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Como serão formados os profissionais para o mundo cripto?

É necessária uma mão de obra altamente qualificada para dar seguimento ao crescimento do setor, o que hoje não está disponível

No Brasil, a expectativa é que o país crie 420 mil vagas no mercado de cripto até 2024 (EDUARD MUZHEVSKYI / SCIENCE PHOTO LIBRARY/Getty Images)

No Brasil, a expectativa é que o país crie 420 mil vagas no mercado de cripto até 2024 (EDUARD MUZHEVSKYI / SCIENCE PHOTO LIBRARY/Getty Images)

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Publicado em 22 de abril de 2022 às 17h00.

Por Carlos Ragazzo e Bruna Cataldo*

Os mercados de criptoativos e blockchain têm se destacado em crescimento tanto em valor de mercado, como quanto ao número de novos produtos e empresas. Originalmente associados ao mundo financeiro pelo surgimento atrelado ao Bitcoin, hoje startups usam a tecnologia blockchain nos mais variados setores: educação, energia, saúde, games, arte, entre outros. Um fenômeno menos falado em meio a essa onda de empresas e produtos, no entanto, é que é necessária uma mão de obra altamente qualificada para dar seguimento a esse crescimento, o que hoje não está disponível.

Houve uma surpresa quando o relatório elaborado pelo LinkedIn em 2020 sobre habilidades mais procuradas por recrutadores listou o blockchain em primeiro lugar. Isso porque, no ano anterior, a habilidade sequer aparecia na lista. Agora, o cenário é diferente: no Brasil, Paulo Monteiro (CEO da Driven), alegou que a expectativa é que o país crie 420 mil vagas no mercado de cripto até 2024 em uma entrevista feita em agosto de 2021, espelhando uma demanda que já é vista em países como os Estados Unidos, Reino Unido e Índia.

Vagas para o Ecossistema Cripto: desenvolvedores, advogados, produtores de conteúdo

Diferentemente do senso comum, a demanda por profissionais não é só por desenvolvedores. Embora eles de fato sejam o principal tipo de profissional procurado — e, particularmente um dos mais difíceis de serem encontrados em todos os setores do mercado de tecnologia, existe um universo maior de vagas hoje disponível no mercado. Sites de recrutamento para startups da área como AngelList e Hired mostram tendências relevantes de demanda para profissionais como especialista de mídia digital, produtor de conteúdo, produtor de vídeo, especialistas em banking, advogados e outros.

O destaque para profissionais nas áreas financeira e jurídica está relacionado a algumas demandas e dificuldades que a criação desse ecossistema de empresas possuem. No âmbito jurídico e financeiro, o entendimento de produto/ecossistema, a regulação e os aspectos operacionais são relevantes para o desenvolvimento do modelo de negócio. Mas o que realmente chama a atenção é o esforço de construção de times focados em conteúdo e mídia digital.

Para entender o movimento, basta olhar para um dado levantado pelo AngelList, site de recrutamento para startups: 89% dos recrutadores alegam ter dificuldades de encontrar profissionais  devido à necessidade de conhecimento coordenado entre áreas. Um exemplo relevante é o mercado financeiro, em que o profissional tem que estar capacitado não apenas nos produtos que envolvem cripto, mas também na tecnologia que dá sustentação ao investimento.

Essa coordenação tem se mostrado complicada, segundo Ana Carolina Roberti, que é gerente de Gente e Gestão de empresas brasileiras que estavam envolvidas em uma atividade de capacitação de profissionais na área de cripto em setembro do ano passado. Em uma iniciativa para medir a alfabetização do brasileiro em assuntos de cripto, foi identificado que 99% dos participantes não conseguem tirar mais de 60% em um breve teste com perguntas básicas. Em outras palavras, ainda que o profissional seja extremamente capacitado para a vaga, dificilmente ele é para o setor.

É justamente nesse aspecto de coordenação que profissionais de conteúdo se enquadram como um pilar da construção do ecossistema cripto: em um universo em que se demanda profissionais capacitados em hard skills (como o já mencionados blockchain ou conhecimentos técnicos do mercado financeiro) e em soft skills (como, por exemplo, resiliência), não existe previsão para o fim da necessidade de aprender.

A maioria das vagas destaca a necessidade de ser um “lifelong learner”, ou seja, alguém com a capacidade de aprender, desaprender e reaprender rapidamente e por longos períodos de tempo, demonstrando a relevância de um mercado de conteúdo para capacitação.

Criando seus próprios profissionais: o mercado de cripto investe em conteúdo e capacitação

O sistema tradicional de ensino tem tido dificuldade em acompanhar a necessidade de capacitação que o universo cripto vem apresentando. Para mitigar essa dificuldade, as empresas do setor passaram a direcionar investimentos para produzir material ou para adquirir empresas voltadas para o desenvolvimento de cursos de treinamento para formar profissionais para o setor.

Entre os exemplos que confirmam a tendência: a Binance constituiu a sua iniciativa de conteúdo, a Binance Academy. Além disso, no final do ano  passado, o Mercado Bitcoin, uma das principais empresas do universo cripto no Brasil, comprou a Blockchain Academy, escola de cursos criada em 2016, em aquisição que também envolveu a parte editorial da companhia. Não se trata de uma lógica de substituição da educação formal, mas uma capacitação vocacional de mais rápida conclusão.

No mundo cripto, o gargalo de profissionais já virou negócio, criando uma solução criativa para gerar o número de profissionais suficiente no mercado para dar seguimento ao crescimento dos diversos setores que são impactados ou mesmo disruptados pela tecnologia blockchain. O mercado financeiro pode ter sido o ponto de início, mas certamente não será o final desse processo.

*Carlos Ragazzo é professor da FGV Direito Rio e presidente do Conselho Consultivo do Instituto Propague e Bruna Cataldo é head de Conteúdo do Instituto Propague e doutoranda em economia na UFF

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