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Com racismo não há igualdade de gênero, com racismo não há democracia

O governo tem o dever de acabar com o preconceito e a exclusão das minorias

Racismo ainda é uma grande questão no mundo inteiro (Divulgação/Divulgação)

Racismo ainda é uma grande questão no mundo inteiro (Divulgação/Divulgação)

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Publicado em 8 de novembro de 2022 às 19h15.

​Em uma democracia todo poder emana do povo. Vence a vontade da maioria sendo as minorias respeitadas. Aqueles que são eleitos para ocupar os cargos do Legislativo têm o dever de representar os interesses de parcelas da sociedade que o elegeram. Já os eleitos para o cargo do Executivo têm o dever de governar para toda a nação, governar para todos. Fechando a tríplice do equilíbrio dos três poderes, temos o Judiciário, cujo papel é fazer cumprir as leis, fazer cumprir o contrato social que a sociedade democrática acordou.

​Quando se limita a participação política das mulheres é a democracia que está em risco. Quando se colocam obstáculos, quando não garantem a segurança para que mulheres possam votar e ser eleitas como desejam, não é um simples ataque à vontade das mulheres, mas sim um ataque à democracia.

​A luta pela igualdade de gênero é puramente uma luta pela democracia. É a luta para que todos os cidadãos tenham os mesmos direitos, uma pessoa, um voto. Mas a luta pela igualdade de gênero sem intersecção com o combate ao racismo, LGBTfobia, capacitismo, desigualdade de classe, entre outros, não é uma luta por igualdade. Sem intersecção, passa a ser uma luta por privilégio. E, como nos mostra a história, uma luta por privilégio branco.

​Podemos dizer que os resultados das Eleições de 2022 venceram a tentativa de autoritarismo populista que vinha se impondo no país, um autoritarismo que era contra as mulheres. Seja pelos recursos do Executivo que foram retirados das políticas públicas de proteção às mulheres, seja pelas próprias ofensas pessoais pelo chefe do governo proferidas inúmeras vezes a diversas mulheres. Seja pelo desprezo com a população que voltou a passar fome ou com a criminalização racista dos moradores da Favela.

Seja pelo desprezo aos povos indígenas e quilombolas, ou pelo crescimento da violência contra a comunidade LGBTQIA+. Seja pela desvalorização gigantesca dos recursos da educação ou o negacionismo das vacinas. Sim, todos esses ataques a direitos são ataques à pauta de gênero.

​As mulheres não querem apenas salários iguais, elas querem demarcação de terra indígena e quilombola. As mulheres não querem apenas o fim do feminicídio, elas querem o fim do genocídio negro e indígena. As mulheres não querem apenas poder discutir descriminalização do aborto, elas querem discutir ampliação das cotas nas universidades. As mulheres não querem só mais creches, elas querem vacinas. As mulheres não querem só fortalecer o combate a violência doméstica, elas querem reconhecimento do nome social e empregabilidade para as pessoas trans.

As mulheres são mais de 50% da população brasileira. Só as mulheres negras são mais de 28% do povo brasileiro. Quando falamos de igualdade de gênero estamos falando da vontade da maioria da população. Quando falamos de combate ao racismo, estamos falando da vontade da maioria da população.

​Estamos falando de maiorias silenciadas que aos poucos tomam seu lugar de direito na democracia. E resistir ou tentar impedir mais mulheres negras, LGBTQIA+, indígenas, quilombolas e periféricas chegar ao poder, é atentar contra a própria democracia.

​A democracia venceu em 2022 porque depois de séculos nós finalmente elegemos as primeiras parlamentares trans do Congresso Nacional, porque elegemos uma bancada de mulheres indígenas e negras. A democracia venceu porque agora as mulheres, em sua pluralidade e não em um supremacismo branco, estão ocupando aos poucos os cargos de poder. Porque normas racistas e excludentes de eleitores indígenas, quilombolas e pobres foram finalmente revogadas. Porque não serão apenas vozes brancas, que são minoria da população brasileira, mas maioria no parlamento, as únicas vozes escutadas.

​Mas não nos esquecemos, essas conquistas vieram junto com o aumento da violência política de gênero e raça contra essas mulheres que desafiaram a supremacia imposta pela Elite Política. Assim como tivemos no passado um ressentimento violento quando as empregadas domésticas tiveram reconhecidos seus direitos trabalhistas e o filho do pobre, o negro e o indígena entram nas universidades dos brancos, há risco de se aumentar e muito a violência política pelo fato de mais mulheres estarem no poder com a sua pluralidade de Brasil.

​Só espero que dessa vez fique bem claro o que é necessário defender quando se diz que apoia a luta de igualdade de gênero. Porque não há igualdade de gênero enquanto houver racismo, não há democracia enquanto houver racismo!

*Nailah Neves Veleci é diretora de Pesquisa da ONG Elas no Poder

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