A desinformação e a disseminação de informações falsas representam a principal ameaça de curto prazo para o planeta (Divulgação/Getty Images)
Head da Beon - Colunista Bússola
Publicado em 9 de abril de 2025 às 13h00.
Sustentabilidade como prática exige mudanças profundas. Conforme o entendimento clássico (definido pelo relatório “Nosso Futuro Comum”), desenvolvimento sustentável é “atender as necessidades do presente sem comprometer a capacidade de as gerações futuras atenderem suas próprias necessidades”. Essa definição, tão conhecida quanto pouco entendida em sua essência, nos obriga a repensar como fazemos quase todas as coisas. Isso porque o atual modelo econômico e de produção de riqueza tem gerado impactos ambientais, sociais e culturais cuja regeneração será decisiva para o presente e futuro.
Se pensarmos em comportamento, há ao menos dois caminhos clássicos para promover transformações significativas. O primeiro é a via da imposição, por meio de regras restritivas, fiscalização rigorosa e punição para quem não cumpre. Contudo, esse método tende a ser custoso e, eventualmente, a desencadear efeitos colaterais indesejados – sobretudo em democracias, que prezam pela liberdade individual. Já o segundo caminho é o da mudança de percepção, valores e cultura, que se baseia na construção de uma forma de pensar alinhada a determinados princípios, como preservação, equidade, visão de longo prazo e responsabilidade compartilhada. Esse percurso, embora exija mais tempo e esforço, costuma produzir impactos mais profundos e duradouros, pois atinge o cerne de como as pessoas tomam decisões.
Vivemos uma era marcada pela hiperconectividade, ativismo digital e cobrança crescente por transparência. Nesse ambiente, a comunicação se torna o ponto de partida para toda e qualquer mudança, na medida em que a nossa percepção de mundo depende da qualidade das informações, análises e narrativas que recebemos. Quando o Fórum Econômico Mundial aponta, em duas edições consecutivas de seu relatório de riscos globais, que a desinformação e a disseminação de informações falsas representam a principal ameaça de curto prazo para o planeta, o alerta é claro: falsas narrativas não apenas nos confundem, mas também abalam a confiança nas instituições e enfraquecem nossa capacidade de encarar coletivamente os grandes desafios contemporâneos.
Essa turbulência informativa se agrava por um fator cultural que poderíamos chamar de “medo da verdade” ou de “preguiça com problemas difíceis”. Em meio a uma obsessão por respostas rápidas e simplistas, passamos a enxergar o mundo de maneira excessivamente cartesiana, como se houvesse uma relação de causa e efeito direta e inequívoca para cada situação. Porém, a realidade é interdependente, repleta de nuances e contradições. Para lidar com tal complexidade, precisamos estar dispostos a aceitar que muitas vezes não haverá uma solução fácil – e que a verdade pode ser desconfortável, pois exige revisar crenças e encarar as próprias responsabilidades.
Essa predisposição a buscar atalhos imediatistas e a fugir do debate mais profundo cria um terreno fértil para a manipulação. Onde há curiosidade superficial, há espaço para que inverdades e distorções prosperem. Desinformação e medo da verdade se alimentam mutuamente, reduzindo a qualidade das decisões coletivas e afetando áreas centrais, como as políticas públicas, a economia global e a preservação do planeta.
É nesse contexto que surge a necessidade de uma agenda da verdade para a sustentabilidade. Nesta etapa que poderemos chamar de “Era da Verdade”, não há espaço para projeções artificiais de reputação. Se a sabedoria popular assegura que a mentira tem perna curta, no campo da sustentabilidade não seria diferente: greenwashing é cada vez mais identificado e penalizado pela opinião pública. Nesse sentido, o jornalismo de qualidade exerce um papel essencial no desenvolvimento sustentável, pois amplia a consciência coletiva, incentiva o debate bem-informado e denuncia contradições.
No entanto, a cobertura jornalística corre o risco de cair na mesma armadilha que afeta a mentalidade de muitos gestores e investidores: a busca por métricas fáceis ou imediatas, como palavras-chave que funcionam bem nos motores de busca. É fundamental avançar e criar espaços – editorias, seções, colunas – dedicados aos diversos aspectos dessa agenda, produzidos por profissionais capacitados e orientados a temas técnicos e reais. Isso alimenta a profundidade das discussões, evita superficialidades e reduz a lacuna entre o que se discute na mídia e o que efetivamente acontece nas organizações.
Como já dizia Henry Louis Mencken, “para cada problema complexo existe uma solução simples, elegante e completamente errada”. Para os desafios da sustentabilidade, isso nunca foi tão verdadeiro. Ignorar a complexidade é alimentar uma visão incompleta do mundo, e a consequência é a multiplicação de “soluções enganosas” que parecem resolver algo mas, na prática, só agravam a situação no longo prazo.
É hora, portanto, de encarar a tarefa de refletir e comunicar de forma profunda e ampla, abandonando a tentação de respostas simplórias. Afinal, a conquista do desenvolvimento sustentável depende de um tecido social mais bem informado, que compreenda a natureza sistêmica dos desafios e as sinergias possíveis para enfrentá-los.
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