Bússola

Um conteúdo Bússola

Contradição entre discurso ambiental e prática fóssil deixam Brasil cinza

Desastre ambiental já é real, e se continuar o processo de utilização de riquezas naturais, na velocidade atual, vai colocar em risco a vida na Terra

Brasil tem tudo para se incluir como solução, avançar e se tornar um país que justifica o futuro (James Cawley/Getty Images)

Brasil tem tudo para se incluir como solução, avançar e se tornar um país que justifica o futuro (James Cawley/Getty Images)

B

Bússola

Publicado em 1 de outubro de 2021 às 18h08.

Última atualização em 1 de outubro de 2021 às 19h31.

Por Márcio de Freitas*

O governo federal construiu uma política pública interessante e bem intencionada, o CPR (Células de Produção Rural) Verde, títulos que poderão ser emitidos para financiar a preservação e gerar recurso para reflorestamento no campo. Um mercado estimado em 30 bilhões de reais em quatro anos.

É louvável porque o governo não tem uma macropolítica ambiental. É mais uma ação isolada, em contradição com o aumento das queimadas e do desmatamento verificado desde 2019. E por isso mesmo foge do padrão. É um aceno ao investidor internacional que deseja ter uma relação dentro dos padrões exigidos pela comunidade internacional, onde o Acordo de Paris estipulou metas de redução de emissões de carbono a todos os signatários.

O acordo é uma questão de sobrevivência da raça humana. O desastre ambiental já está contratado, e por mais negacionismo que exista nesse tema, cientistas e estudiosos concordam que continuar o processo de utilização de nossas riquezas naturais, na velocidade em que se verifica, vai colocar em risco a vida no planeta. Já enfrentamos mudanças climáticas, mas nada perto do que está por vir em cerca de apenas 80 anos. Você pode não se preocupar, mas a conta será paga por seus filhos e netos. Talvez, com a própria vida.

No livro Como evitar um desastre climático, Bill Gates usa uma comparação com a pandemia para projetar um cenário assustador. As mortes provocadas pela covid-19 e pela gripe espanhola ficaram na média de 14 para cada 100.000 pessoas. Até o fim deste século, as mortes podem chegar a 75 mortes a mais de 100.000 pelos efeitos climáticos. Uma letalidade cinco vezes maior.

O Brasil enfrenta uma grave crise hídrica, talvez a maior em 100 anos. As mudanças no clima sinalizam que esse fenômeno, hoje raro, poderá se normalizar nos próximos anos com ocorrências regulares. Para solucionar o risco de ficar sem energia, optamos pela utilização de fontes fósseis — as maiores responsáveis por jogar gás carbônico na atmosfera, e criador do efeito estufa, que aquece demais a superfície da Terra e provoca transformações no regime de chuvas, alimenta tempestades maiores.

O CPR Verde é positivo, mas o debate deve ser muito mais profundo para enfrentar a gravidade do problema, com olhar holístico e inclusivo. O mundo todo emite 51 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa. Todos temos de fazer um esforço enorme para mudar esse panorama e zerar as emissões.

Hoje a China é o maior emissor de gases de efeito estufa no mundo. Os Estados Unidos já o foram. Assim como a Europa. Cobram dos países em desenvolvimento e pobres que façam reduções, em grande proporção. Parece e é injusto, porque eles alcançaram um padrão de vida e desenvolvimento que os outros não chegarão a ter utilizando os mesmos recursos e facilidades. É por isso que eles devem pagar pela preservação. O CPR Verde busca trazer esse dinheiro do exterior para o país, retendo parte das riquezas naturais protegidas.

É insuficiente, no entanto. É pouco, muito pouco. A questão é que esse mercado verde crescerá muito nos próximos anos. Energia limpa, fontes renováveis, produtos orgânicos e conceitos inovadores de fabricação de coisas serão agregadores de valor amazônicos na economia.

O Brasil tem tudo para se incluir como solução, avançar e se tornar um país que justifica o futuro, porque o garante com suas riquezas naturais e suas formas de produção. Deixar de ser um problema.

O mundo todo terá de fazer um grande esforço. Há espaço para uma mudança transformadora de novos valores na forma de relação com a riqueza material, na preservação e nas formas de produção. É meio a sensação que os hippies venceram… Há ironia demais na história. Mas o importante é que, ao final, o ser humano não perca a boa convivência com o seu planeta.

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação

Este é um conteúdo da Bússola, parceria entre a FSB Comunicação e a EXAME. O texto não reflete necessariamente a opinião da EXAME.

Siga a Bússola nas redes: Instagram | LinkedInTwitter | Facebook | Youtube

Veja também

Acompanhe tudo sobre:AmazôniaBússola PoderEfeito estufaSustentabilidade

Mais de Bússola

Entidades alertam STF para risco jurídico em caso sobre Lei das S.A

Regina Monge: o que é a Economia da Atenção?

Brasil fica na 57ª posição entre 67 países analisados no Ranking Mundial de Competitividade Digital 

Gilson Faust: governança corporativa evolui no Brasil, mas precisa de mais