No caso das queimadas em São Paulo, criminosos iniciaram os incêndios e as condições climáticas amplificaram rapidamente a situação (Lourival Izaque/AFP)
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Publicado em 6 de setembro de 2024 às 14h00.
Por Rafael Kenji e Thaís Scharfenberg*
Os eventos extremos que ocorrem no Brasil em 2024 são exemplos claros de como as mudanças climáticas e a negligência com a infraestrutura podem gerar desastres que impactam diretamente a vida das populações.
Enquanto as enchentes no Rio Grande do Sul foram resultado da combinação de mudanças climáticas e a falta de preparo para sua ocorrência, as queimadas que se seguiram em São Paulo, Goiás e Minas Gerais mostraram que, embora o crime ambiental tenha sido a causa, o cenário climático potencializou o desastre.
No caso das queimadas em São Paulo, criminosos iniciaram boa parte dos incêndios, e as condições climáticas, como as temperaturas elevadas, baixa umidade e ventos fortes, amplificaram rapidamente a situação.
Foi imediato: internações por problemas respiratórios aumentaram drasticamente, escolas foram fechadas e a qualidade do ar se deteriorou a níveis alarmantes. As queimadas acontecem ao mesmo tempo que uma seca extrema atinge dezenas de cidades no Amazonas, na "potencial seca mais severa dos últimos 20 anos na Amazônia", de acordo com o Governo Federal.
Quando se fala no impacto na vida das populações, hoje as novas gerações já nascem em meio a desafios. Segundo a UNICEF, quase meio bilhão de crianças vivem em regiões com o dobro de dias quentes que seus avós. Essas mudanças têm implicações gigantescas para a vida diária das populações, especialmente aquelas mais vulneráveis.
Os hospitais, que já vivenciam um aumento da demanda por acometimentos respiratórios pelos casos de influenza, mais comuns nesta época do ano, precisam se adequar a demandas provenientes destes outros fatores causais.
As queimadas e secas extremas também contribuem para a migração de animais silvestres e insetos, que se deslocam para os centros urbanos à procura de abrigo. Casos de doenças que possuem vetores para sua transmissão tendem a aumentar.
Escolas em cidades como Ribeirão Preto e Uberaba tiveram aulas suspensas devido aos riscos à saúde e à necessidade de limpeza das estruturas cobertas por fuligem. Esses eventos afetam diretamente a frequência escolar, o desempenho dos estudantes e até a segurança alimentar de muitas crianças, para quem a merenda escolar é a principal refeição do dia.
Além das consequências na saúde e educação, que impactam diretamente o desenvolvimento humano e qualidade de vida da população, a economia também é um dos setores afetados, já que a produção agrícola é extremamente sensível ao clima, refletindo em uma baixa produtividade ou perda de insumos.
O impacto na economia também é refletido nos gastos para conter as queimadas e contornar as consequências das secas, com necessidade de investimento público e deslocamento de brigadistas e servidores para as áreas afetadas.
Se nada for feito, novas consequências desastrosas podem ocorrer em breve. A combinação de temperaturas extremas e seca prolongada em outras regiões do país pode resultar em um aumento nos incêndios florestais, com efeitos imediatos na saúde e na segurança alimentar das populações locais.
O grau de aquecimento global dependerá significativamente da disposição dos governos e da sociedade em adotar medidas que reduzam as emissões de gases de efeito estufa. A prevenção de eventos extremos, como as secas, queimadas e enchentes, deve ser mais urgente que a contenção de danos, principalmente por ser mais eficaz, e até mesmo mais barata.
É necessária uma atuação conjunta do Ministério da Agricultura e Pecuária, fiscalizando os produtores, punindo as ações ilegais e utilizando tecnologias como drones, satélites e mapeamento de queimadas com inteligência artificial, juntamente com o Ministério da Saúde, orientando a população sobre os riscos para a saúde. Junto a estes agentes, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima tem atuação necessária com IBAMA e FUNAI, articulando junto a ONGs e a sociedade civil para proteger o meio ambiente.
A retomada do Fundo Amazônia, em 2023, reforça a atuação de todos os setores da sociedade e governos para evitar os impactos das mudanças climáticas e prevenir novos desastres, com mais de R$726 milhões recebidos de doações em 2023, além do investimento do Governo Federal e financiamentos de bancos.
Já existem tecnologias capazes de evitar os desastres climáticos e fiscalizar a ação ilegal e danosa ao meio ambiente. Cabe à sociedade cobrar de seus governantes, por meio do voto consciente, e acompanhar as ações coordenadas dos governos, empresas e representantes da sociedade civil, frente a esses acontecimentos.
*Rafael Kenji é médico e Thaís Scharfenberg é internacionalista, consultores em ODS, ONU e sustentabilidade para empresas.
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