O Brasil é 62º na especialização da mão de obra em um ranking de 64 países. (Thinkstock/Thinkstock)
Plataforma de conteúdo
Publicado em 13 de julho de 2023 às 12h15.
Última atualização em 13 de julho de 2023 às 12h18.
Por Andressa Schneider*
Incluir um país no mapa da inovação não é uma tarefa simples. Um ecossistema de empreendedorismo maduro precisa de talentos, capital e de uma rede de conexões para inovar.
Ao olhar para o Brasil, enxergamos um grande potencial de desenvolvimento quando voltamos nossa lente para o crescimento de scale-ups e unicórnios nos últimos anos. Ao mesmo tempo, ocupamos uma das piores posições no ranking de competitividade mundial (medido pelo IMD Competitiveness Center). Na especialização da mão de obra, o Brasil está na 62º posição entre 64 países.
Nas últimas décadas, temos falhado em aproveitar de forma eficiente o aumento da população jovem com o boom demográfico – período em que a população em idade produtiva atinge seu potencial máximo de trabalho e produção. Nosso desempenho é considerado muito abaixo da média global em áreas como atração de talentos e formação técnica e superior, segundo o Global Talent Competitiveness Index da INSEAD, ocupamos a 75ª de 134, ficando atrás de países como Estados Unidos, Chile e África do Sul.
E não temos muito mais tempo para aproveitar esse boom. Segundo o recém lançado Censo Demográfico de 2022, a população brasileira está crescendo em ritmo desacelerado e com uma queda de 4,7 milhões de pessoas em relação às projeções anteriores. É a menor taxa de crescimento anual registrada desde o primeiro recenseamento no Brasil há 150 anos. Ou seja, o boom demográfico está próximo do seu fim. Projeções indicam que restam apenas mais 10 anos deste período.
Este cenário pode representar uma série de implicações socioeconômicas, como a escassez de mão de obra qualificada em setores-chave, incluindo tecnologia, que demandam profissionais para impulsionar o desenvolvimento e a inovação do país.
Hoje já entendemos a baixa disponibilidade de talentos em tecnologia como um problema sistêmico. Faltam profissionais em número e com a formação adequada para as soluções demandadas pelo nosso país. Mas esse entendimento em números é ainda mais preocupante.
Dos formados no Brasil, apenas 17% se especializam em STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática). Para fins de comparação, na Índia são 31% e na China 33%, segundo a Unesco e o Fórum Econômico Mundial.
Essa escassez de profissionais qualificados é ainda mais preocupante considerando que a taxa de desemprego entre os jovens de 18 a 24 anos é de 22%, o dobro da média da população total, e 36% desses jovens não estudam nem trabalham, um número duas vezes superior ao dos países da OCDE. Do outro lado da mesa, as projeções da Brasscom apontam que 530 mil vagas de tecnologia já não serão preenchidas até 2025.
Para impulsionar o crescimento e a inovação, é fundamental investir em formação, qualificação e promover a inclusão desses jovens no setor de tecnologia. Agora, há pouco tempo para reverter esse cenário e, por isso, precisamos aproveitar esse pequeno intervalo do boom demográfico para a formação de novos profissionais.
O setor privado tem desempenhado um papel crucial na alavancagem e melhoria da formação em tecnologia no Brasil. De acordo com o relatório “Futuros possíveis”, da Endeavor, empresas e corporações são os principais impulsionadores desses projetos. Dentre 170 iniciativas avaliadas, 42,2% são lideradas por empresas, seguidas pelas edtechs — empresas de tecnologia focadas em educação — com 24,6%.
Essas iniciativas englobam cursos técnicos, muitas vezes gratuitos ou por meio de bolsas de estudo, demonstrando o compromisso social de empreendedoras e empreendedores em resolver um problema sistêmico do ecossistema. Um exemplo é a Trybe, que fornece cursos em tecnologia, com possibilidade de bolsas de estudos baseadas em contexto socioeconômico dos estudantes.
Além disso, as parcerias público-privadas estão se tornando uma realidade cada vez mais presente na formação em escala. Um exemplo concreto dessa colaboração é a parceria entre a Secretaria de Educação do Paraná e a edtech Alura através do programa EduTech, com o objetivo de formar 150.000 alunos do ensino fundamental e médio da rede pública estadual em cursos de tecnologia, como programação e data science. Em 2021, o programa estava disponível para 60.000 estudantes.
Combater a falta de profissionais de tecnologia é um desafio global, e podemos aprender com exemplos internacionais de países que estão investindo em formação de talentos e retenção de profissionais qualificados nessa área.
Os Estados Unidos são um exemplo para a formação em STEM. O programa "Change the equation" envolveu CEOs de empresas de tecnologia para planejar, expandir e investir em formação nessa área. Até 2016, mais de US$ 1 bilhão em investimentos privados foram destinados ao projeto. Outra estratégia adotada, durante a administração Biden, foi a atração de talentos internacionais, com incentivos à imigração de estudantes e profissionais da área de tecnologia, facilitando as regras de imigração e programas de vistos para profissionais de STEM. Essa mudança estratégica reconhece a importância da imigração qualificada para as cadeias produtivas e o impacto positivo no crescimento econômico.
A China é outro exemplo a ser observado. O país é líder na formação de estudantes em STEM, com mais de 4,7 milhões de novos graduados por ano. Além disso, conta com um grande número de edtechs — apenas em Pequim são mais de 3 mil edtechs, sendo a maior concentração de edtechs por pessoa no mundo (até 2016, a China dispunha de 171 mil escolas particulares, com mais de 48 milhões de estudantes). O setor privado atua em parcerias com o governo chinês, que incentiva os investimentos privados e públicos em setores estratégicos, como o de educação.
Esses exemplos mostram que é possível combater a escassez de profissionais de tecnologia por meio de investimentos privados e parcerias entre o setor público e privado. Além disso, é fundamental valorizar a educação em STEM com oportunidades de formação especializada, reter talentos nacionais e, por fim, atrair talentos internacionais.
O setor privado tem desempenhado um papel crucial nessa empreitada. Ao seguir esses caminhos, podemos superar a escassez de profissionais de tecnologia, impulsionar o desenvolvimento e garantir um futuro próspero para o país. Juntos, podemos construir um ecossistema empreendedor tecnológico mais promissor que impacte cada vez mais o crescimento do país.
*Andressa Schneider é Head de Marketing & Insights da Endeavor
Siga a Bússola nas redes: Instagram | Linkedin | Twitter | Facebook | Youtube
Veja também
10 tendências e inovações essenciais ao futuro do marketing digital
Startup ganha licitação para levar internet para 20 milhões de baixa renda