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O caso do TikTok nos EUA pode ter repercussões no Brasil

Liberdade de expressão, segurança cibernética, criação de conteúdo e tudo que está em jogo no atual confronto entre os Estados Unidos e o aplicativo da chinesa ByteDance

O TikTok se consolidou como uma plataforma onde milhões de usuários expressam opiniões (Hans Lucas / Hans Lucas via AFP) (Photo by MAEVA DESTOMBES/Hans Lucas/Getty Images)

O TikTok se consolidou como uma plataforma onde milhões de usuários expressam opiniões (Hans Lucas / Hans Lucas via AFP) (Photo by MAEVA DESTOMBES/Hans Lucas/Getty Images)

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Publicado em 23 de janeiro de 2025 às 10h00.

Por Fabricio Polido*

O anúncio do banimento do TikTok nos Estados Unidos gerou debates acalorados. A decisão, que entrou em vigor em 19 de janeiro de 2025, determina que a ByteDance, empresa-mãe do aplicativo, venda seus ativos nos EUA ou enfrente os efeitos de um banimento completo. A medida, justificada sob argumentos de segurança nacional, coloca em xeque direitos fundamentais como a liberdade de expressão e gera repercussões que extrapolam as fronteiras dos EUA, inclusive para o Brasil.

A principal justificativa do governo dos EUA para a restrição ao TikTok é a preocupação com a segurança nacional. Alega-se que o aplicativo pode ser usado pelo governo chinês para coletar dados de usuários americanos, explorando padrões de comportamento, localização e preferências. As leis chinesas exigem que empresas do país compartilhem informações com o governo se solicitado, o que alimenta o temor de espionagem. Entretanto, os EUA também possuem mecanismos que obrigam empresas de tecnologia a fornecer dados ao governo, como o Patriot Act, que permite requisições sigilosas para investigações de segurança nacional; a FISA, que autoriza ordens judiciais secretas para coleta de informações; e o PRISM, que revelou o compartilhamento massivo de dados entre gigantes da tecnologia e a Agência de Segurança Nacional (NSA). Essa dualidade coloca em evidência a complexidade do tema e os diferentes pesos aplicados às empresas chinesas e americanas.

Os efeitos sobre liberdade de expressão são outro ponto crítico da medida legislativa

O TikTok se consolidou como uma plataforma onde milhões de usuários expressam opiniões, compartilham conteúdos criativos e promovem discussões políticas. Seu banimento nos EUA pode ser interpretado como censura e um precedente perigoso para outras redes sociais. Embora existam argumentos em favor da proibição, como a necessidade de que a plataforma cumpra as leis americanas, a medida gera questionamentos sobre o real equilíbrio entre segurança jurídica e direitos fundamentais.

Caso a proibição seja mantida, o aplicativo será removido das principais lojas de aplicativos, como Google Play Store e Apple App Store, impossibilitando novos downloads e atualizações. Isso compromete a segurança digital dos usuários, deixando-os vulneráveis a ataques cibernéticos e falhas de software e restrições à atualização. Sem suporte técnico, a experiência do usuário pode ser prejudicada, levando a uma gradual obsolescência do aplicativo.

Criadores de conteúdo também enfrentarão desafios significativos

Muitos construíram suas carreiras e geram receita substancial por meio da plataforma, seja com parcerias de marca, publicidade ou vendas diretas. O banimento pode impactar diretamente suas fontes de renda e forçá-los a migrar para outras plataformas, o que envolve custos, mudanças estratégicas e possíveis perdas de audiência. Cada rede social tem algoritmos e dinâmicas próprias, dificultando a adaptação e manutenção do mesmo nível de engajamento.

No Brasil, os efeitos podem ser sentidos de diversas formas

Empresas que utilizam o TikTok para campanhas publicitárias e parcerias internacionais podem ter dificuldades em alcançar o público americano. A ausência da plataforma nos EUA pode reduzir o alcance global de estratégias de marketing digital e afetar a performance comercial de marcas brasileiras. Além disso, o Brasil pode se inspirar no caso americano para reforçar sua regulamentação sobre o uso e a proteção de dados. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) já estabelece diretrizes para a privacidade digital, mas o governo pode adotar medidas adicionais para garantir maior controle sobre as plataformas de redes sociais. Isso poderia resultar em exigências mais rigorosas para empresas que operam no país e em mudanças nas regras de coleta e processamento de dados.

Para criadores de conteúdo brasileiros, a restrição ao TikTok nos EUA pode significar perdas financeiras consideráveis. Influenciadores com grande audiência na plataforma podem ver sua visibilidade reduzida, o que implicaria diretamente na redução de oportunidades de contratos publicitários e monetização. Essa alteração pode afetar não apenas os indivíduos, mas o próprio ecossistema digital e a economia criativa, que tem se mostrado uma força relevante na geração de empregos e renda.

Nos EUA, a solução jurídica mais debatida para evitar o banimento seria a venda das operações do TikTok para uma empresa americana ou um consórcio de investidores. Outra solução seria política, mas ainda incerta com a atuação direta do presidente eleito, Donald Trump, após sua posse em 20 de janeiro.  Essas alternativas poderiam mitigar preocupações de segurança e permitir que o aplicativo continue operando no país. No entanto, uma mudança desse porte envolve desafios muito mais profundos. Questões como transferência de dados, direitos de propriedade intelectual e contratos existentes precisam ser cuidadosamente negociadas a partir da implementação de uma decisão de banimento do aplicativo. Por outro lado, a venda do negócio precisaria passar pelo crivo de órgãos regulatórios, o que pode levar tempo e gerar incertezas.

Outro ponto a ser considerado é o impacto do banimento do TikTok no mercado de tecnologia 

O banimento ou venda forçada do TikTok pode alterar a dinâmica competitiva entre plataformas de mídia social, favorecendo concorrentes diretos, como Instagram e YouTube Shorts, ou a entrada de outros agentes chineses desconhecidos do público nos EUA. Empresas de tecnologia e investidores acompanham atentamente os desdobramentos do caso, já que um precedente desse tipo pode influenciar futuras decisões governamentais sobre regulação de plataformas digitais.

Por fim, há implicações no mercado de trabalho. O TikTok conta com milhares de funcionários nos EUA, e uma eventual retirada de operações da empresa poderia resultar em demissões e reestruturações significativas. Pode haver alguma turbulência nos mercados digitais, desde o segmento de anunciantes até o de desenvolvedores de conteúdo.

A situação do banimento do TikTok nos EUA ilustra um embate mais amplo entre política, tecnologia e economia digital. O desfecho desse caso terá repercussões globais e poderá influenciar a forma como governos ao redor do mundo lidam com a regulamentação de plataformas digitais, proteção de dados e questões de segurança nacional. No Brasil, a tendência é que os debates sobre segurança cibernética, concorrência nos mercados e governança digital ganhem ainda mais relevância, levando a possíveis ajustes regulatórios e mudanças na dinâmica institucional e comportamento dos agentes e plataformas atuantes no país. Resta aguardarmos os desdobramentos da decisão da Suprema Corte e o que virá com a posse de Donald Trump.

*Fabricio Polido é sócio do L.O. Baptista, professor associado de Direito Internacional, Direito Comparado e Novas Tecnologias da UFMG.

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