Indicadores relacionados ao processo são tão importantes quanto os relacionados ao propósito da companhia (Roman Synkevych/Divulgação)
Bússola
Publicado em 12 de abril de 2022 às 09h00.
Por Danilo Maeda*
O crescimento do interesse por aspectos ESG trouxe à tona um debate relevante, que até então estava restrito às rodas especializadas. Em resumo, o dilema é saber se empresas de setores controversos podem ser consideradas sustentáveis. A questão é mais complexa do que parece e levanta outras perguntas:
A boa gestão de aspectos ESG (que dão conta dos processos e relações pelos quais organizações geram valor) são suficientes para neutralizar os impactos de produtos ou serviços que, por sua própria natureza, causam danos à sociedade ou ao meio ambiente? E organizações cujos produtos são benéficos, mas não possuem boas práticas e por isso geram efeitos colaterais negativos? Quem define o que são impactos positivos, negativos e produtos benéficos ou danosos?
Em suas cartas anuais, o presidente do Conselho de Administração e diretor executivo da BlackRock, Larry Fink, tem expressado que tanto o fim quanto o meio são fundamentais. “Propósito é o motor da lucratividade a longo prazo [...] transparência será um fator persistentemente importante para a capacidade de empresas atraírem capital”.
Na visão pragmática do executivo, não se trata de conciliar geração de riqueza com sustentabilidade e gestão de impactos socioambientais, mas sim de compreender que a lucratividade de longo prazo depende do senso de direção expresso em um propósito claro e de uma execução cuidadosa, que reconhece o engajamento de stakeholders como fator central para o sucesso
Em outras palavras, poderíamos dizer que é impossível ser sustentável sem um produto/serviço que adicione valor à sociedade e ao planeta, mas é possível ter tais soluções e mesmo assim não ser sustentável. O problema é que nem sempre os mecanismos de avaliação capturam essas nuances.
Quando se concentram excessivamente nos meios (práticas e processos), correm o risco de premiar organizações cuja natureza do produto é contrária ao objetivo da ferramenta. Quando decide-se meramente excluir segmentos “sujos”, novamente o resultado pode ser contraproducente, pois tais organizações deixariam de ter incentivos para gerenciar melhor suas externalidades — potenciais consequências ou efeitos colaterais que normalmente não são contabilizados, mas que podem afetar a sociedade.
Para se chegar a mecanismos de avaliação que ajudem a responder se determinada organização é de fato sustentável, será preciso conciliar ambas abordagens e trazer a materialidade para o centro. Conciliar e somar, com ponderação para o que for mais relevante em cada setor, avaliações sobre diferentes tipos de impacto (como os que ocorrem na cadeia de valor, no ciclo de vida dos produtos e serviços e dentro da organização) e sobre práticas de gestão. Nesse sentido, indicadores relacionados ao processo são tão importantes quanto os relacionados ao propósito da companhia.
Semana passada, escrevi sobre como o ESG é insuficiente para promover a sustentabilidade de forma sistêmica. O raciocínio se aplica ao nível organizacional: não basta reconhecer que propósito é fundamental e que externalidades existem. É preciso gerenciá-las.
*Danilo Maeda é head da Beon, consultoria de ESG do grupo FSB
Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a Exame. O texto não reflete necessariamente a opinião da Exame.
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