(Porto Seguro/Divulgação)
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Publicado em 15 de outubro de 2024 às 15h00.
Por Marcos Bitelli*
No seminário “Educação para o futuro”, do LIDE, debatemos com grandes autoridades no tema, os velhos e novos problemas da educação básica no Brasil. Na coexistência entre instituições públicas e privadas de ensino, o ensino público de qualidade é importante para elevar a régua da educação privada, criando uma espiral positiva.
Fomos da monarquia à república, passamos por revoluções, guerras, ditaduras, redemocratização, crises econômicas, pandemia, novas tecnologias e incontáveis mudanças nas diretrizes da educação.
As escolas são um microcosmo da sociedade e nosso Colégio tem características múltiplas:
Isso nos permite ter uma boa leitura do espectro de alunos e por consequência de suas famílias.
Tendo uma escola no interior, em Valinhos, ainda visualizamos as diferenças nas expectativas de quem vive no interior e de quem vive na capital de São Paulo. Em quatro endereços temos nove tipos de operações diferentes, o que exige elevada organização, capacitação de professores, psicólogos, assistentes de ensino, pessoal de gestão e administração.
Quando comecei a me aproximar da educação, há 20 anos, trabalho que exerço pro bono na Fundação que mantém nosso Colégio, os grandes debates eram as correntes pedagógicas e os resultados nos vestibulares.
Discutia-se o construtivismo e quem colocava quantos na medicina e na Poli. Os tempos mudaram e a tendência na sociedade que se reflete no mundo, Brasil incluso, parece muitas vezes voltada ao “destrutivismo”.
Muitas mudanças nessas duas décadas e as teorias pedagógicas foram dando vez a outras necessidades, que exigem transformações mais rápidas. A única certeza que se tem é que tudo vai mudar e a velocidade dessas mudanças é exponencial.
Há pouco tempo se falava da informática nas escolas, depois tecnologia na educação, na conexão, na digitalização dos materiais e sistemas de ensino. Chegaram os tablets e smartphones, agora se discute tirar os smartphones das escolas. Nós mesmos temos um programa de desconexão ao mesmo tempo fazemos uso de tecnologias de ponta responsável.
Exemplo de rapidez é a chegada da inteligência artificial generativa, que decidimos estudar e aprender a usar o que ela pode ter de bom, letrando digitalmente professores e alunos para trabalhar com ela.
Na pandemia estávamos prontos tecnologicamente, e não se perdeu uma aula sequer. Na primeira semana de resguardo nossas 335 classes estavam equipadas para serem estúdios de aulas simultâneas à distância e assim funcionaram, mantida a mesma grade escolar.
Na semana seguinte com a necessidade dos professores trabalharem de casa, as aulas continuaram da mesma forma. Nossos mais de 700 professores estavam capacitados e com computadores aptos à continuidade.
O desafio foi os pequeninos, que superamos produzindo material didático impresso e entregando na casa dos pais, com tutoriais por meio de vídeo e escrito para aplicação.
Aos bolsistas desenvolvemos aplicativo que permitia o pagamento do tráfego de internet móvel reverso por nosso Colégio, de modo que eles tivessem acesso gratuito às aulas e materiais da plataforma digital. Convertemos a verba de alimentação em cestas básicas e de higiene para as famílias desses alunos, mensalmente.
Na pré-volta às aulas pós pandemia fomos os primeiros a investir no desenvolvimento de um protocolo sanitário, junto com ao hospital Albert Einstein. Pudemos servir de modelagem para os protocolos que se seguiram.
A educação contemporânea não permite mais que os professores sejam apenas especialistas nas matérias que lecionam, mas sim especialistas em aceitar e implementar mudanças, aprendendo enquanto ensinam e ensinado enquanto aprendem.
O papel do mestre que estávamos acostumados, e falo aqui também como professor de Direito, alterou-se profundamente, demandando capacitação não mais na matéria relativa ao conteúdo, mas sim no desenvolvimento da vocação para mudanças rápidas. Isso muitas vezes parece um conflito entre a rigidez dos conteúdos tradicionais, afinal a geografia, a história, a matemática ou as matérias tradicionais não mudam tanto. Todavia o que se altera é o modo como esses conteúdos entram na forma de ensinar e a necessidade dos professores aceitarem que tudo vai mudar o tempo todo.
As questões regulatórias não ajudam, grandes alterações, novos planos nacionais, o novo ensino médio que se sucede a outro e outro. De nosso lado já introduzimos as 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) das Nações Unidas em nossos currículos e itinerários formativos, cientes de que formamos pessoas para interferirem positivamente na sociedade, onde quer que estejam, focando nos seus talentos. Os resultados se medem se o aluno conseguiu atingir o seu objetivo e com isso naturalmente os melhores indicadores do grupo vão chegando.
Questões socioemocionais, políticas, a ansiedade, o modo líquido das relações, as mídias sociais, o que demanda aptidões que não eram funções das escolas. A adaptação a tudo isso resultou no desenvolvimento no nosso Colégio de estrutura organizacional em forma de rede, onde rapidamente se consegue a capilaridade na implementação das alterações.
O que preocupa é que essa agilidade, pela natureza do setor público, é mais difícil de ser alcançada, o que tende a aumentar as iniquidades da educação brasileira. Os Estados e Municípios já têm suas diferenças.
Os planos nacionais são árduos de chegarem na ponta. Muitas escolas públicas ainda lutam para se conectar na internet, pese os esforços de programas como a Estratégia Nacional de Escolas Conectadas, por exemplo.
A necessidade de capacitar escolas, educadores e gestores a serem facilitadores de mudanças como rotina, se não enfrentada, é mais um fator que tende a aumentar as iniquidades na educação básica, que deveria ser o foco das atenções dos governos e da sociedade como um todo.
*Marcos Bitelli é diretor presidente da Fundação Visconde de Porto Seguro Colégio Visconde de Porto Seguro. Doutor e mestre em direito pela PUC/SP.
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