Governança e engajamento de stakeholders adicionam valor (Luis Alvarez/Getty Images)
Bússola
Publicado em 9 de agosto de 2022 às 10h14.
Por Danilo Maeda
É natural que durante o processo de consolidação de uma nova tendência ou tecnologia transformadora parte das pessoas reaja em negação. Houve quem criticasse os computadores com interfaces gráficas, houve especialistas que desprezaram o risco de a transformação digital tornar determinadas indústrias obsoletas e há quem diga que “ESG é um esquema”. Em comum, tais avaliações denotam uma mistura de autoconfiança excessiva com má informação ou análise enviesada.
No caso da sustentabilidade, esse comportamento se expressa em argumentos céticos em relação à conexão entre boas práticas ESG e geração de valor financeiro, que é o propósito maior das empresas, ao menos na ótica da economia de mercado. É importante salientar que de fato há críticas válidas às ferramentas atualmente disponíveis para avaliar empresas em relação a suas práticas ambientais, sociais e de governança.
No caso, tais críticas ganharam tanta relevância que foram para a capa da principal publicação de negócios do mundo, a The Economist. Além das controvérsias em relação aos setores que podem ou não ser elegíveis a rankings e carteiras ESG, há questionamentos sobre a validade dos critérios de avaliação e indicadores utilizados para medir desempenho em temas ambientais, sociais e de governança.
E este é um aspecto no qual as ferramentas de avaliação atual podem evoluir. Atualmente, a variedade de critérios (e de pesos atribuídos a eles) gera mecanismos muito distintos entre si, produzindo resultados pouco comparáveis e por vezes manipuláveis – por medirem indicadores que não refletem exatamente o resultado que se deseja produzir. Ou seja, medimos muita coisa, mas nem sempre sabemos o motivo para fazer tais medições.
Esse é o ponto em que as ferramentas podem avançar. Diferentemente do que propõe a bíblia do mercado, a melhor solução para problemas complexos não é ignorar as partes difíceis e focar apenas no que já é mensurável – no caso, focar em mudanças climáticas e esquecer do restante. Afinal, apesar de relevante e urgente, esse está longe de ser o único desafio dos negócios em termos de sustentabilidade
Se ignorar as partes mais difíceis do problema não faz com que elas desapareçam, como melhorar? O primeiro passo é entender que em sustentabilidade o processo é tão (ou mais) importante do que as métricas. Antes de acompanhar o desempenho em uma lista pré-determinada de indicadores, é preciso refletir sobre quais aspectos representam riscos, oportunidades ou impactos importantes no modelo de negócios e cadeia de valor de cada organização ou setor.
Na ótica da gestão empresarial, uma boa estratégia ESG é sinônimo de gestão de riscos e oportunidades com visão de longo prazo. Por isso, tudo deveria começar com uma avaliação completa sobre tendências ambientais, sociais e econômicas, sobre expectativas e demandas de stakeholders e sobre impactos do e no negócio. Estratégias ESG que adicionam valor real à empresa e seus stakeholders precisam de foco e senso de direção, expressos em uma boa avaliação de materialidade.
Se estiver claro para a empresa como os temas mais relevantes se relacionam com sua capacidade de geração de valor ou com a gestão de riscos que podem impactar seu modelo de negócios, a tese de investimento ESG tende a ser melhor compreendida pelo mercado que por sua vez precisa fazer a lição de casa e aprofundar seu entendimento do tema para além de mecanismos que não capturam a complexidade do mundo real.
Soma-se a isso uma série de boas práticas ligadas à gestão da sustentabilidade, que são fundamentais para que se caminhe na direção correta. Transparência, governança e engajamento de stakeholders são práticas que adicionam valor e viabilizam a entrega das promessas feitas na estratégia.
Depois dessas avaliações é que poderíamos então explorar e analisar o desempenho naqueles temas mais relevantes, considerando o potencial de impacto deles no negócio (com a ótica da capacidade de geração de valor financeiro) e nos stakeholders (com ótica da gestão de riscos e geração de valor compartilhado).
O resultado deverá ser mecanismos de avaliação um pouco mais complexos, mas muito mais completos em relação ao seu objetivo: medir a capacidade de cada empresa continuar gerando valor no longo prazo, a partir de uma avaliação abrangente sobre riscos e oportunidades relacionados ao negócio, à sociedade e ao meio ambiente nos quais a organização atua.
*Danilo Maeda é head da Beon, consultoria de ESG do Grupo FSB
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