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Investidores vão à luta por melhores dados de ESG

Donos e gestores de ativos estão enfrentando o problema das métricas e mudam estratégia para adoção de recursos, diz pesquisa global

Questões relacionadas aos dados são os principais impedimentos para a integração de ESG (Thithawat_s/Getty Images)

Questões relacionadas aos dados são os principais impedimentos para a integração de ESG (Thithawat_s/Getty Images)

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Publicado em 23 de setembro de 2021 às 15h31.

Por Renato Krausz*

Grandes investidores nos principais mercados do mundo estão suando a camisa e se virando para encontrar dados mais certeiros de ESG, antes de decidir onde alocar os seus tostões.

Eles estão usando e comparando várias fontes de dados (74% deles dizem fazer isso), conduzindo pesquisas internas próprias (41%) e implementando controles avançados de qualidade de dados (28%), entre outras medidas.

Não é para menos. O montante de recursos destinados a investimentos ESG galga montanhas, enquanto a acurácia das métricas desfalece em morrinhos, numa evolução muito mais lenta.

Na América do Norte, Europa e Ásia, 22% dos grandes investidores já direcionam 75% ou mais do total de recursos a aplicações que integram os aspectos ambientais, sociais e de governança. Em 2019, não havia nem unzinho sequer com tamanho afinco nisso. Hoje, 13% já incorporaram o ESG em 100% do seu portfólio. Mais de um quinto (21%) afirma que o ESG é uma necessidade central em seus negócios, contra menos da metade (10%) que manifestava a mesma coisa dois anos atrás.

Daí a necessidade de informações cada vez mais precisas. Um percentual expressivo de investidores (59%) cita essas questões relacionadas aos dados como o principal impedimento para a integração do ESG. Em 2019, o número era um pouco maior, de 66%. As barreiras incluem dados inconsistentes e até mesmo classificações conflitantes.

Tudo isso está na mais recente pesquisa global feita pelo BNP Paribas sobre ESG, a terceira desde 2017. A nova edição foi divulgada agora e tem muitos outros achados interessantes. O estudo aponta que o desafio maior está na letra S. O pilar social do ESG é de longe o mais difícil de analisar e integrar. Existe uma falta crônica de padronização nas métricas sociais.

Sua importância, contudo, vem crescendo. Quando questionados sobre quais ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) eles observam na hora de investir, 56% dos entrevistados citaram objetivos relacionados aos direitos humanos. Os ligados ao clima e ao meio ambiente foram mencionados por 89%.

Isso de fato é uma novidade. Em levantamento feito em junho último sobre todos os 758 ETFs então existentes no mundo com características ESG, a consultoria francesa TrackInsight constatou que 195 deles estavam alinhados ao ODS 13 — ação contra mudanças climáticas — e nenhum ao ODS 1 — erradicação da pobreza (leia aqui).

Do ponto de vista das empresas a coisa não é fácil mesmo. Para muita gente, o altruísmo corporativo é um paradoxo. Na opinião dessas pessoas, uma organização que se lança na empreitada de dar cabo à miséria ou coisa semelhante precisa necessariamente contrariar sua própria essência. Não digo que eu concorde 100%, mas algum fundamento há. Entendo também quando dizem que o melhor que uma empresa pode fazer neste sentido é gerar empregos e pagar salários dignos.

Seja lá como for, o interesse dos investidores está mudando e apontado para essa direção. E da sociedade também. Também está passando por mudança a escolha da melhor estratégia de investimento ESG. Só para lembrar, existem seis estratégias principais:

1) Filtro negativo, que exclui determinadas empresas ou setores;

2) Engajamento acionário, que aposta no diálogo contínuo com as empresas investidas e no uso de mecanismos como o voto ou a presença em conselhos;

3) Investimento temático, que consiste em alocar recursos em temas específicos e sustentáveis, como energia renovável e saneamento;

4) Integração ESG, que usa dados de ESG na análise financeira das opções de investimento;

5) Melhor da categoria, que escolhe a melhor empresa que se destaca nos aspectos ESG entre seus pares de um mesmo setor; e

6) Investimento de impacto, que aloca recursos em empresas que têm a intenção de resolver um problema social ou ambiental, com retorno financeiro.

Pois bem, a pesquisa do BNP Paribas revelou que, pela primeira vez, o critério do filtro negativo deixou de ser o principal. Na pesquisa de 2019, ele liderava. Agora, 75% dos investidores afirmam usar a integração ESG. O engajamento com a empresa para influenciar a tomada de decisões mais sustentáveis também cresceu muito: 61% dos entrevistados dizem adotar essa estratégia. E o filtro negativo caiu para terceiro lugar, com 56%. Logo depois aparece o investimento temático, com 38%.

Para terminar, mudou também o principal drive que norteia as decisões dos investidores. Em 2019, em primeiro lugar ficou a vontade de obter melhores retornos no longo prazo. Em 2021, isso também caiu para a terceira posição. Em segundo lugar apareceram as exigências dos stakeholders externos. E, em primeiro, adivinhem!

Deu reputação. Se os donos e gestores de ativos estão preocupados com a deles na hora de montar seu portfólio, está mais do que na hora de as empresas, todas elas, começarem a olhar para isso com o dobro de atenção.

Não há mais tempo a perder. A transição para um mundo mais justo e sustentável é o desafio mais urgente que temos pela frente — e por trás e por todos os lados. Quem não embarcar ficará com o filme queimado, possivelmente de forma irremediável.

*Renato Krausz é sócio-diretor da Loures Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.

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