Setor contribui com 2% das emissões globais de gases de efeito estufa (Getty Images/Getty Images)
Bússola
Publicado em 21 de novembro de 2022 às 19h15.
As preocupações com as mudanças climáticas têm mobilizado esforços da sociedade, indústrias e governos na revisão dos hábitos de consumo, de processos produtivos e na construção de políticas públicas para mitigar as emissões de gases de efeito estufa (GEE) que provocam aumento da temperatura global. O último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) aponta para uma situação crítica, que certamente demandará compromissos ainda mais ambiciosos de redução das emissões.
Por outro lado, a 27ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas, a COP27, realizada neste novembro, no Egito, ocorre em contexto especialmente desafiador para as discussões multilaterais.
O escalonamento das tensões no cenário geopolítico internacional expôs a necessidade de reestruturação das cadeias de suprimento globais, em virtude da crise de abastecimento de energia e alimentos. Este cenário provocou uma mudança no foco das agendas econômicas, que somados à transição nas lideranças políticas de alguns países, incluindo o Brasil, reforça ainda mais a importância do engajamento da iniciativa privada neste processo de transformação.
Setores industriais eletrointensivos como o alumínio vêm investindo em iniciativas para impulsionar, ao mesmo tempo, a redução das emissões setoriais, e a reinserção do país na cadeia global, uma vez que os esforços em descarbonização também se convertem em vantagem competitiva.
A Associação Brasileira do Alumínio (Abal) produziu um estudo que mostra que o setor do alumínio no Brasil já atua com intensidade carbônica significativamente inferior à média mundial. Estima-se que as emissões do berço ao portão (craddle-to-gate) – que considera da extração da bauxita à fabricação do alumínio brasileiro – fiquem entre 2,75 e 3,5 tCO₂e/ton, enquanto a média mundial varia de 9,7 a 11,7 tCO₂e/ton. Ou seja, 3,3 vezes menor que a média global.
De acordo com estudo do Instituto Internacional do Alumínio (sigla em inglês, IAI), o setor contribui com aproximadamente 2% das emissões globais de GEE, o equivalente a cerca de 1,1 bilhões de toneladas de dióxido de carbono. Desse total, mais de 60% das emissões estão associadas às emissões indiretas atribuídas ao consumo de energia. Portanto, é na transição energética onde estão os maiores desafios e oportunidades para o setor. A China, por exemplo, tem sua produção fortemente dependente do consumo de energia a carvão (mais de 80%).
Enquanto, no Brasil, devido aos investimentos realizados pelas empresas que atuam no setor na diversificação da matriz energética utilizada para produção do metal, a partir de fontes limpas e renováveis (mais de 80%), a intensidade média de emissões correspondente apenas à etapa de produção do alumínio primário gravita entre 4,5 e 6,5 tCO₂e/ton, contra 16 tCO₂e/ton da média mundial.
Sabemos que a descarbonização do setor exigirá mais do que a transição para energias renováveis. É preciso também endereçar soluções para cerca de 30 a 35% das emissões diretas. E as tecnologias que permitirão à indústria mitigar essas emissões setoriais já estão em desenvolvimento.
Considerando nível de prontidão tecnológica e os custos de implementação, as soluções mais promissoras estão relacionadas ao consumo de ânodos de carbono durante fundição de alumínio, com emprego de processos que garantam maior controle, predição e até a supressão da ocorrência dos efeitos anódicos. Também estão em curso ações para substituição de combustíveis fósseis na geração de energia térmica empregada na alimentação de processos produtivos que requerem alta temperatura. É o caso da utilização de biomassa na operação das caldeiras das refinarias de alumina.
O terceiro caminho para a descarbonização do setor abrange ainda medidas de promoção da circularidade de materiais e uso eficiente de recursos. Trata-se de iniciativas voltadas para a redução de perdas em processo de fabricação, projetação de produtos de uso final com maior durabilidade, longevidade e leveza (ecodesign), mudança dos padrões de consumo de embalagens de uso único a multiuso, além da incorporação de melhorias na gestão de resíduos e dos sistemas de coleta e reciclagem.
Como resultado, os índices de recuperação de sucata de alumínio no Brasil figuram entre os maiores do mundo. Do total de alumínio consumido no país, mais da metade – 54,7% – vem da reciclagem, enquanto a média mundial não chega a 30%.
Com destaque também para o recorde histórico na reciclagem de latas para bebidas, que no último ano alcançou a marca de 98,7%. Esse desempenho se deve, em grande parte, aos investimentos da indústria na modernização e ampliação dos centros de coleta e reciclagem, aliados ao estabelecimento de uma política de logística reversa que articula esforços de toda a cadeia de suprimento.
Além dos atributos intrínsecos do metal, o emprego das melhores práticas de gestão ambiental, social e de governança das empresas que atuam no setor fazem com que o alumínio brasileiro seja considerado um aliado estratégico para o cumprimento das metas de descarbonização de seus principais mercados consumidores. Pois é o material que proporciona melhor circularidade ao segmento
de embalagens e que permite a fabricação de veículos mais leves e menos poluidores. Sua aplicação na construção civil confere maior eficiência energética às edificações verdes e seu uso no setor elétrico permite a expansão dos sistemas de geração, transmissão e distribuição de energia com menor impacto ambiental.
Hoje o Brasil já produz alumínio de baixa intensidade carbônica, com ações em curso para diminuir ainda mais as emissões setoriais. Embora não exista uma solução única para resolver todos os problemas relacionados com as emissões setoriais, é o compartilhamento dos desafios que pavimenta o caminho para a ação colaborativa. Por esta razão, o setor assinou, em maio deste ano, um Protocolo de Cooperação Técnica com o Ministério do Meio Ambiente (MMA) para apoiar com estudos técnicos e diagnósticos, a elaboração de um Plano Setorial de Mitigação.
O momento é propício à articulação de atores e à repactuação de objetivos de médio e longo prazo, em torno de uma trajetória consistente de ação climática em várias frentes. O desafio está na transformação dessas qualidades em fator de competitividade. A criação de um ambiente regulatório favorável aos investimentos é essencial para impulsionar o desenvolvimento e a escala de tecnologias que permitirá a indústria alcance do zero líquido até 2050.
Para isso, precisamos avançar em discussões sobre o estabelecimento de regras claras e transparentes para contabilização e reporte das emissões, dos instrumentos de incentivo ao investimento em P&D, e na implementação de um mercado regulado de carbono, com mecanismos de precificação. E sobretudo, precisamos desenvolver políticas públicas que a assegurem tratamento isonômico aos produtos nacionais e importados, para evitar a fuga de emissões e desvios de comércio que prejudiquem a competitividade da indústria nacional.
*Janaina Donas é presidente-executiva da Associação Brasileira do Alumínio (Abal)
Este artigo é uma publicação conjunta entre Bússola e Indústria Verde
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