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Everardo Gueiros: Até quando... Constituição Cidadã?

A Constituição Federal de 1980 deu a medida dos direitos e deveres dos políticos e cidadãos

Mudanças no Fundo Constitucional podem decretar falência do modelo republicano (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

Mudanças no Fundo Constitucional podem decretar falência do modelo republicano (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

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Publicado em 16 de junho de 2023 às 20h00.

Última atualização em 16 de junho de 2023 às 20h07.

Por Everardo Gueiros*

Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência? Por quanto tempo ainda há de zombar de nós a tua loucura? A que extremos se há de precipitar a tua audácia desenfreada? (…) Nem os temores do povo, nem a confluência dos homens honestos, neste local protegido do Senado, nem a expressão do voto destas pessoas, nada consegue te perturbar? Não percebes que teus planos foram descobertos?

Frases proféticas cunhadas há mais de 2.000 anos, nas catilinárias, pelo senador, jurista, escritor e orador romano Marco Túlio Cícero nos servem de farol para iluminar os semblantes de tantos Catilinas que surgem aos borbotões em nossa sofrida Pátria atualmente.

Nossa Constituição Federal de 1988, escrita após anos de autoritarismo militar e com esforço de redemocratizar nosso país, nos deu a exata medida dos direitos e dos deveres dos entes políticos e dos cidadãos.

Nesta semana, em manobra vergonhosa, foi apresentada proposta para modificar norma insculpida no inciso XIV, artigo 21 da Constituição Federal de 1988 e regulamentada pela Lei nº 10.633/2002 que disciplina o propalado Fundo Constitucional. 

O necessário Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) tem por atribuição legal prover os recursos necessários a criação, manutenção e organização das polícias Civil e Militar, além do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal.

Objetiva também prestar assistência financeira para execução de serviços públicos de saúde e educação do Distrito Federal, ou seja, é responsável por arcar com a maior parte das despesas da segurança, saúde e educação do Distrito Federal.

O DF, como comezinho, é uma unidade da federação que não pode ser classificado como Estado ou Município individualmente. Na verdade, possui competência legislativa dúplice, fazendo as vezes das duas entidades federativas em uma.

Os estados são regidos por constituições estaduais, enquanto os municípios por leis orgânicas. Como o DF reúne competências de estado e município, não pode ser dividido. Por isso, Brasília e as outras 34 regiões administrativas são administradas pelo governo do Distrito Federal.

Nada obstante, hospeda ainda a Capital Federal do Brasil, a maior parte dos órgãos da União, todo o Poder Legislativo Federal (Câmara dos Deputados e Senado Federal), todos os órgãos do Poder Judiciário Federal (STF, STJ, TST, TSE, TCU e STM), além de mais de 200 organismos internacionais, representações estrangeiras (embaixadas e consulados) e órgãos internacionais.

Não são poucas as responsabilidades que advém desse arcabouço de obrigações, não se apresentando razoável, jurídico ou viável a mudança nas regras de repasses do Fundo Constitucional ao DF.

Tais mudanças, se levadas a efeito, podem decretar a verdadeira falência do modelo republicano atual. Isso porque, em nosso pacto federativo, há que existir equilíbrio entre direitos e obrigações para os entes federados.

Com um forte componente democrático, o federalismo foi adotado no Brasil desde a primeira Constituição Brasileira da República em 1889, e nada mais é que uma maneira de partilhar, num determinado território, o poder do Estado.

Por definição própria e já devidamente reafirmado pelo STF, à federação atrai aos entes federados autonomia, mas também responsabilidades e competências solidárias a exemplo da assistência à saúde, preservação do meio ambiente e erradicação da pobreza.

Argumentos pueris de ajuste de contas de um ente federado às expensas de outro não podem prevalecer no mundo do direito, muito menos obrigações coletivas impostas a uma só parte.

Se o cobertor é curto e descobre a cabeça ao cobrir os pés, que cada ente cumpra seu dever, controlando suas despesas e respeitando a Lei posta. Mudança de regras no meio do jogo, certamente conduzem a um final melancólico da partida.

A par disso, não é legal, legítimo ou justo não só PUNIR o Distrito Federal com a restrição de acesso a verba imposta CONSTITUCIONALMENTE, mas propriamente RASGAR mais um grande pedaço de nossa Constituição Cidadã.

Até quando suportarás?

*Everardo Gueiros é advogado

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