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Bússola Poder: As ilusões perdidas

É preciso prestar atenção nas movimentações ao longo do Lula III

05.06.2023 - Presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, durante cerimônia por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente.
Palácio do Planalto - Brasília DF. (Ricardo Stuckert/PR/Flickr)

05.06.2023 - Presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva, durante cerimônia por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente. Palácio do Planalto - Brasília DF. (Ricardo Stuckert/PR/Flickr)

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Publicado em 4 de agosto de 2023 às 18h00.

Última atualização em 4 de agosto de 2023 às 19h09.

Por Márcio de Freitas*

O estranho minueto que Lula III ensaia com Lira II parte do pressuposto que o segundo não terá um terceiro tempo para acrescentar ao seu nome de imediato em 2025. Ou seja, a vida política do primeiro será mais longa do que a do segundo no imenso salão do poder de Brasília. Arthur Lira só será presidente da Câmara por mais um ano e meio. E Lula tem mais três anos e meio pela frente.

Isso lembra aforismo de Franz Kafka sobre seus dias invernais na Europa: pela janela, ele via os troncos das árvores desaparecerem enfiados na neve. Um simples empurrar de mão parecia poder derrubá-las. Mas era só ilusão. As raízes estavam firmes no solo. Mas isso também era só ilusão, concluía o tcheco.

É ilusão achar que o sindicato dos deputados trocará o comando e tudo vai mudar do vinagre para o vinho se Lira deixar o comando da Câmara dos Deputados. Depois da mudança na correlação de forças dos últimos anos, só quem se afirmou foi quem se afinou com a lista de reivindicações da corporação e conseguiu se manter no cargo com prestígio. É a sina de Eduardo Cunha: tem poder enquanto pode fazer força, mas se fizer força demais, perde tudo.

Romper com a base é brigar com o poder. Foi isso que Rodrigo Maia fez ao abandonar o papel de despachante do Centrão durante o governo Bolsonaro. Perdeu papel e representatividade ao deixar de ter condições de fazer força. O lugar foi logo ocupado por Arthur Lira, disposto a cumprir com suas obrigações e servir de correia de pressão do parlamento sobre o governo — seja ele qual for. Mas sempre com o cuidado de não fazer força além do necessário. Uso de força excessiva pode dar cartão vermelho, diria Arnaldo César Coelho.

Lula joga com paciência, mas o tempo joga contra as suas agendas. Ele precisa fazer o governo andar, precisa aprovar matérias no Congresso para realizar e entregar o que o povo espera: obras, políticas públicas, realizações. Hoje é o arcabouço fiscal, amanhã a reforma tributária volta. Em dezembro, o Orçamento Geral da União precisa passar… dentro em breve o governo precisará de uma PEC para resolver os precatórios, sob o risco de um meteoro destruir o marco fiscal.

Até chegar a fevereiro de 2025, Lira II mandará muito na agenda da Câmara. Para andar, ou não. O grito de pare o painel de votação é sempre ruinoso para o Palácio do Planalto. Lira é, de fato, e porta-voz da maioria silenciosa que vota com o governo quando quer, e contra quando está insatisfeita e se torna barulhenta. Essa maioria já esteve aferrada a emendas, que se tornaram impositivas e são menos importantes na relação hoje. Mas também está conectada aos cargos de prestígio que podem trazer benesses e influenciar os rumos do país nos setores que administram: os ministérios, estatais etc. 

Lira II tem nomes para levar a Lula, que evitava o encontro há semanas. Mas uma hora terão de dançar os passos ao mesmo ritmo, com a coreografia ensaiada e ao som da mesma orquestra. Lira já levou um pisão no pé neste ano. Ficou ressabiado, mas está no salão porque também tem sua base eleitoral para cuidar, e seus projetos políticos futuros passam por ter relação azeitada com o governo — sem isso sua vida pode fizer dura.

Será um minueto sem amor, nem beijo na boca ao final. Tudo muito prático e educado. É só política mesmo. Sem ilusão. E é bom não ter muita ilusão quanto ao substituto de Lira. Será chefe de outro poder, com um sindicato a reivindicar que ele despache os seus interesses em primeiro, segundo e terceiro lugar. O país pode esperar. 

*Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação

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