continue subjugada e pobre para se manter no poder. Já no capitalismo, o sucesso vem com esforço individual, investimento, capacidade de correr riscos e acúmulo de capital. Quem vende um serviço ou produto precisa de consumidores e, portanto, quer que o pobre saia da miséria.
Boa parte das críticas contra a elite brasileira e o funcionalismo público podem ser explicadas pelo conflito entre as éticas capitalista e feudal, que gera uma guerra de narrativas. Só que a vitória do capitalismo ocorreu em 100% dos casos históricos, pois a melhora da qualidade de vida da população impulsiona e é impulsionada pelo capitalismo no longo prazo.
Nas próximas décadas, o capitalismo brasileiro receberá o reforço da reindustrialização com a migração do agronegócio para a agroindústria e a mudança da indústria global de off-shore para near-shore.
O agronegócio tem três fases em todo o mundo. A primeira é a da expansão por terras baratas, o que pode ter retornos decrescentes, já que as terras remanescentes são cada vez piores. A segunda é com o aumento de produtividade com melhor maquinário, sementes e irrigação (fase atual do agronegócio brasileiro). A terceira fase já começa a ocorrer aqui com a vinda da agroindústria, que agrega valor por meio de tecnologia e marca, como a França faz com vinhos e champanhe.
O segundo grande movimento é o da realocação da indústria global da Ásia (off-shore) para países mais próximos do Ocidente (near-shore). A crise da covid-19 reforça a percepção de que as cadeias globais muito longas são vulneráveis e que a busca por custos baixos tem riscos que não eram percebidos.
Isso tem levado muitas indústrias para alguns países da América Latina (Brasil, México e Colômbia), sul da Europa (Espanha, Itália e Portugal) e Leste Europeu (Polônia, Hungria e República Tcheca). Assim, o Brasil poderá absorver algumas indústrias que buscam a redução de riscos, mesmo sem preços de operação tão baixos.
A tentação ao fechar este artigo é a de declarar que “O Brasil é o país do futuro”, mas esta frase já foi muito desgastada. Prefiro usar “só o capitalismo salva”, no sentido de que não é o governo que vai fazer o Brasil se desenvolver, mas o capitalismo feito no dia a dia, com trabalho, estudo, investimento, com riscos calculados, acúmulo de capital ao longo de gerações e construindo um ciclo de uma ética de inclusão. Não acredite que a “salvação” virá de um político qualquer. Somos nós, os cidadãos comuns, que poderemos fazer nosso país prosperar!
*Paulo Vicente dos Santos Alves é professor da Fundação Dom Cabral, doutor em administração pela FGV
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