É preciso revogar a Lei 13415/2017 para sairmos da estaca zero (Leandro Fonseca/Exame)
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Publicado em 13 de abril de 2023 às 21h00.
Última atualização em 14 de abril de 2023 às 08h52.
Por Gilberto Alvarez*
Deu a lógica: após 5 anos de muitas idas e vindas, voltamos a 5 anos atrás: época da aprovação da Lei 13415/2017 que versa sobre a reforma do Ensino Médio, encaminhada pelo governo Michel temer em 2017 e aprovada aos atropelos pelo Congresso Nacional.
Neste momento, os principais protagonistas da educação, a começar dos mais óbvios: os professores e estudantes, viram através da eleição do Presidente Luis Inácio Lula Da Silva, a possibilidade de discutirmos novamente o Ensino Médio, através de modificações ou até mesmo propondo a revogação da Lei.
Importante frisarmos que a proposta de uma reforma estrutural na etapa final da educação básica não pode e não deve ser imposta autoritariamente como foi durante o Governo Michel Temer, sem nenhuma discussão.
Portanto, a primeira coisa a se considerar é que o debate deve ser feito democraticamente, através de audiências públicas e com todos os protagonistas presentes, e sem o tal peso de cronogramas apertados ou argumentos vazios dizendo que não podemos voltar para trás.
É desnecessário reafirmar que o ensino médio, de fato, carece de reformas estruturais, considerando as questões historicamente não resolvidas e que têm penalizado a juventude com a oferta de um ensino médio sempre aquém das expectativas e necessidades.
Porém, a Reforma aprovada passou ao largo de questões que há décadas cobram alternativas concretas. Sequer foram levados em conta os argumentos daqueles que pesquisam o ensino médio desde a década de 1980, especialmente no universo dos programas de pós-graduação em educação que, no Brasil, têm reconhecido nível de excelência.
Tal como ocorreu nos tempos da ditadura, o que foi implementado propôs o fatiamento do currículo, agora com cinco ênfases ou itinerários formativos. Parece uma oportunidade de diversificar a formação, mas, na prática, essa estrutura significa negar um dos maiores ganhos da LDB 394-1996, que tomou por ponto de partida o direito universal a uma formação básica comum, evitando um processo de escolarização que segregasse pessoas em opções de profissionalização.
A reforma desorganizou a já precária oferta básica de conteúdos e faz com que o próprio Estado passe a induzir desigualdades de oportunidades educacionais. Coube às redes de ensino a decisão final de decidir quais itinerários de formação poderão ser cursados conforme suas “reais possibilidades”, ficou evidente que em locais com maior precariedade as opções foram também as mais precárias do que locais com maiores possibilidades de escolha.
A aventura relacionada à jornada de tempo integral virou um fetiche. Panaceia para todos os males, a escola em tempo integral foi vista em vários Estados como dinâmica para retirar jovens das ruas. Todavia, sem investimentos permanentes, tal iniciativa tornou ainda mais precária a oferta, porque aumentou a evasão dos que têm que trabalhar e gera desequilíbrio em relação ao aluno do ensino noturno, transformado em “peso” por essa reforma.
A decisão absolutamente equivocada feita por algumas redes de ensino e escolas de retirar a obrigatoriedade de disciplinas como Filosofia, Sociologia, Artes e Educação Física é um golpe na essência da LDB que propõe sempre diversificar garantindo mais acesso (e não menos) à formação crítica no âmbito da argumentação científica, ética e estética.
Uma das bandeiras mais respeitadas dos educadores brasileiros é a luta para que as reorganizações curriculares sempre respeitem diferenças e mantenham a garantia de formação básica comum, sem reinventar hierarquias de qualquer espécie.
Essas hierarquizações reaparecem à medida que se retoma uma especialização precoce e se institucionalizam diferenças entre os que podem cursar um ensino médio mais “equipado” e os que podem cursar “aquilo que é possível”.
É uma Reforma que se notabilizou não somente pelo que propõe, mas também pelo que esvazia. Nesse sentido, o ensino médio noturno foi bastante esvaziado, inclusive com a distinção de recursos para as escolas com maior tempo de atividade durante o dia, relegando ao aluno da noite as sobras de tempo e de recursos.
Os princípios da Constituição de 1988 e da LDB de 1996 garantem que ao Estado é vedado oferecer educação diferenciada para diferentes estratos sociais, Esses princípios foram desrespeitados, especificamente para o estudante pobre.
O único caminho possível é voltarmos à estaca zero: É preciso revogar a Lei 13415/2017. Devemos nos lembrar do intenso debate que tivemos, através de várias consultas, debates e audiências públicas, e que culminaram na aprovação do Plano Nacional de Educação. Serão pelos mecanismos de diálogo, debate e através de um novo pacto federativo, que reformaremos o Ensino Médio
*Gilberto Alvarez é Diretor do Cursinho da Poli e presidente da Fundação PoliSaber.
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