“Cabe ao governo sancionar ou vetar a peça que o parlamento aprovou”, afirma o colunista Bússola. (Paulo Whitaker/Reuters)
Analista Político - Colunista Bússola
Publicado em 26 de janeiro de 2024 às 18h00.
Seca na região Norte, muita chuva no Sul. Muito orçamento para o Congresso, menos dinheiro para o governo federal. Há um “El Niño” a afetar a política que mudou a forma de irrigar as bases políticas com chuva de dinheiro caindo do Tesouro Nacional.
As chamadas emendas impositivas ao Orçamento influenciam esse fenômeno, que parece ser permanente com viés de alta para os próximos anos, segundo as previsões climáticas colhidas nos corredores do Congresso.
O resultado é quase 0,5% do PIB sob controle direito de parlamentares, enquanto o Palácio do Planalto vive o drama de passar o chapéu para saber quanto dinheiro terá neste ano para alimentar uma das prioridades governamentais: o Programa de Aceleração do Crescimento, o redivivo PAC.
O gesto do presidente Lula de anunciar o veto a R$ 5,6 bilhões em emendas de bancada é um esforço para conter a sangria financeira, que torna a correlação de força econômica mais favorável ao Congresso do que ao Executivo.
A briga promete ter mais tapas do que beijos, com o ambiente ganhando mais contornos de tempestade fora de época ainda antes do carnaval marcado para fevereiro. O samba começou atravessado nas relações políticas em 2024, sem ensaio na batucada para afinar a bateria até agora.
Cabe ao governo sancionar ou vetar a peça que o parlamento aprovou. O Palácio do Planalto anunciou o veto, e abriu um rio Amazonas de lamentações que transbordou com esse “El Niño” revolto: o Congresso vai derrubar o veto, restaurando a situação anterior aprovada no plenário por deputados e senadores.
O jogo demonstra cada vez mais um parlamento independente e menos harmônico na relação com o Palácio do Planalto. O que pode limitar ações do governo, e demonstra redução da capacidade do governo brasileiro controlar a agenda política nacional.
Esse é um dos principais atributos do presidente da República no Brasil, controlar a agenda, pautar debates e matérias legislativas. E muito menos força para direcionar recursos na elaboração do orçamento, definindo que políticas públicas receberão mais dinheiro dentro da divisão elaborada para cumprir programas de governo.
O Orçamento Geral da União já é uma peça engessada, com pouco espaço de manobra. Essa tendência se revela nas corporações se assenhorando de parte para seus vencimentos, como mostrou o estudo do Tesouro Nacional sobre a elevada conta paga ao Judiciário.
Há ainda as destinações constitucionais para educação e saúde. Os pagamentos da folha do funcionalismo, aposentadorias e pensões também consomem recursos sem deixar margem para mexer em grande parte dos recursos.
Sem esse espaço, o governo tenta ainda luta para diminuir o tamanho das emendas dos parlamentares, cuja destinação para muitas cidades e projetos acaba por pulverizar os recursos.
Na prática, alguns até atendem demandas das suas bases que são legítimas, mas essa nanodistribuição acaba por limitar o impacto dos programas governamentais – o que nem sempre é de interesse do governo federal, onde a marca das ações nacionais importa para ter o reconhecimento das ações e o retorno em forma de popularidade presidencial.
Em alguns casos, a eficiência se perde no processo de escolha de quem atender - o critério de poder político nem sempre é o melhor. Narciso acha lindo o que é espelho em aprovação no Ibope.
A briga por recursos está tão grande que o governo volta a buscar retomar o comando até daquilo que o estado abriu mão no passado, vide os conflitos com a Elebrobras e a Vale. A busca por colocar o orçamento dessas empresas para rodar em favor do governo demonstra a força permanente da frase síntese nacional ouvida por muitos domingos da boca de Silvio Santos: “Quem quer dinheiro?”
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