O norte-americano Henry Thoreau defendeu o reencontro do homem com a Natureza (SoumenNath/Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 23 de abril de 2021 às 08h00.
A força do movimento em defesa da Natureza não surgiu recentemente. A denúncia dos impactos da industrialização, dos efeitos nocivos da urbanização e da devastação de biomas ganhou força, principalmente, após o movimento hippie, dos anos de 1960. A contracultura questionava o que estávamos fazendo com as vidas e com o planeta. E buscava valores renovados.
Muitas vezes, quando se quer algo novo, olha-se para o passado. E parte dessa turma lisérgica encontrou inspiração em Henry Thoreau, um norte-americano que, nos anos iniciais de desenvolvimento do capitalismo nas terras do Tio Sam de 1800, defendeu o reencontro com a Natureza. Ele morou solitário por dois anos às margens do Lago Walden, onde construiu uma cabana, colheu frutos e vegetais para seu alimento, além de juntar experiências para um livro que pregava uma ruptura com a vida convencional.
“Walden ou a vida nos bosques” é o narrativa desse período. Não tem ação. É um manifesto contemplativo, provocado pela busca de sentido de viver. “Mais que amor, dinheiro e fama, dai-me a verdade. Sentei-me a certa mesa onde a comida era fina, os vinhos abundantes e o serviço impecável, mas faltavam sinceridade e verdade, e fui-me embora do recinto inóspito sentido fome”, desabafa o autor. O volume tem valor para quem gosta de olhar a vida e filosofar. Nada que ajude o pessoal da Faria Lima a melhorar a performance da carteira.
É um texto que planta em solo pobre, desértico. Tenta abrir a cabeça de pessoas para a perda de equilíbrio entre o homem e seu habitat. E Thoreau grita: “Falais dos céus, vós que degradais a terra!”
Há 200 anos, o grito ecoa e ganha adeptos pelo mundo, alguns com racionalidade, outros como se se tornassem discípulos de uma nova religião. Nem sempre a busca pelo equilíbrio é bem balanceada.
O que há, cada vez mais, é a consciência de que deve-se buscar preservar o planeta em que vivemos. Bate-se na mesma tecla: só temos uma Terra. “Fomos alienados desse organismo de que somos parte, a Terra, e passamos a pensar que ela é uma coisa e nós, outra: a Terra e a humanidade. Eu não percebo onde tem alguma coisa que não seja natureza. Tudo é natureza. O cosmo é natureza. Tudo em que eu consigo pensar é natureza”, disse Ailton Krenak, no livro Brasil – Paraíso Restaurável, de Jorge Caldeira, Julia Sekula e Luana Schabib.
Assim, alguns temas ganham solidez, como a certeza de que os combustíveis fósseis devem ser radicalmente diminuídos no cotidiano da sociedade atual. As fontes alternativas e limpas de energia, ganham força.
O Brasil deveria estar hoje na liderança desse processo. Seja porque a energia elétrica nacional tem como fonte a geração hídrica há mais de um século. A água renova nossas luzes. Assim como o etanol funcionou para diminuir a poluição da gasolina desde os anos de 1970. E o biodiesel fez no mesmo caminho recentemente.
Durante quase seis meses do ano, certas regiões do país não têm chuvas e o sol incandesce. Outras têm ventos o ano inteiro. Essa diversidade de fontes de energia ainda incluem reservas de urânio, mas essa é uma discussão ainda radioativa pela história de desastres com usinas atômicas.
O presidente Jair Bolsonaro foi nesta quinta-feira na cúpula de líderes sobre o clima, e tinha esse passado nacional de ativos a apoiá-lo. Mas temos também um passivo atual, a ameaça aos biomas brasileiros. Em primeiro, a floresta amazônica. O mundo olha para aquele imenso território como um parque – que deve ser preservado. Mais de 20 milhões de pessoas vivem ali sem brincar. Alguns em equilíbrio, outros provocando devastação.
Esse é um assunto que deve ser tratado sem paixões. Há incêndios e devastação ocorrendo na amazônia legal há décadas. É um território de lutas e conflitos, onde há riquezas minerais e naturais incontáveis. E a primeira coisa que deveríamos fazer, é contar essas riquezas. Um a uma, com disciplina, método e sistematização. Ciência para desvendar nossa ignorância sobre esse imenso patrimônio.
Sequer sabemos sobre todas as espécies vegetais e animais que lá existem. Ou dos princípios ativos que podem existir em algumas desses desconhecidos ilustres para todo o mundo. Claro, para isso precisamos usar recursos, investir em pesquisa e desenvolvimento. Trazer até cientistas do mundo para colaborar com essa produção, que interessa a todos. Sem xenofobia, mas também sem amadorismo que permitam aos japoneses se apossar de marcas como o açaí…
Jorge Caldeira, em seu livro sobre o paraíso brasileiro, demonstra que ele é restaurável pela abundância de possibilidades de fontes de energia para movimentar a indústria. A natureza pode ser o grande fator diferencial do Brasil. É preciso cuidar bem desse patrimônio. Mas muito além de conservá-lo, é essencial saber usá-lo para o bem da humanidade. E do Brasil, que faz parte desse todo.
* Márcio de Freitas é analista político da FSB Comunicação
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